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Campanha expõe hegemonia presidencial de Yale
AMITY SHLAES
DO "FINANCIAL TIMES"
John Kerry, Howard Dean,
George W. Bush e Joe Lieberman
têm algo em comum, e não é apenas o fato de terem passado o mês
de janeiro em campanha pela Presidência americana. Todos eles
estudaram em Yale.
A disputa entre George Bush pai
e Bill Clinton, em 1992, também
foi um embate de Yale versus Yale. Já faz uma década e meia que o
Salão Oval é ocupado por pessoas
formadas em Yale.
Observadores argumentam que
a hegemonia de Yale revela um fato vergonhoso: que os EUA são
regidos por dinastias endinheiradas. O fato de vários dos políticos
(ambos os Bushes, John Kerry)
também terem pertencido à associação de alunos de Yale Skull and
Bones (caveira e ossos) parece
confirmar a afirmação de exclusividade.
Mas também poderíamos argumentar o contrário: que a hegemonia atual de Yale vem comprovar a importância de se adotar
uma política para aceitar alunos
baseada no mérito.
Fases de mediocridade
Esta é uma história que começa
com a velha Yale, fundada em
1701. Aquela Yale teve períodos
iluminados e formou pessoas
ilustres. Mas também passou por
fases prolongadas de mediocridade. Comparada à Universidade de
Chicago no pós-Segunda Guerra
Mundial, por exemplo, ou à Universidade de Wisconsin antes dela, Yale não era muito instigante.
O único presidente saído de Yale
durante um século e meio foi William Howard Taft (1909-13), lembrado como um sujeito tão corpulento que teria ficado entalado
numa banheira da Casa Branca.
O problema de Yale era que se
preocupava mais com classe do
que com qualidade. A universidade excluía todas as mulheres qualificadas, quase todos os negros
qualificados, muitos judeus qualificados e alguns católicos qualificados. Rejeitava de maneira rotineira, por princípio, os alunos saídos de escolas públicas.
Nos anos 60, porém, dois reitores sucessivos da universidade, A.
Whitney Griswold e Kingman
Brewster, se propuseram a criar
uma nova Yale. Como escreve
Dan Oren em seu livro "Joining
the Club" (entrando para o clube), os dois contrataram Arthur
Howe e R. Inslee Clark para cuidar da admissão de alunos, e estes
afirmaram que, se quisesse atingir
a grandeza, Yale teria de abrir
mais suas portas. Em 1964, o número de calouros vindos de escolas públicas, que em 1950 tinha sido de apenas 36%, já chegava a
56% do total.
No início dos anos 70, Yale se
abriu para o ingresso das primeiras mulheres. As novas calouras
se mostravam mais ágeis e se esforçavam mais do que os estudantes mais velhos de Yale. A política
de admissões passou a não levar
em conta a carência financeira: a
universidade escolhia os estudantes primeiro, depois calculava
quanto apoio financeiro eles
iriam precisar e, em seguida, lhes
fornecia a maior parte.
Hoje em dia a impressão que se
tem é que essa mudança foi inevitável, desde o início. Mas não foi.
"Deixe-me entender direito", disse um membro da Yale Corporation a Clark. "Você está autorizando a entrada de alunos de uma
classe inteiramente diferente daquela à qual estamos acostumados. Você os está deixando entrar
para uma finalidade diferente da
de formar lideranças."
Clark insistia que admitir talentos e criar líderes eram a mesma
coisa. O executivo discordou. "Estamos falando em judeus e gente
saída de escolas públicas. Olhe à
sua volta. Estes são os líderes da
América. Não há judeus aqui. Não
há ninguém aqui que tenha estudado em escola pública."
Nas décadas de 60 e 70, eram estudantes de Yale que chamavam a
atenção do país, fazendo passeatas de protesto. Entretanto, olhando em retrospectiva, a novidade
ainda maior do que essa foi a revolução interna pela qual a universidade passou. "Foi uma mudança para uma meritocracia,
tanto para os estudantes quanto
para o corpo docente", recorda
Donald Kagan, historiador e especialista nos clássicos formado
em Yale. A nova Yale fazia tudo
parecer possível, e isso, por sua
vez, tornava a universidade enormemente atraente. Esse ambiente
inspirou novos alunos de Yale como o senador Joe Lieberman, que
entrou para a universidade saído
de um colégio público de Stamford, Connecticut.
Na nova Yale, os filhos de famílias ricas tradicionais, como John
Kerry (Yale, 1966) e Howard Dean
(Yale, 1971), eram obrigados a
competir com estudantes de passado muito diferente. Quanto a
George Walker Bush (Yale, 1968),
ele ao mesmo tempo fez parte da
velha Yale e, na condição de caubói populista, a rejeitou.
Para os alunos de origem privilegiada, a nova política gerava dúvidas que seus antecessores não
precisaram levar em conta, resultando em homens e mulheres
complicados, reflexivos -em outras palavras, líderes.
Entretanto, se dermos atenção
excessiva a Yale, perderemos de
vista o mais importante. As conseqüências positivas da ênfase às
oportunidades que marcou os
anos 60 são visíveis em todo o
país. O que esta campanha presidencial formada quase exclusivamente por egressos de Yale traz à
tona é o efeito duradouro de uma
mudança benéfica e distinta de
política, mesmo quando, lamentavelmente, essa mudança demora a ser adotada.
Tradução de Clara Allain
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