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ELEIÇÃO NOS EUA
Presidente enfrenta crise e queda de popularidade, mas máquina do governo e verba de campanha o favorecem
Bush está em baixa, mas não derrotado
VITOR PAOLOZZI
DA REDAÇÃO
O surpreendente desempenho
do senador de Massachusetts
John Kerry nas primárias democratas atropelou não só seus rivais
dentro do partido como também
está provocando grandes estragos
na campanha de reeleição de
George W. Bush.
A ascensão de Kerry foi tão rápida que praticamente não existiu o
período de "fogo amigo", em que
a troca de acusações entre os pré-candidatos acaba causando danos
severos a todos. Assim, a imprensa passou a registrar, ao invés da
luta fratricida, ataques diários dos
democratas ao presidente republicano. Para completar, Bush e
seu governo estão mergulhados
em uma série de crises, que vão do
Iraque à economia e passam pelos
questionamentos sobre se o presidente realmente cumpriu na íntegra o serviço militar na sua juventude. Até mesmo republicanos,
aqui e ali, ensaiam suas críticas.
Isso tudo não quer dizer que
Bush já pode ser considerado um
candidato morto nas eleições de 2
de novembro. Muito poucos ocupantes da Casa Branca deixam de
se reeleger (apesar de seu pai,
George Bush, ter sido um deles), e
Bush ainda não começou a gastar
os cerca de US$ 200 milhões que
terá para toda sua campanha.
O fato, no entanto, é que o presidente passa neste momento pelo
seu pior "inferno astral" desde
que chegou à Casa Branca. Pesquisa "Washington Post"/"ABC
News" divulgada anteontem
aponta que se a eleição fosse hoje
John Kerry venceria Bush com
51% dos votos contra 43% (a margem de erro é de três pontos percentuais). A aprovação ao desempenho de Bush na Presidência é
de 51% (já esteve acima de 90%).
De acordo com a pesquisa, a
maioria (54%) dos 1.003 americanos ouvidos acredita que Bush
deliberadamente exagerou os dados disponíveis sobre os programas de armas de destruição em
massa de Saddam Hussein.
O fracasso americano em descobrir o suposto arsenal iraquiano provocou um grande abalo na
imagem de Bush. Além disso,
mesmo com a captura do ex-ditador, soldados americanos continuam morrendo no Iraque.
As baixas no Oriente Médio são
a razão, na opinião de Raymond
Tanter -professor de ciências
políticas na Universidade de Michigan e ex-funcionário do Conselho de Segurança Nacional durante a administração Ronald
Reagan (1981-1989)-, pela qual
agora o serviço militar de Bush
causa mais discussão do que
quando o tema surgiu pela primeira vez, em 2000. "Quando você manda americanos e americanas para morrer no Afeganistão e
no Iraque, o seu serviço militar se
torna uma questão."
Bush, que se definiu como "o
presidente da guerra", está sendo
acuado pela imprensa e pelos democratas, que suspeitam que o
presidente simplesmente não deu
as caras durante boa parte de 1972
na base aérea do Alabama na qual
deveria servir.
As dúvidas que pairam sobre
Dick Cheney também causam
preocupação no Partido Republicano. O vice-presidente está envolvido em tantas confusões que a
revista "Time" da semana passada lançou a pergunta "Cheney
ajuda ou atrapalha?" e especula-se
se ele poderá perder a vaga na
chapa de Bush.
O gabinete do vice-presidente
está sendo investigado como um
dos possíveis responsáveis pelo
vazamento para a imprensa do
nome de uma espiã da CIA (o serviço secreto dos EUA). O diplomata Joseph Wilson, marido da
espiã Valerie Plame, sustenta que
o vazamento foi uma retaliação às
acusações que ele fez ao governo.
Cheney também está envolvido
em uma outra investigação: o Departamento da Justiça está apurando se houve o pagamento de
propinas em um negócio feito pela empreiteira Halliburton na Nigéria nos anos 90 -época em que
ele era o presidente-executivo da
companhia. Além disso, a Halliburton, à qual Cheney esteve formalmente ligado até 2000, está
sendo acusada de superfaturar
serviços e produtos usados na reconstrução do Iraque.
Déficit e desemprego
As principais pedras no caminho da reeleição de Bush estão na
economia. Apesar de o país ter superado a recessão e a economia
estar avançando, essa recuperação ainda não se traduziu na criação de empregos. Pelo contrário,
salvo uma espetacular, e improvável, mudança, Bush vai ser o
primeiro presidente desde a década de 30 a acabar o mandato com
o país tendo menos empregos do
que quatro anos antes.
O déficit orçamentário deste
ano, de US$ 521 bilhões, é o maior
da história. O "feito" de Bush contrariou muitos conservadores. A
falta de controle sobre os gastos
do governo foi criticada por parlamentares republicanos e definida pelo "Wall Street Journal" como "verdadeiramente chocante".
Até republicanos de "carteirinha" estão criticando o presidente. Peggy Noonan e Roger Ailes,
dois ex-assessores de comunicação dos ex-presidentes Ronald
Reagan e George Bush (1989-1993), recentemente se juntaram
ao coro de vozes desapontadas. O
conservador âncora Bill O'Reilly,
do canal Fox News, declarou-se
"cético" em relação ao governo e
se desculpou por ter endossado as
acusações de que o Iraque tinha
armas de destruição em massa.
Contudo, Tanter e o pesquisador Norman Ornstein, do conservador American Enterprise Institute, avaliam que as críticas internas não pesarão na eleição. Segundo Ornstein, Bush continua
com um nível de apoio entre republicanos ainda maior do que o
que Ronald Reagan tinha.
"É a base dele. Ele irritou alguns
conservadores com suas propostas para os imigrantes, mas eles
não têm outra opção. Se for uma
eleição entre o esquerdista Kerry e
o conservador Bush, a direita não
tem alternativa", afirma Tanter.
Outro ponto a favor de Bush, segundo o diretor de sua campanha, Ken Mehlman, é que freqüentemente o presidente dos
EUA enfrenta seu pior momento
de popularidade quando o partido da oposição está prestes a definir seu candidato e, por isso, ganha toda a atenção da mídia.
"É preciso ter em mente que os
índices de aprovação em fevereiro
não têm nenhuma relação com
sucesso em novembro. Seria tolice esperar qualquer coisa que não
uma eleição bastante disputada e
imprevisível", diz Ornstein.
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