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CHINA
Lei anti-subversão e problemas econômicos alimentam descontentamento popular com a administração pró-Pequim
Hong Kong vive pior crise desde devolução
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
Buscando dissipar a mais grave
crise política da história recente
de Hong Kong, o chefe da administração local pró-Pequim, Tung
Chee-hwa, prometeu, na última
quinta-feira, dar ouvidos aos anseios da população. Contudo seu
governo continua enfraquecido,
de acordo com especialistas consultados pela Folha.
Ontem Tung esteve em Pequim
para explicar às autoridades chinesas a instabilidade política das
últimas semanas, em Hong Kong.
E recebeu apoio tanto do presidente Hu Jintao quanto do premiê Wen Jiabao. "O governo de
Tung Chee-hwa certamente é capaz de guiar o povo de Hong
Kong até a superação de suas dificuldades atuais", disse Wen.
Por enquanto, segundo analistas, Tung manterá seu posto. Todavia, uma vez aprovada a controversa lei anti-subversão que
desencadeou maciços protestos
populares (vista como uma restrição às liberdades civis), boas são
as chances de seu ciclo ter fim.
"Substituir Tung agora seria um
precedente perigoso para Pequim, que, por meio do ex-presidente Jiang Zemin, deu forte
apoio a ele no passado. Não creio
que Hu Jintao [atual presidente] e
Wen Jiabao [premiê] queiram entrar em choque com Jiang, que
permanece muito influente nos
bastidores", analisou Sonny Lo,
autor de "Governing Hong Kong:
Legitimacy, Communication and
Political Decay" (governando
Hong Kong: legitimidade, comunicação e decadência política).
"A renúncia de dois ministros
em Hong Kong, na última quarta-feira, foi boa para a cena política
da ilha e deu uma ótima oportunidade ao governo de melhorar sua
imagem. Pequim não deverá descartar Tung antes que a lei de segurança nacional seja aprovada, o
que deverá ocorrer ainda em
2003", avaliou o cientista político.
Com efeito, a resignação da
controversa ministra da Segurança, Regina Ip, que estava por trás
da lei anti-subversão, e a do ministro das Finanças, Antony
Leung, atenuaram um pouco a
pressão sofrida pela administração. No entanto elas não garantem que a situação venha a acalmar-se a médio e longo prazos.
A lista dos motivos do descontentamento da população de
Hong Kong é longa. Cronologicamente, ela teve início com a crise
financeira de 1997 -ano em que
o Reino Unido devolveu a ilha à
China-, visto que ela deu um duro golpe no setor imobiliário. Este
constituía uma das bases do até
então portentoso mercado financeiro de Hong Kong.
Desde então, a economia local
não conseguiu recuperar sua exuberância, e a ilha tornou-se cada
vez mais dependente economicamente da China continental. Para
agravar esse quadro, as autoridades locais admitiram que o desemprego atingiu o nível recorde
de 8,3% no final de junho.
Além disso, a falta de tato da administração para lidar com o surto de Sars (síndrome respiratória
aguda grave) provocou, segundo
Lo, um "aumento da sensação de
fragilidade das pessoas". Assim,
os protestos contra a lei anti-subversão são apenas a ponta do iceberg no que se refere ao descontentamento da população local.
"Os protestos não são contra o
poder central chinês. Eles refletem a erupção da insatisfação popular com a atuação do governo
desde 1997, não uma tentativa organizada de pôr fim ao sistema
político. A morosidade econômica é crucial nesse caso, já que a população de Hong Kong não está
acostumada com esses problemas", indicou Peter Cheung, doutor em ciência política e professor
na Universidade de Hong Kong.
"Se Tung tiver talento político e
cumprir sua promessa de submeter o artigo 23 [a lei anti-subversão] da Lei Básica da ilha à aprovação popular, a ira da população
deverá ser abrandada a curto prazo. Contudo é inegável que os habitantes de Hong Kong esperam
que, a médio e longo prazos, o novo ministro das Finanças [que
ainda não foi indicado] apresente
planos concretos para reduzir o
desemprego", afirmou Lo.
A evolução da crise política
atual em Hong Kong deverá definir o modo como Pequim tratará
de suas duas regiões administrativas especiais -Macau é a outra- no futuro. Isso poderá ser
determinante para as aspirações
chinesas de estender sua política
de "um país, dois sistemas" a Taiwan, que, para o governo chinês, é
hoje uma "Província rebelde".
"Pequim surpreendeu-se com a
dimensão dos protestos e decidiu
apontar um novo chefe para seu
escritório de representação em
Hong Kong. Com isso, quer
acompanhar mais de perto a evolução da situação política na ilha.
Nada é certo por ora, mas posso
dizer que o governo central talvez
não exclua a possibilidade de
manter as liberdades atuais de
Hong Kong", apontou Cheung.
Ademais, se pretende persuadir
Taiwan a aderir ao sistema aplicado a Macau e a Hong Kong, o governo chinês tem de evitar medidas drásticas. "Taiwan já se opõe à
"anexação". Se Pequim não mostrar moderação agora, ficará ainda mais difícil convencer os taiwaneses no futuro", indicou Lo.
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