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Filho de Galbraith vê desastre econômico com Bush
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
Em termos econômicos, o problema do governo de George W.
Bush é não estar interessado em
buscar dois objetivos cruciais: gerar empregos e criar um ambiente
propício à existência de um crescimento sustentável. "Provavelmente, [John] Kerry venha a ser
compelido a constatar, após alguns meses de governo, que a situação econômica dos EUA é bem
pior do que ele pensa hoje."
As afirmações são do reputado
economista James K. Galbraith,
que foi diretor-executivo da Comissão Econômica Conjunta do
Congresso americano entre 1981 e
1982, além de, anteriormente, ter
trabalhado vários anos na Comissão Bancária da Casa.
Galbraith é professor na Escola
Lyndon Johnson de Administração Pública da Universidade do
Texas, em Austin, e diretor do
Instituto de Economia Jerome
Levy, ao norte de Nova York.
Galbraith, filho do renomado
economista keynesianista John
Kenneth Galbraith, é presidente
nacional da associação Economistas Aliados pela Redução de
Armas, uma entidade internacional que defende a paz e a segurança globais, e autor de vários livros.
Entre eles se destaca "The Nature
and Logic of Capitalism" (a natureza e a lógica do capitalismo).
Leia a seguir trechos de sua entrevista, por telefone, à Folha.
Folha - Bush quer tornar permanentes seus cortes de impostos e
manter o curso no que tange à economia. Como o sr. analisa o impacto verdadeiro dessas intenções?
James K. Galbraith - Obviamente, o impacto econômico dessas
medidas não é bom, pois não se
trata de uma política concebida
para restaurar o pleno emprego
ou para fortalecer o crescimento
econômico. Os cortes de impostos constituem uma política redistributiva, cujo principal objetivo é reduzir a tributação que incide sobre os mais ricos e sobre os
detentores de bens de capital.
Como não terá grande efeito sobre os gastos do governo nem sobre os investimentos, essa política
será desastrosa para a economia.
Na verdade, isso já ocorreu com
os cortes de impostos feitos durante o primeiro mandato de
Bush, visto que eles levaram o país
a uma considerável estagnação.
Folha - Isso faria que o déficit fiscal se tornasse ainda mais elevado?
Galbraith - O déficit público piorará bastante por duas razões: a
redução de impostos e a pífia performance econômica do país. Esta é ainda mais grave que os cortes
de impostos. Se fosse possível
conceber um programa de cortes
de impostos que, além de reduzir
a carga tributária, servisse de
apoio ao crescimento econômico,
o peso orçamentário da redução
de impostos não seria tão grave.
Folha - Contudo o atual governo
sustenta ser essa sua intenção ao
aplicar os cortes de impostos.
Galbraith - As pessoas imaginam que seja essa a intenção oficial, e o governo afirma ser essa
sua vontade. Porém isso não corresponde à realidade. Tal qual foi
introduzida, a redução de impostos busca apenas diminuir o peso
tributário carregado pelos mais
abastados.
Se querem conceber um programa que sustente o crescimento
econômico, eles [as autoridades
político-econômicas] terão de
criar um novo projeto. Trata-se
da questão mais importante
atualmente no que tange à administração da economia dos EUA.
Folha - Analistas dizem que o
atual ciclo econômico não permitirá que o próximo presidente faça
muito para fortalecer o crescimento econômico ou os níveis de emprego. Qual é sua opinião?
Galbraith - Trata-se de um ponto
de vista perigoso e ilusório. O ciclo econômico não é um fator autônomo e responde às escolhas
político-econômicas feitas pelo
presidente e pelas autoridades
econômicas. Após um espaço de
tempo relativamente curto, uma
política aplicada pela administração federal acaba sendo responsável pela evolução econômica.
A situação econômica de um
país é uma responsabilidade da
administração federal, já que só
ela pode tentar resolver os problemas enfrentados pelo país por
meio de suas escolhas político-econômicas, buscando criar empregos e melhorar o desempenho
econômico do país. O problema
do governo Bush é que ele não está interessado em buscar esses
dois objetivos cruciais.
Folha - Kerry tem a criação de empregos e o crescimento econômico
como bases de suas propostas?
Galbraith - Creio que sim. Há alguns elementos no programa de
Kerry que parecem mostrar que
ele quer priorizar a criação de empregos e o crescimento. Por
exemplo, seu esforço para pôr
parte do peso tributário de volta
sobre os ombros dos mais ricos,
tirando-a de empresas que fornecem serviços de saúde a seus empregados, parece ser bom para a
criação de empregos e para a
competitividade produtiva.
Além disso, algumas de suas
medidas que visam taxar as empresas que fogem do país por
meio de subsidiárias "offshore"
também me parecem construtivas e positivas a médio prazo.
Provavelmente, Kerry venha a ser
compelido a constatar, após alguns meses de governo, que a situação econômica dos EUA é bem
pior do que ele pensa hoje. Se isso
ocorrer, ele perceberá que medidas mais drásticas serão necessárias para restaurar o crescimento.
Folha - Kerry preconiza mais gastos com saúde, educação e Previdência. Isso não agravaria o déficit
fiscal, embora ele tenha prometido
reduzi-lo pela metade até 2010?
Galbraith - Segundo o programa
democrata, o aumento de gastos
nessas áreas será compensado pelo aumento dos impostos que pesam sobre os mais ricos. Estes voltarão aos níveis de 1993. Por outro
lado, não estou tão preocupado
com o chamado "peso sobre o Orçamento" de certas medidas porque, se funciona para restaurar a
força da economia, um conjunto
de medidas acarreta um peso orçamentário menos grave do que
quando não há a aplicação de medidas para revigorar a economia.
Os objetivos das políticas governamentais são, acima de tudo,
restaurar um crescimento econômico estável e sustentável e buscar altos níveis de emprego. Afinal, como vimos de 1997 a 2000, se
isso ocorrer, haverá uma maciça
melhora da situação fiscal do governo, o que reduzirá o déficit. Para tanto, creio que sejam necessárias medidas similares às que
Kerry propõe atualmente.
Seria um grave erro fazer correções fiscais extremas para tentar
equilibrar o Orçamento, sobretudo quando a economia se apresenta um tanto fraca.
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