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ORIENTE MÉDIO
Líder de soldados que se negam a lutar nos territórios diz que a ocupação contraria princípios do Estado israelense
Militar rebelde acredita em risco à Israel democrática
MICHEL GAWENDO
FREE-LANCE PARA A FOLHA, DE TEL AVIV
O líder do movimento de militares israelenses que se recusam a
servir nos territórios palestinos
crê que a ocupação da faixa de Gaza e da Cisjordânia, além de estimular o terrorismo e gerar perdas
desnecessárias para Israel, pode
causar uma guerra entre judeus.
"Quando chegar a hora de removermos os assentamentos judaicos, o que cedo ou tarde acontecerá, é muito provável que os
colonos resistirão. Eles têm armas, cultura de violência e disposição", disse à Folha Arik Diamant, 30, sargento da reserva de
uma unidade de pára-quedistas
-parte da elite militar de Israel.
"A maioria dos colonos aceitaria sair dos territórios palestinos
em troca de indenização e de um
lugar para morar em Israel, mas
os que se recusarem provavelmente lutarão."
Diamant acha que presença do
Exército nos territórios palestinos
-ocupados na Guerra dos Seis
Dias (1967)- coloca em risco as
características de Estado democrático e judaico de Israel. "Israel
ainda é uma democracia, a não
ser pela atitude nos territórios."
O diretor contou que muitos
participantes do movimento são
chamados de traidores por amigos e têm problemas até com parentes. "Meu avô tem 90 anos de
idade e é da geração dos fundadores de Israel. Ele não entende como posso fazer isso. Mas eu tento
explicar que sou a continuação do
sionismo, que estou dando continuidade ao trabalho dele."
O movimento Coragem para
Rejeitar é pequeno, com 570 adesões. Mas sua mensagem ganha
força na sociedade israelense, onde o Exército ainda determina
grande parte da formação social e
profissional dos jovens e a recusa
em servir ainda é um tabu.
"A cada semana, dois ou três
militares aderem. Espero que,
com o tempo, nossos rapazes
usem a cabeça e se recusem a servir nos territórios palestinos",
afirmou Diamant, citando uma
pesquisa feita em julho pelo Centro Jaffe de Estudos Estratégicos,
da Universidade de Tel Aviv, indicando que 25% da população de
Israel apóia o movimento.
No início do mês, o comandante das Forças Armadas de Israel, o
general Moshe Yaalon, surpreendeu o país ao afirmar que as táticas do Exército incentivam o terrorismo, em vez de suprimi-lo. O
Exército limitou-se a emitir nota
afirmando que os debates sobre
os métodos militares acontecem
de forma profissional e não são
críticas ao governo Sharon.
A falta de progresso no processo
de paz e a incapacidade do governo de conter os ataques suicidas
prejudicaram a popularidade de
Sharon, que agora promete, para
breve, gestos de boa vontade em
relação aos palestinos.
Às vésperas do Ano Novo judaico, em outubro, um grupo de pilotos da reserva da Força Aérea de
Israel anunciou que não participaria mais de ações antiterrorismo que colocassem em risco a vida de civis na faixa de Gaza e na
Cisjordânia. Os militares que se
recusam a servir são levados a um
rápido e previsível julgamento
militar. Em geral, ficam na cadeia
o mesmo período que cumpririam de reserva, cerca de 30 dias.
Atualmente, três deles estão
presos. Se a lei militar fosse aplicada com rigor, diz o diretor do movimento, as penas poderiam chegar a três anos de cadeia.
Diamant -que, antes de assinar a carta de recusa, atuou em
operações antiterrorismo em Jenin, Nablus e Jericó- acha que a
ocupação incentiva o extremismo
e a violência palestina por atrapalhar a vida das pessoas comuns.
"Há casos de violência desnecessária e injustificada contra palestinos, mas isso não acontece
sempre e não é o principal. O
principal são os bloqueios entre as
cidades, cuja meta é atrapalhar a
vida das pessoas comuns."
Israelense, combatente
O serviço militar é obrigatório
para homens e mulheres de 18
anos de idade em Israel. Os homens cumprem três anos de serviço regular e continuam na reserva até os 40 anos de idade, em
alguns casos até os 45. Em geral, o
serviço de reserva dura um mês
por ano, mas pode ser mais longo,
dependendo da unidade e das necessidades do Exército. As mulheres fazem dois anos de serviço
obrigatório, e as combatentes
também fazem reserva anual.
O movimento dos "refuseniks"
(do inglês "refuse", recusar, com
o sufixo russo e hebraico "nik",
que determina pertinência) começou a formar-se em janeiro de
2002, quando um grupo de amigos com a mesma maneira de
pensar reuniu-se em um café de
Tel Aviv para tomar alguma atitude política contra a ocupação.
Eles decidiram comprar espaço
publicitário no jornal "Haaretz" e
publicar carta contra a ocupação,
anunciando a recusa em servir na
faixa da Gaza e na Cisjordânia.
"Pouco depois, cheguei para o
meu comandante e disse: "Você
não encontrará um sargento melhor do que eu, mas não conte comigo para atuar nos territórios
palestinos'", disse Diamant. "Ele
respondeu que não precisava de
um bom soldado apenas para
treinamentos e me liberou."
O movimento tem um escritório em Tel Aviv, organiza protestos e mantém um site com versões
em hebraico e inglês (www.seruv.org.il/defaulteng.asp).
O grupo diz receber contribuições financeiras de milhares de
pessoas do mundo inteiro, incluindo das comunidades judaicas dos EUA e da Europa. Apesar
da ideologia antiocupação, os estatutos do grupo afirmam que os
membros estão dispostos a servir
"em qualquer missão para a defesa de Israel", desde que fora dos
territórios palestinos.
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