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São Paulo, domingo, 17 de agosto de 2003

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ORIENTE MÉDIO

Em entrevista, o premiê de Israel acusa os dirigentes palestinos de não agirem contra o terror, que ele vincula a Arafat

Palestinos ignoram obrigação, diz Sharon

CHARLES LAMBROSCHINI
DO "LE FIGARO", EM JERUSALÉM

O falcão Ariel Sharon é duro ao falar do ambiente em que vive: "No Oriente Médio, ninguém pode se contentar com promessas, belos discursos, declarações pomposas. Para obter progresso, é preciso fixar objetivos precisos".
Por causa dessa posição, Sharon, que ocupa o cargo de premiê israelense desde o início de 2001, considera indecisa a atitude do premiê palestino, Mahmoud Abbas (mais conhecido como Abu Mazen), contra o terror e acredita que os americanos terão de exercer pressão mais dura sobre a Síria. "Os palestinos se recusam a cumprir seus compromissos."
Nascido em 1928 numa aldeia ao norte de Tel Aviv, o controverso general Sharon é acusado pelos palestinos de crimes de guerra e massacres em várias campanhas militares israelenses.

Pergunta - Em plena trégua, Israel ainda assim foi alvo de atentados suicidas. Qual é sua resposta?
Ariel Sharon -
Os dois ataques confirmam que a Autoridade Palestina nada faz para combater o terrorismo. Nossos interlocutores se recusam a cumprir seus compromissos, a desmantelar a estrutura de suas organizações terroristas, a confiscar as armas. As autoridades palestinas deveriam compreender que, caso não façam o que deveriam, todos os avanços no processo político se tornam impossíveis.

Pergunta - O que Israel ganharia com uma ruptura?
Sharon -
Não podemos aceitar que o terrorismo se torne parte integrante da vida dos israelenses. E os EUA não aceitarão. Ainda que lamentando que a Autoridade Palestina se recuse a travar esse combate de maneira séria, Israel continuará a lutar contra os terroristas. Mas, se Israel, que preferiria continuar pela via política, constatar que não há progresso a esperar, o diagnóstico será claro. Os palestinos, assim, não poderão obter o que desejam.

Pergunta - No dia 9 passado, três dias antes do duplo atentado, a aviação israelense destruiu uma bateria antiaérea do Hizbollah que acabara de bombardear a Galiléia e ferir um jovem israelense. Já que o sr. acusa a Síria de estar por trás do Hizbollah, planeja atacar a Síria?
Sharon -
Não é a primeira vez que o Hizbollah nos toma por alvos. Nos últimos meses, os disparos contra Israel não param. Nós advertimos o Hizbollah muitas vezes. Os EUA estão pressionando a Síria. Mas os disparos continuaram. Por isso, decidimos que cada vez que uma de suas baterias antiaéreas abrisse fogo, seria destruída. Israel deseja calma em sua fronteira norte, e por isso tentamos provar nossa enorme contenção. Mas jamais aceitaremos que a segurança dos nossos cidadãos seja ameaçada. Essa é a mensagem que, uma vez mais, endereçamos aos nossos adversários.

Pergunta - No ano passado, o sr. não hesitou em lançar seus aviões contra um radar sírio no Líbano, que cobria as rotas para Damasco. O sr. estaria pronto a repetir um ataque desses caso sua mensagem não seja compreendida?
Sharon -
Tomarei todas as medidas necessárias para proteger meus concidadãos. Há muitos alvos disponíveis, na verdade. Logo depois da queda de Bagdá, os norte-americanos submeteram a Síria a pressões muito fortes. No começo, os sírios ficaram inquietos e optaram pela discrição. Mas, depois de algumas semanas, retomaram sua política de apoio a organizações terroristas. Uma vez mais, ignoraram as exigências de Washington. Continuam a permitir que o Hamas e o Jihad Islâmico treinem seus terroristas em território sírio.

Pergunta - Essa atitude não quer dizer que as pessoas perderam o medo dos americanos, enquanto seus soldados estiverem presos à pacificação do Iraque?
Sharon -
Creio que temos um erro de método. No Oriente Médio, ninguém pode jamais se satisfazer com promessas, belos discursos e declarações pomposas. Se queremos um avanço, é preciso definir objetivos bastante precisos, com etapas detalhadas para atingi-los e prazos firmes. As pressões sobre os sírios precisam ser ainda mais duras. Os americanos deveriam ter-lhes dito que as organizações terroristas na Síria precisam ser expulsas até o dia tal, hora tal.

Pergunta - Em resumo, o sr. deseja "exportar" o processo de negociação que aplica às suas relações com os palestinos.
Sharon -
Por que não? O plano de paz se baseia em resultados e em um calendário firme. Sejamos concretos. Quero duas coisas: a democratização das instituições palestinas, para que [o líder palestino] Iasser Arafat perca todas as suas posições de influência, e o desmantelamento de organizações terroristas. Meus interlocutores precisam compreender que, caso não avancem nesses dois pontos, também não avançarei.

Pergunta - A julgar por suas críticas ao premiê palestino, sua técnica de negociação não é um sucesso.
Sharon -
Nada foi feito para erradicar o terrorismo. Uma vez mais, minhas exigências são bastante concretas. Trata-se de prender os chefes que ordenam os assassinatos, interrogá-los e puni-los. A seguir, é preciso proibir as organizações extremistas. Por fim, é necessário confiscar-lhes as armas e remetê-las a um terceiro país, por exemplo os EUA, para garantir que sejam despachadas para longe do território da Autoridade Palestina e destruídas. Além disso, quero o fim completo dos atentados e a suspensão das incitações à violência. Mesmo que, quanto a esse último ponto, seja necessário algum tempo, já que a solução passa por uma reforma das escolas e por uma sensibilização quanto à educação para a paz.

Pergunta - Mas o seu Exército matou tantos homens dos serviços de segurança palestinos e destruiu tantas instalações e equipamentos que o premiê Abbas talvez não disponha dos meios necessários para atacar o terrorismo.
Sharon -
O sr. está brincando! A Autoridade Palestina dispõe de 60 mil homens divididos entre 12 serviços de segurança diferentes. Infelizmente, 60% dessas forças continuam sob o controle de Arafat, quando deveriam estar sob o comando de um responsável único, o chefe de governo Mahmoud Abbas. A primeira reforma que Mahmoud Abbas deveria executar seria atacar o monopólio de Arafat sobre os serviços de segurança. É preciso que ele seja privado do controle do dinheiro, e assim do pagamento dos salários. Segundo nossas estimativas, Arafat dispõe de US$ 2 bilhões espalhados pelo mundo, mais que o necessário para as reformas.

Pergunta - Mahmoud Abbas talvez não queira correr o risco de deflagrar uma guerra civil palestina.
Sharon -
Creio que o maior risco é aquele que pende sobre a cabeça dele. E ele continuará sob ameaça enquanto as organizações terroristas não forem desmanteladas. Quanto mais tempo passar, mais difícil será agir. Se os movimentos terroristas aceitaram um cessar-fogo, é devido à eficácia do Exército israelense, de nossos serviços de informações, de nossa polícia. Mas, nesse meio tempo, eles se aproveitaram da calmaria para recriar suas redes e reconstituir seus arsenais. A ponto de a indústria bélica palestina estar trabalhando a pleno vapor: eles estão prontos para produzir centenas de mísseis Kassem e estão trabalhando para ampliar o alcance dessa arma para, creio, 10 km.

Pergunta - O sr. ajudaria Abbas a combater o terrorismo?
Sharon -
Certamente. Para começar, nós o ajudamos ajudando a população. Libertamos prisioneiros, cerca de 700. Aumentamos a cota de permissões de trabalho, para que mais palestinos possam vir ganhar dinheiro entre nós. Removemos os bloqueios que prejudicam o deslocamento em diversas rotas. Também ajudamos Mahmoud Abbas ao mostrar que, para obter a paz, Israel está pronto a assumir compromissos dolorosos. Esses gestos que acabo de enumerar foram realizados ainda durante os ataques terroristas porque, contrário às nossas esperanças, os ataques jamais cessaram. Para chegar a uma paz autêntica e durável, Israel está pronto a ir longe, longe demais até, mesmo que isso lhe custe muito.


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