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ELEIÇÃO NOS EUA
Para cientista político, guerra e economia derrubarão o presidente
Fukuyama vê Bush em seu
momento mais vulnerável
FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON
Depois de ganhar fama por seu
livro ""O Fim da História e o Último Homem", o americano Francis Fukuyama, 51, prevê agora o
fim de George Walker Bush.
""Pela primeira vez desde que assumiu, Bush está realmente vulnerável. Muita gente considera o
começo do seu fim. E eu concordo
com isso", disse Fukuyama em
entrevista à Folha na Universidade Johns Hopkins, em Washington, após uma palestra sobre a situação americana no Iraque.
""O Fim da História" se tornou
um best seller a partir de 1991 ao
pregar a tese, em mais de 15 idiomas, de que todos os países do
mundo se juntariam com o tempo ao redor de um sistema político e econômico comum, baseado
na democracia.
Leia a entrevista de Fukuyama,
PhD em ciência política pela Universidade Harvard, à Folha.
Folha - Os democratas conseguirão mudar ""corações e mentes" no
momento em que Bush constrói
seu discurso em cima da ameaça
terrorista presente e da guerra?
Francis Fukuyama - Bush tenta
de fato concentrar toda a sua estratégia no medo dos americanos
em relação ao terror evocando os
ataques do 11 de Setembro. Mas
creio que a sua performance não
tenha sido muito impressionante.
Mesmo a entrevista apresentada no domingo passado [no programa da TV NBC "Meet the
Press", em que Bush disse ser o
"presidente da guerra"] foi interpretada por muita gente como o
verdadeiro começo de seu fim. Eu
concordo com isso.
Bush vai insistir nesse ponto,
mas creio que talvez ele já não tenha mais argumentos tão poderosos. Se houver de fato uma investigação sobre os maus procedimentos adotados pela Casa Branca a partir de dados incompletos
de serviços de inteligência, e se as
coisas continuarem tão ruins como estão no Iraque, Bush acabará
ficando vulnerável justamente no
tema que escolheu como central
para a sua campanha.
Isso certamente pode ser um sério problema para o presidente e
seu discurso monotemático.
Folha - O ""presidente da guerra"
pode, então, perder a eleição justamente por causa dela?
Fukuyama - Sim, mas não apenas por causa da guerra. Os americanos vão olhar muito para outras questões, principalmente para a economia. Mas eu diria que,
pela primeira vez desde que assumiu, o presidente Bush está realmente vulnerável, e justamente
nos pontos centrais de seu discurso e de seu governo.
Folha - Mas grande parte dos norte-americanos segue amedrontada
com o terror, não?
Fukuyama - É verdade. Ainda há
uma significativa base de apoio a
esse discurso. Mas o que todos devem lembrar sempre é que Bush
venceu a eleição de 2000 por uma
margem mínima de votos. Talvez
possamos dizer que ele nem teve a
maioria dos votos.
Bush não precisa convencer as
pessoas que têm medo de terroristas e de ""ameaças externas".
Elas já fazem parte do ""núcleo duro" do eleitorado republicano.
O problema para Bush é convencer o eleitor de centro. Esse
eleitor já começa a avaliar com
mais atenção todas as contradições e inconsistências que estão
aparecendo no discurso e na prática da Casa Branca. Isso continuará ficando cada vez mais evidente ao longo da campanha.
Folha - O rápido consenso democrata em torno de John Kerry representa a noção de que Bush pode, de
fato, ser derrotado?
Fukuyama - Sim. A questão da
elegibilidade tem sido o principal
ponto desta campanha, tanto entre os eleitores democratas quanto para os indecisos. Há uma
compreensão de que realmente
há uma chance a partir desta fase
de contradições pela qual estamos
passando.
Folha - Mas Bush tentará neutralizar a situação no Iraque durante a
campanha, não?
Fukuyama - Sim, e a maneira que
está encontrando é interessante.
Ao querer antecipar a entrega do
poder aos próprios iraquianos e
ao planejar eleições tão cedo no
país, os EUA poderão acabar neutralizando de alguma maneira os
grupos que estão realizando os
ataques na região. Se um novo governo iraquiano assumir, esses
ataques constantes perderão a sua
legitimidade, pois estariam sendo
dirigidos agora contra um comando do próprio país, não mais
contra os invasores.
Folha - Em termos históricos,
quais as conseqüências da invasão
americana no Iraque?
Fukuyama - A coisa está apenas
no começo. Daqui a dez anos, se o
Iraque se tornar um lugar democrático, todos teremos uma outra
perspectiva. Podemos ter uma
surpresa. Mas o problema aqui é a
maneira como esse governo conduziu todo o processo, alienando
de maneira desnecessária a maior
parte de seus aliados internacionais, um erro que poderia ter sido
corrigido facilmente. Mas eles
nem sequer quiseram pensar no
assunto.
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