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VENEZUELA VOTA
Triunfo por pequena margem no plebiscito de hoje sobre o mandato de Chávez pode desencadear violência
Vitória apertada é pesadelo venezuelano
FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A CARACAS
Divididos pela intensa polarização política do país, os eleitores
venezuelanos vão às urnas hoje
para decidir se o presidente Hugo
Chávez deve ou não permanecer
no poder. Em meio a essa definição crucial, o ar venezuelano impregnado de boatos e do medo de
uma nova onda de violência política, como as que, desde 2002, já
provocaram dezenas de mortos.
Para a maioria dos analistas ouvidos pela Folha, a principal
apreensão é com um resultado
apertado no plebiscito, independentemente do vencedor.
"Uma vitória apertada é definitivamente o pior resultado possível. O lado que perder num resultado com pequena margem se
sentirá enganado e poderá apelar
para a violência", disse o cientista
político americano David Myers,
da Universidade Estadual da Pensilvânia e um dos mais respeitados especialistas em Venezuela.
Parte dessa ameaça é alimentada pela troca de acusações de planos de fraude eleitoral entre os lados até as vésperas do plebiscito.
Aliados de Chávez acusam a
empresa de telefonia Cantv de
planejar transmitir dados falsos
das máquinas eleitorais eletrônicas para a central de apuração
eleitoral. Já a oposição acusa o
Conselho Nacional Eleitoral
(CNE) de ser controlado pelos
chavistas e diz haver uma "operação passo lento" para atrapalhar o
fluxo de eleitores, como a troca de
domicílio eleitoral de milhares de
oposicionistas sem aviso prévio.
Apesar das denúncias, no entanto, observadores internacionais, como a OEA (Organização
dos Estados Americanos), dizem
que o sistema é imune a fraudes e
que o voto secreto está garantido.
No encerramento oficial da
campanha, os dois lados cantaram vitória. Para Chávez, sua permanência "é inevitável". "Somos
a maioria, com certeza", retrucou
o governador Enrique Mendoza,
líder da coalizão oposicionista.
O historiador Jorge Olavara disse ao "Financial Times" que "a
paz do país está em jogo no fim de
semana". Um resultado ambíguo
levaria "a um terremoto político".
Até agora, pesquisas mostram
que Chávez vencerá com alguma
folga -os últimos levantamentos
apontam vantagem de 11% a 25%
dos votos válidos a seu favor.
Mas na avaliação da cientista
política britânica Julia Buxton, da
Universidade Kingston e autora
de "O Fracasso da Reforma Política na Venezuela", nem uma vantagem maior garantirá a paz.
"Uma grande vitória para um lado pode levá-lo a ser bastante repressivos com o outro. Já uma vitória apertada pode piorar a polarização", disse.
A única análise positiva é do
americano Daniel Hellinger, da
Universidade Webster, que esteve
na semana passada em Caracas:
"Foi uma grata surpresa. Mudei
de idéia sobre o plebiscito. Ele
abriu espaço para as forças mais
moderadas de ambos os lados".
Rotina de violência
Embora o estilo populista de
Chávez e as ações golpistas da
oposição tenham contribuído para a polarização do país, a recente
onda de violência política se iniciou em 1989, no governo de Carlos Andrés Perez (1989-93), quando uma revolta contra o aumento
de preços públicos resultou em
centenas de mortos ("Caracazo").
Em 1992, Chávez, então tenente-coronel do Exército, liderou um
golpe fracassado e ficou dois anos
preso, até ser solto pelo presidente
Rafael Caldera (1993-8).
Em 1998, Chávez foi eleito presidente, interrompendo um ciclo
de bipartidarismo conhecido como "democracia Puntofijo", iniciado há 40 anos, e impôs uma
ampla agenda de reformas -entre elas, uma nova Constituição.
Em 11 de abril de 2002, Chávez
enfrentou um golpe de Estado da
oposição com apoio da mídia.
Dois dias depois, apoiado por militares legalistas, voltou ao poder.
Em 2 dezembro de 2002, a oposição convocou uma greve geral
que durou 63 dias e parou a produção de petróleo, maior fonte de
renda venezuelana -dono da
quinta reserva mundial, o país
fornece 15% do óleo usado nos
EUA. Como resultado, a economia sofreu uma retração recorde
de 18% entre 2002 e 2003.
A partir de meados do ano passado, no entanto, a retomada da
produção petroleira e a escalada
de preços do produto impulsionaram uma rápida recuperação.
Boa parte desse dinheiro vem financiando diversos programas
sociais chavistas. O presidente
também tem aliados em todos os
postos-chave da PDVSA, a megaestatal petroleira. Para analistas, é esse dinheiro que financiará
a possível vitória chavista hoje.
Grupo de Amigos
Em comunicado distribuído
ontem pelo Itamaraty, o Grupo de
Amigos da Venezuela (Brasil,
Chile, Espanha, EUA, México e
Portugal) diz que o plebiscito é
uma "etapa fundamental para a
solução desse processo político" e
volta a apoiar "o importante papel da OEA e do Centro Carter como observadores do processo".
O dia de ontem foi marcado por
encontros entre o CNE, os observadores internacionais, governo e
oposição. De manhã, o ex-presidente americano Jimmy Carter e
o secretário-geral da OEA, César
Gaviria, que chefiam as principais
delegações de observadores, se
reuniram com Chávez.
Ontem à tarde, os dois concederam entrevista coletiva em que
afirmaram que o plebiscito será
tranquilo. "Será mais satisfatório
do que foram as eleições na Flórida, em 2000", disse Carter, referindo-se à eleição presidencial
americana que elegeu George W.
Bush.
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