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Papa tem história familiar trágica
DO ENVIADO ESPECIAL
O álbum de fotos original na casa onde o papa viveu entre 1951 e
1964, em Cracóvia, não deixa dúvidas: Karol Josef Wojtyla conheceu a experiência trágica da morte
de familiares bem cedo -e muitas vezes. Nascido em Wadowice
(sul da Polônia), em 1920, sua
mãe, sua irmã e seu irmão morreram antes de ele completar 13
anos. E, aos 20 anos, perdeu o pai.
A cada página do álbum que ele
próprio montou, o líder católico
conhece mais a solidão.
As fotos do irmão, por quem tinha uma afeição especial, e, em
seguida, a do funeral vêm acompanhadas do discurso feito por
ocasião daquela perda: "Querido
Edmundinho, ainda que não tenha lutado em batalhas pela pátria, você morreu lutando contra
as doenças". Médico, seu irmão
Edmund morreu aos 26 anos de
uma doença contagiosa que contraiu de um paciente.
Na casa da rua Kanonicza, a escrivaninha usada pelo papa quando era professor universitário, a
máquina de escrever com a qual
redigiu boa parte de seus ensaios,
o guarda-roupa e uma espécie de
divã que usava como cama permanecem no mesmo lugar. No
quarto, dois pares de esqui representam fases distintas na saúde do
papa: um deles, o primeiro que
usou, quando ainda era jovem e
esportista aficionado. O segundo
par foi o último a utilizar antes de
ser obrigado a abandonar qualquer prática esportiva.
Documentos como "O Amor e a
Responsabilidade", seu primeiro
ensaio sobe o amor, que traça
uma análise da sexualidade humana sob a perspectiva teológica,
e um atestado de óbito do irmão
também se encontram no local,
que abriga atualmente o Museu
da Arquidiocese.
Perto dali, o Instituto João Paulo
2º estuda sua vida e sua obra. À
disposição dos pesquisadores, há
mais de 4.000 livros sobre o líder
católico em diversas línguas.
Autor de "A dor tem mil rostos:
João Paulo 2º e os doentes", o psiquiatra Zdzislaw Jan Ryn, professor da universidade Jagiellonika,
visitava o local na última sexta.
Ryn disse que "o sofrimento vivido pelo papa logo nos primeiros
anos de sua vida ajudou a moldar
seu caráter religioso e místico".
Na adolescência, além da religião, Wojtyla (pronuncia-se voitiua) tinha uma predileção especial pela poesia e pelo teatro.
Danuta Michalowska, que foi
colega universitária do papa e, segundo Ryn, foi "o primeiro amor
de Wojtyla", diz que "seu envolvimento com a dramaturgia era impressionante, e não faltou quem
tentasse persuadi-lo a não trocar a
carreira artística pela vida religiosa". Michalowska, hoje professora
na Academia de Teatro de Cracóvia, recorda que certa vez colocou
um cartão na carteira de Wojtyla
que dizia: "aprendiz de santo".
Os amigos o chamavam de Lolek, que significa algo como Karolzinho. Um deles, Jerzy Kluger
(Jurek), Lolek conheceu no campo de futebol da escola de Wadowice e com ele teve uma amizade
que já dura mais de 60 anos. O papa costumava atuar como goleiro
no time dos alunos judeus.
No livro "O Papa Oculto: a História de uma Amizade e suas Repercussões nas relações entre Católicos e Judeus", o escritor Darcy
O'Brien relata como a amizade
entre Wojtyla e Jerzy Kluger, que
define o papa como "um homem
justo", ajudou a moldar o respeito
que o papa demonstra pelo judaísmo e por outras religiões.
O'Brien afirma que, sem jamais
renunciar a sua identidade, o papa "incorporou uma abertura [a
outras religiões] que ninguém
imaginava possível".
O diálogo entre a Igreja católica
e as religiões não-cristãs formam
um dos principais legados do
pontificado de João Paulo 2º, 82.
"Uniam-nos paixões iguais e
juntos projetávamos o nosso futuro sob a orientação de nossos
eminentes professores que nos
educavam na tolerância recíproca... Tenho no coração e rezo por
todos os nossos amigos mortos
[na Segunda Guerra]", escreveu o
papa ao engenheiro Kluger poucos anos atrás.
Cracóvia
Foi em Cracóvia, a antiga capital
real, onde o papa estudou filosofia
e onde se encontrava quando as
bombas alemãs atingiram a cidade, durante a Segunda Guerra
Mundial (1939-1945). Na cidade,
também preparou-se para o sacerdócio (clandestinamente) sob
a ocupação nazista e começou a se
opor ao regime comunista. Menos de oito meses após ser eleito
papa, em 1978, Wojtyla retornou
à Polônia e se tornou uma fonte
de embaraços para o governo.
Oficialmente, o país era ateu, e havia uma crise de falta de alimentos. "Todos queriam prestar-lhe
uma homenagem e manifestar
sua fé no catolicismo", recorda o
empresário Zbyszek Podolecki,
58. "Vislumbrar a possibilidade
de um futuro de liberdade nos
movia em direção a seus ensinamentos."
Após 20 anos como papa, em
1998, Wojtyla já tinha visitado
mais de cem países e levado mensagens críticas a muitos deles. Outros não pode visitar sobretudo
por divergências religiosas. O patriarcado russo, por exemplo,
acusa-o de proselitismo.
Filme
Enquanto o papa faz sua peregrinação à Polônia, o Vaticano
anunciou que deu as bênçãos a
um filme que retratará a vida dele,
desde sua infância até a eleição
para papa como o primeiro polonês a liderar a igreja e o primeiro
não-italiano em mais de 450 anos.
As filmagens devem começar em
setembro de 2003.
(PDF)
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