São Paulo, terça-feira, 24 de junho de 2008

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Zimbábue mantém 2º turno apesar de saída da oposição

Governo diz que retirada de Tsvangirai veio tarde demais e que processo "é irreversível"

Desistência não conteve repressão, e 60 pessoas foram presas ontem na sede do MDC; líder da oposição busca abrigo em embaixada

DA REDAÇÃO

O governo do Zimbábue anunciou ontem que manterá o segundo turno das eleições presidenciais na próxima sexta-feira com ou sem a participação do partido de oposição, Movimento pela Mudança Democrática (MDC). O líder do MDC, Morgan Tsvangirai, desistiu anteontem de disputar a eleição devido à forte repressão contra seus simpatizantes.
"Ele [Tsvangirai] deixou para desistir tarde demais. O processo agora é irreversível, e o segundo turno vai acontecer", disse o ministro da Justiça, Patrick Chinamasa. O governo diz que o MDC, que venceu o primeiro turno em março, não informou por escrito a desistência à comissão eleitoral do país.
Mas a retirada do MDC não foi suficiente para pôr fim à violência. Ontem, o partido afirmou que a polícia invadiu sua sede em Harare e prendeu cerca de 60 pessoas que se refugiavam das perseguições pelo país. Tsvangirai se isolou na Embaixada da Holanda no Zimbábue por razões de segurança, mas não solicitou asilo político.
Segundo Tsvangirai, 86 membros do MDC foram mortos, e outros 200 mil, desalojados de suas casas. Ele próprio foi detido pelo menos cinco vezes quando estava em campanha. O secretário-geral do MDC, Tendai Biti, está preso sob acusação de traição e poderá ser condenado à morte.

Sem solução à vista
Não está claro se a decisão do MDC de se retirar dará origem a uma situação mais tranqüila. A expectativa é que o governo declare uma vitória de Mugabe, no poder há 28 anos, independentemente das condições de votação. "A única esperança para o MDC é que os governos africanos e a comunidade internacional digam que esta eleição é ilegítima", afirmou à Folha J. Anthony Holmes, analista sênior para a África do centro de pesquisas Council on Foreign Relations.
O MDC fez um apelo à Comunidade pelo Desenvolvimento da África Austral (SADC) e à União Africana para que pressionem pelo adiamento da votação, mas ainda não obteve resposta. A SADC vem evitando condenar Mugabe, apesar de governos africanos terem emitido individualmente fortes críticas.
Holmes estima que "alguns países africanos continuarão a dar desculpas para Mugabe". "Os líderes têm uma reticência tremendamente grande a criticar uns aos outros, tanto pela herança comum de colonialismo quanto pelo temor de que também sofram represálias."
Para o analista, o MDC tem pouquíssimas opções. Apesar de ter mantido as portas abertas, negociar um governo de unidade nacional geraria provavelmente uma coalizão liderada por Mugabe, algo que o partido rejeitou até agora .
"Não vejo como essa opção permitiria uma real transição democrática. Mugabe e [o partido governista] Zanu-PF não abrirão espaço para que o MDC ajude a escolher o próximo presidente, e nada mudará."
Holmes também não acredita que o colapso econômico force uma mudança política. "Com a inflação de mais de 2 milhões por cento ao ano, a situação já é tão ruim que uma piora teria efeito limitado."

Pressão internacional
Diferentemente dos órgãos africanos, o Conselho de Segurança da ONU tomou ontem sua primeira ação formal contra a crise no Zimbábue e aprovou uma declaração afirmando que é impossível um segundo turno livre e justo na próxima sexta. O texto condenou "a campanha de violência contra a oposição" e "o comportamento do governo, que negou a seus opositores políticos o direito de fazer campanha livremente".
A declaração não vinculante foi aprovada por unanimidade pelos 15 membros atuais do conselho, incluindo África do Sul, China e Rússia, mais próximos a Mugabe. Horas antes, em tom inédito, o secretário-geral do órgão, Ban Ki-moon, disse que "já houve muita violência e intimidação". Ele desencorajou veementemente o segundo turno, que aprofundaria divisões no país. (ANDREA MURTA)

Com agências Internacionais


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