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Sarkozy faz jogo duplo com a Otan
Presidente francês cita "reintegração" à aliança militar, mas diz que a defesa da União Européia é prioritária
Em discurso a militares, Sarkozy evoca o retorno do país ao órgão colegiado da aliança militar, do qual a França se retirou em 1966
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
O presidente francês, Nicolas
Sarkozy, jogou ontem com todas as ambigüidades que possam existir no relacionamento
entre a França e a Otan, a aliança militar ocidental. Declarou
que "nada impede" seu país de
se reintegrar à estrutura militar daquela organização.
A Otan foi criada em 1949,
diante da ameaça de uma invasão soviética na Europa ocidental. A França estava entre os
primeiros membros, ao lado
dos Estados Unidos, os de
maior capacitação militar.
Em 1966, Charles de Gaulle
retirou-se da Otan e exigiu o fechamento de sua sede, em Paris. O então presidente francês
acreditava que o "atlantismo"
em questões de defesa dava cobertura à expansão de outros
interesses dos EUA na Europa.
Mas as forças militares francesas permaneceram na Aliança Atlântica, um tipo de compromisso bem mais político
que estratégico. Em caso de
ameaça comunista, os franceses -com a bomba atômica
desde 1960- atuariam ao lado
de seus parceiros ocidentais.
Quanto à Otan propriamente
dita, em 1996 o presidente Jacques Chirac voltou a indicar
um representante à comissão
militar, um dos grupos que assessora o Comando Integrado,
com sede na Bélgica.
Condições já em vigor
A França, como um dos 26
membros da aliança, opera sob
comando americano no Afeganistão. Não é como a Suíça, a Irlanda ou a Áustria, que não integram o bloco militar por
questões de neutralidade.
Qual é então a novidade? Sarkozy afirmou ontem a 3.000
militares no ginásio esportivo
da Porta de Versalhes, em Paris, que há três condições de
reintegração plena à Otan.
Quer que a França mantenha
a liberdade de decidir se envia
ou não contingentes a um foco
externo de conflito. Exige que
em tempos de paz os contingentes franceses não se subordinem a oficiais estrangeiros. E
preserva a autonomia quanto
ao uso do arsenal nuclear.
Essas três condições já são
respeitadas, e a novidade consistiria em voltar a fazer parte
do Comando Integrado. Mas as
razões do presidente francês
são provavelmente outras. Ele
próprio as indicou.
"Se a França assumir seu papel integral na Otan, a aliança
terá mais espaço para a Europa", alusão ao peso relativamente menor que teriam os
EUA. Em outro trecho, afirmou
que "trabalharmos juntos significa, antes de mais nada,
construir a defesa européia, e é
essa a minha prioridade".
A União Européia já possui
um modesto núcleo de defesa.
O Reino Unido não quer ampliá-lo para que ele não entre
em conflito com a Otan. Sarkozy é o primeiro presidente da
França, em 50 anos, que não
trabalha com uma retórica medianamente antiamericana.
Oposição dos EUA
A Associated Press diz que os
Estados Unidos, de início desconfiados de um projeto de defesa essencialmente europeu,
estão aos poucos baixando a
guarda por saberem que o porta-voz da idéia é Sarkozy.
Ainda ontem o veterano comentarista Daniel Vernet, do
"Le Monde", disse que a reintegração plena da França à Otan
teria o mérito de "anestesiar as
desconfianças dos europeus
mais atlantistas quanto a uma
política européia de defesa".
Em outras palavras, é bem
possível que Sarkozy se torne
amistoso com a Otan, mas tendo em mira um objetivo geograficamente mais próximo
-justamente a política européia de defesa- na qual o peso e
a influência da França seriam
incomparavelmente maiores.
É bastante hábil. Esperemos
para ver o que acontece.
Com agências internacionais
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