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O PRESIDENTE DEVE SAIR
Para americano, "Chávez não é ditador, ainda"
RAFAEL CARIELLO
DE NOVA YORK
O plebiscito revogatório que
Hugo Chávez enfrenta hoje não
será realizado de forma democrática, e o presidente venezuelano
tem os meios e demonstrou intenção de manipular o resultado.
A opinião é do especialista em
América Latina Stephen Johnson,
ex-funcionário para assuntos da
região no Departamento de Estado dos EUA e hoje analista sênior
da Heritage Foundation, principal centro de estudos conservador do país.
Johnson afirma que "há um clima de intimidação" no país, "pelo
qual as pessoas podem se sentir
relutantes" a votar contra Chávez.
O especialista caracteriza o regime político daquele país como
"autocrático". "Não chamaria de
ditadura, ainda", declarou.
E chega mesmo a duvidar de
que tenha de fato ocorrido a tentativa de golpe de Estado para tirar o venezuelano do poder em
abril de 2002.
"Não tenho certeza sobre o que
realmente aconteceu no levante.
Para mim, houve muito teatro naquilo tudo, planejado pelo próprio Chávez."
Leia a seguir trechos da entrevista que Johnson concedeu à Folha.
Folha - Como o sr. vê as chances
da oposição no plebiscito?
Stephen Johnson - A maioria das
pesquisas mostra Chávez avançando até quase um empate. Mas
não sei se isso significa alguma
coisa, tanto por causa do clima de
intimidação e pelo despejo de dinheiro em programas sociais. Ao
mesmo tempo, há um clima de intimidação, pelo qual as pessoas
podem se sentir relutantes a votar
pela sua saída.
Folha - O sr. acha que muitos eleitores poderiam não declarar que
pretendem votar contra Chávez,
mas ao fim fazê-lo?
Johnson - É possível, mas acho
difícil fazer um prognóstico agora. O outro problema é o que o governo vai fazer para tentar influenciar o resultado. Se, com toda essa tecnologia [voto eletrônico], haverá quedas de sistema intencionais ou problemas técnicos
que possam excluir eleitores. Se
poucos votarem e houver menos
de 3,7 milhões de eleitores que decidam pela saída de Chávez, o plebiscito pode fracassar, mesmo
que Chávez perca. Os resultados
podem ser manipulados em favor
do presidente.
Folha - O sr. acha que isso é algo que
Chávez faria?
Johnson - Sim. Ele tentou limitar
a participação de observadores
internacionais, tem um interesse
claro em permanecer no poder, os
observadores estão trabalhando
sob restrições. Outra coisa é que o
governo não precisa anunciar o
resultado até o início de setembro,
o que deixa espaço para muita
coisa acontecer.
Folha - Parece-me que o sr. não
acredita que o atual governo venezuelano seja democrático.
Johnson - Acho que ele se move
na direção de uma administração
autocrática. Não chamaria de ditadura, ainda. Todos os Poderes
estão "no bolso" de Hugo Chávez.
O Congresso, em sua maioria. A
Suprema Corte foi abarrotada
com amigos do presidente. O
conselho eleitoral é chavista.
As instituições independentes
que fazem uma democracia funcionar como tal não estão mais lá.
Começa a parecer bastante com o
Peru dos anos 90, sob Fujimori.
Folha - Mas os chavistas afirmam
que a polarização, de um lado, se
deve à dura resistência que Chávez
encontra de outro. O que o sr. acha
do argumento?
Johnson - Baboseira. Não há verdade nisso. Primeiro de tudo, não
tenho certeza sobre o que realmente aconteceu no levante [tentativa de golpe de Estado em abril
de 2002, que tirou Chávez da Presidência por dois dias]. Para mim,
houve muito teatro naquilo tudo,
planejado pelo próprio Chávez.
A oposição, dada a chance de
concorrer honestamente, contra
um presidente honesto, pode ou
não vencer. Penso que os venezuelanos olhariam as duas propostas e tomariam sua decisão baseados em idéias, e não em pessoas. Do jeito que as coisas estão
agora, é tudo uma questão personalista. E isso não é democracia. É
a velha tradição latino-americana
de mando do homem forte, um
substituindo o outro.
Folha - Sobre o golpe: Chávez ficou de fato detido pelos militares,
não?
Johnson - Há algumas coisas que
aconteceram. Os generais pediram que ele renunciasse depois
que as tropas atiraram em cidadãos venezuelanos [que protestavam contra Chávez]. Depois disso, o que aconteceu foi bastante
curioso. Os mesmos generais começaram a dar ordens, conseguiram apoio de algumas pessoas da
sociedade civil e depois passaram
a realizar atos antidemocráticos,
como dissolver o Congresso.
O fato seguinte foi o apoio dos
militares a Chávez, que o trouxeram de volta. O que toda essa manobra conseguiu foi fazer sumir
vários oponentes de Chávez, e fazê-los parecerem bem malvados,
quando ele voltou dois dias depois. Minha impressão é que ele
pode ter planejado bastante disso.
Folha - O sr. acha que seria melhor para a Venezuela e a América
Latina se Chávez perdesse o plebiscito?
Johnson - Não. Acho que seria
melhor se houvesse um processo
democrático e transparente, em
que ele tivesse de enfrentar ou o
plebiscito ou uma tentativa de
reeleição que fossem justos, em
que as pessoas tivessem a chance
de tomar essa decisão. Um processo em que tanto Chávez quanto a oposição tivessem recursos
iguais e igual acesso à mídia e à
possibilidade de fazer campanha.
Folha - O que, a seu ver, não está
acontecendo agora...
Johnson - Obviamente que não.
Ele tem o poder da mídia, tem o
poder do Estado para gastar cerca
de US$ 1,7 bilhão em programas
sociais de última hora para tentar
influenciar o voto, e a oposição
não tem nada disso, não tem os
recursos para igualar isso.
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