São Paulo, domingo, 18 de maio de 2003 |
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MÍDIA Invenção e plágio em reportagens geram debate sobre jornalismo que privilegia o impacto em detrimento da precisão "Fome pela notícia" põe em xeque o "NYT"
RENATA LO PRETE
Trecho da reportagem-sindicância: "Seus erros haviam se tornado tão rotineiros, seu comportamento, tão desprovido de profissionalismo, que em abril de 2002 Jonathan Landman, o editor de Cidades, enviou à cúpula da Redação um e-mail em que dizia: "Temos de impedir que Jayson continue a escrever para o "Times". Já.'" Em vez disso, Blair foi transferido, depois de uma licença e de algumas advertências, para seção de maior prestígio, a Nacional, na qual o encarregaram de casos de primeira grandeza, como o do atirador de Washington. O editor não foi avisado do diagnóstico de seu colega de Cidades. Segundo o editor-executivo, Howell Raines, e o secretário de Redação, Gerald Boyd, tentou-se evitar que Blair fosse "estigmatizado" pela nova chefia. As quatro páginas de explicações tocam apenas de passagem na questão racial -alguns críticos avaliam que Blair, negro como o secretário de Redação e pupilo deste, jamais teria ido tão longe com sua folha corrida se não fosse a política interna de estímulo à contratação de minorias. Roupa suja O alcance das repercussões fez com que, três dias depois da reportagem de domingo, a cúpula apresentasse à Redação um discurso bastante diferente. Realizado em um cinema a poucas quadras da sede do jornal, o encontro foi "fechado à imprensa" -mas relatado em detalhes no dia seguinte por todos os diários, inclusive o "Times". Raines assumiu responsabilidade pelos danos à imagem do jornal e, na contramão do que havia dito antes, reconheceu que o fator racial pode ter influenciado seu julgamento. Em um espetáculo tão ou mais inusitado do que a reportagem corretiva, afirmou que estava ali para "ouvir a insatisfação" dos jornalistas. E ouviu por cerca de duas horas. "Você não pensa em renunciar?", perguntou de saída um repórter. Não. "Vocês [Sulzberger, Raines e Boyd] perderam a confiança de muita gente na Redação", opinou um editor-assistente. A lavagem de roupa suja pode ter contribuído para acalmar os ânimos internos, mas o caso promete ir longe. Surgem evidências de que as fraudes não se limitaram aos seis meses inicialmente analisados pela comissão de sindicância -Blair trabalhou para o jornal durante quatro anos. Na sexta-feira, o "Washington Post" publicou relato de uma redatora que forneceu material de apoio para reportagem sobre um "recall" de pneus da Firestone assinada pelo repórter em 2000. De acordo com ela, a entrevista feita com um consumidor foi totalmente modificada para "esquentar" as acusações à empresa. O jornal diz que vai investigar. Em defesa de seus procedimentos, Haines alegou ter investido em Blair, apesar dos sinais de perigo, porque ele demonstrava "fome pela notícia". A nova denúncia deve reforçar a discussão sobre uma cultura jornalística que, até em veículos como o "New York Times", tem privilegiado o impacto em detrimento da consistência e da precisão. Texto Anterior: Iraque ocupado: Número 10 do regime se rende, dizem EUA Próximo Texto: Fraudes abalam editor-executivo "rápido no gatilho" Índice |
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