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Guerra ao terror traz mais terror, diz analista
OTÁVIO DIAS
DA REDAÇÃO
A guerra contra o terrorismo,
declarada pelos EUA em 2001
após os atentados do 11 de Setembro, e encampada, em maior ou
menor grau, por dezenas de países, está produzindo uma série de
paradoxos.
O primeiro deles é que, apesar
de a caçada internacional aos grupos terroristas, em especial à rede
Al Qaeda, responsável pelos ataques contra o World Trade Center e o Pentágono, ter resultado na
prisão ou na morte de grande número de militantes, a frequência
de atentados tem crescido nos últimos meses.
"Apesar de os EUA e seus aliados terem conseguido prender ou
matar de 60% a 70% dos quadros
mais importantes da Al Qaeda,
está havendo uma escalada dos
ataques terroristas e não uma redução", diz Rohan Gunaratna,
autor do livro "Inside Al Qaeda
-Global Network of Terror" (dentro da Al Qaeda - rede global do
terror), da Columbia University
Press (Nova York).
No intervalo de apenas alguns
dias em maio último, houve atentados em Riad (Arábia Saudita),
na Tchetchênia (dois, em dias diferentes), no Paquistão e em Casablanca (Marrocos).
"Não há dúvida de que a Al Qaeda está trabalhando com grupos
islâmicos menores, treinados durante anos no Afeganistão. E que
há uma coordenação entre os ataques", afirma Gunaratna, originário do Sri Lanka e pesquisador do
Centro para o Estudo de Terrorismo e Violência Política da Universidade St. Andrews (Escócia).
Os eventos do atual mês de
agosto dão credibilidade à sua tese. No dia 5, um terrorista suicida
se explodiu diante do hotel Mariott em Jacarta (Indonésia). Dois
dias depois, um caminhão-bomba foi deixado em frente à Embaixada da Jordânia no Iraque. Na
última terça-feira, foi vez de a sede
da ONU em Bagdá ser atingida
por um atentado.
Já a Guerra do Iraque, justificada pelo governo George W. Bush
como uma etapa fundamental da
luta contra o terror, está trazendo
diversos resultados contraditórios. O mais surpreendente -ou
talvez o melhor adjetivo seja irônico- é o provável estreitamento
das relações entre o ex-ditador
iraquiano Saddam Hussein -ou
ex-integrantes de seu regime- e
a Al Qaeda no Iraque ocupado.
Apesar das alegações feitas antes da guerra de que Saddam e a
Al Qaeda manteriam relações -e
de que isso representaria um grave perigo porque o então ditador
poderia vir a fornecer à rede terrorista armas de destruição em
massa-, os especialistas da área
não viam indícios dessa ligação.
Agora, com o regime de Saddam deposto e os sérios problemas de segurança no Iraque, cresce a possibilidade de que o ex-ditador -ou ex-membros de seu
regime- e a Al Qaeda tenham
feito uma aliança para infernizar a
vida dos americanos.
"A queda de Saddam não foi
ruim para a Al Qaeda, que não
gostava do antigo regime iraquiano, secular e corrupto, mas que,
com a presença de americanos em
grande número no Iraque, tem
agora a oportunidade de atacar
diretamente os EUA", diz Daniel
Byman, pesquisador nas áreas de
estratégia contraterrorista e terrorismo no Oriente Médio do Instituto Brookings, em Washington.
"Para a Al Qaeda, desmoralizar
os EUA no Iraque seria comparável à desmoralização impingida
aos soviéticos no Afeganistão",
afirma Byman, professor da Universidade Georgetown.
O atentado contra o QG da
ONU em Bagdá, que matou pelo
menos 20 pessoas, pode ser resultado dessa aliança. De acordo
com Gunaratna, o material explosivo utilizado no atentado provavelmente veio de ex-integrantes
do regime deposto, mas a idealização e a estratégia do ataque levam as marcas da Al Qaeda.
"A magnitude do atentado, o fato de ter sido uma ação suicida e
de um veículo-bomba ter sido utilizado são elementos típicos da Al
Qaeda. E o alvo foi a ONU, que já
havia sido nomeada pela rede como um dos inimigos do islã", diz.
Se essa união entre um regime
secular -deposto, é verdade,
mas com amplo enraizamento no
Iraque e, possivelmente, acesso a
armas e explosivos- e a principal
organização terrorista islâmica se
confirmar, e não for rapidamente
suprimida, representará um efeito bastante adverso da estratégia
antiterrorista dos EUA.
Michèle Fournoy, consultora
sênior do programa de segurança
internacional do Centro para Estudos Estratégicos e Internacionais, também em Washington,
aponta um outro paradoxo.
Embora ela considere que a
guerra contra Saddam não tivesse
nenhuma relação com a luta com
o terrorismo ("foi um desvio de
recursos, que poderiam ter sido
aplicados de maneira mais focalizada"), os EUA agora não têm outra saída: precisam conquistar a
paz no Iraque.
"Se a intervenção no Iraque não
for bem-sucedida, a capacidade
dos EUA de liderar a comunidade
internacional e construir coalizões em torno de causas comuns
no futuro estará seriamente comprometida", diz.
"A guerra foi feita, e os EUA têm
muita coisa em jogo. Os grupos
terroristas sabem disso e farão tudo o que puderem para que os
EUA fracassem", afirma.
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