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Para teólogo, papa sofre pressão
no Vaticano para não renunciar
DO ENVIADO ESPECIAL
Apesar da saúde frágil, o papa
João Paulo 2º, 82, não renuncia
porque "as pessoas que o cercam
no Vaticano não permitem", na
opinião de Andrew Napiorkowski, 40, professor de teologia da Papieska Akademia Teologii (Academia Papal de Teologia), ligada à
Universidade Jagiellonika, a mais
antiga da Polônia (1364).
"Um papa enfraquecido é conveniente para alguns religiosos",
diz o teólogo polonês. A seguir,
trechos da entrevista.
(PDF)
Folha - Segundo assessores próximos, o papa poderia renunciar e
se recolher a um mosteiro polonês
em vez de voltar ao Vaticano. O sr.
acha isso possível?
Andrew Napiorkowski - Não. É
possível que ele deseje isso, mas as
pessoas que o cercam no Vaticano não querem que ele faça algo
dessa natureza e jamais permitiriam uma decisão dessas. Um papa enfraquecido é conveniente
para alguns religiosos.
Folha - Quem exatamente seriam
essas pessoas que o impedem?
Napiorkowski - Algumas autoridades no Vaticano e principalmente os membros de um movimento religioso...
Folha - O sr. disse que um papa
fragilizado poderia favorecer a
atuação de religiosos. Esses beneficiados seriam membros do movimento católico Opus Dei (fundado
em 1928), como o porta-voz do Vaticano, Joaquín Navarro-Valls?
Napiorkowski - Prefiro não identificar nenhum grupo. Mas acredito que membros do Vaticano
não consigam conceber a idéia de
renúncia, apesar da fragilidade
aparente.
Folha - Por que eles não permitiriam uma medida dessas?
Napiorkowski - Porque querem
controlar a igreja mais que o papa.
Folha - Na véspera de vir à Polônia, o papa pediu que os católicos
orassem para que sua peregrinação fosse bem-sucedida. Depois,
saudou de forma especial "os que
suportam o peso do sofrimento".
Qual o objetivo dele ao expressar
sua fragilidade física?
Napiorkowski - Pedir o apoio dos
católicos e mesmo aproveitar a
dor para promover a oração e a
reflexão. Na Polônia, 2.000 mosteiros e igrejas rezaram durante
um mês por esta visita, pelo papa
e evidentemente por nós mesmos. Os poloneses acreditam que
a peregrinação seja uma oportunidade para que possam enxergar
seu interior. Não apenas os padres, que tradicionalmente estão
ligados ao santo padre, mas, neste
caso, também os leigos, que participaram dos preparativos e estão
se engajando mais.
Folha - Os leigos poloneses têm
uma atuação bem menor que os do
Brasil e da América Latina.
Napiorkowski - É verdade, por
causa de nossa herança comunista. Quando alguém queria fazer
alguma coisa em prol da igreja,
perdia o emprego. Ou seja, as pessoas se mantinham distantes da
linha de frente religiosa, com medo. Agora, 86% dos poloneses dizem que esta visita é muito importante porque, acreditam, trata-se da última viagem dele à Polônia. O papa não é novo e tem
problemas de saúde. Os leigos
crêem que seja a hora de agir.
Folha - O que mudou na Polônia e
na Europa com a eleição do primeiro papa polonês, Karol Wojtyla?
Napiorkowski - A Europa conheceu uma nova evangelização, apesar da crise de fé. Há 20 anos, quase não se falava, na Europa, sobre
a dignidade do ser humano, da vida humana. Nós não tínhamos
consciência da relevância evidente disso. Hoje, a situação é diferente. Há também a questão do
ecumenismo. Nunca estivemos
tão próximos de outras denominações cristãs quanto agora, após
23 anos deste pontificado.
Folha - Qual é a importância desta visita do papa?
Andrew Napiorkowski - Esta peregrinação é especialmente relevante para os poloneses e para toda a Igreja Católica por causa da
idéia central da misericórdia de
Deus. Daí a ênfase na irmã Faustina Kowalska, que recebeu uma
revelação de Deus sobre a misericórdia e que foi canonizada em
2000 após um longo processo de
negação de suas virtudes.
Folha - Por que a ênfase na misericórdia divina?
Napiorkowski - Como teólogo,
eu particularmente esperava havia algum tempo uma ênfase
maior na misericórdia de Deus. O
mundo precisa de misericórdia,
pois tem dificuldade em reconhecer seus pecados. Na atualidade, a
idéia de pecado desapareceu. As
pessoas não gostam de ouvir que
são pecadoras e que necessitam
da salvação de Deus.
Folha - Os atentados de 11 de setembro e os vários focos de conflito
atuais influenciaram o papa a ressaltar a misericórdia?
Napiorkowski - Sim, a crença católica não passa só pela confiança
na Justiça divina, mas também
pela certeza da misericórdia de
Deus. Até que se mostre o contrário, nenhum de nós é santo. Somos feitos de carne e osso. E, contra a guerra e o desespero, nada
mais adequado que a crença na
misericórdia divina para si e para
os outros.
Folha - Como Wadowice (cidade
natal), Cracóvia (onde Wojtyla viveu 40 anos) e a Polônia em geral
influenciaram o papa?
Napiorkowski - O papa tem suas
raízes em Cracóvia, seja como estudante, trabalhador ou padre.
Durante a 2ª Guerra, quando Cracóvia estava nas mãos dos nazistas, Karol Wojtyla foi obrigado a
trabalhar em uma pedreira. Apesar disso, ele continuou a estudar,
e isso, sem dúvida, fortaleceu seu
caráter. O local onde havia uma
fábrica controlada pelos nazistas
deu lugar a um santuário, que o
papa agora consagra. Ou seja, a
misericórdia de Deus prevaleceu.
Folha - Quais são os principais desafios da igreja agora?
Napiorkowski - Para a Europa, é
necessária uma nova evangelização, e nossa esperança são os jovens. Em relação ao mundo como
um todo, a igreja precisa fazer
mais pelos pobres, pelos desempregados. Nós podemos usar
mais a globalização para transferir as mercadorias de países ricos
onde vivem católicos para país
menos favorecidos.
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