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ORIENTE MÉDIO
Em entrevista da qual a Folha participou, ele afirma que o esforço pela paz com Rabin fez o mundo reconhecer Israel
Arafat diz que ajudou Israel a ser aceito
OTÁVIO DIAS
ENVIADO ESPECIAL A RAMALLAH
Quase dez anos após ter retornado do exílio na Tunísia aos territórios ocupados como um herói
da luta pela autodeterminação
palestina, Iasser Arafat, 75, nunca
esteve tão enfraquecido politicamente. E a causa palestina nunca
esteve tão longe de chegar a seu
objetivo: um Estado independente em Gaza e na Cisjordânia.
Em junho acontecerá o 10º aniversário do fim do exílio de Arafat. Não há, no entanto, o que comemorar. Desde 26 de novembro
de 2001, o líder palestino está impedido pelos israelenses de sair de
seu QG semidestruído em Ramallah, na Cisjordânia. "Sou um prisioneiro como qualquer outro palestino", disse, em entrevista à Folha e a outros dois veículos brasileiros na noite de quarta-feira.
Em 1994, Arafat voltou triunfalmente à faixa de Gaza para presidir a Autoridade Nacional Palestina (ANP), embrião do futuro Estado. Naquele momento, esse parecia ser um sonho possível, devido à assinatura, em 1993, dos
acordos de Oslo, entre o líder palestino e o então premiê de Israel,
o trabalhista Yitzhak Rabin.
Em julho de 2000, fracassou o
diálogo entre Arafat e o então premiê israelense, Ehud Barak, mediado pelo presidente americano
na época, Bill Clinton, em Camp
David. O colapso gerou a nova Intifada e, em 2001, a eleição como
premiê de Ariel Sharon, muito
menos disposto a concessões do
que Barak.
Há dois anos e cinco meses,
Arafat vive sitiado na Mukata (sede da ANP), em grande parte destruída por bombardeios. Israel
ameaça mandá-lo novamente para o exílio ou mesmo matá-lo
-"remoção" é o termo usado pelo governo Sharon, que anteontem voltou a ameaçar Arafat.
A reportagem da Folha -que
viajou aos territórios ocupados a
convite da representação diplomática da ANP em Brasília- esteve três vezes na Mukata na última semana. Na quinta à noite,
Arafat convidou os três jornalistas
brasileiros para um jantar frugal
-legumes, entradas árabes, queijo branco, pão e frutas. "É um jantar pobre, mas é o que temos para
oferecer", disse, com um sorriso,
ao presentear a reportagem com
um pedaço de brócolis cozido.
Apesar de marcado pela idade,
por doenças e pelo confinamento
-"há mais de dois anos não tomo sol, você imagina o que é isso?"-, Arafat está lúcido e parecia bem disposto. Ele dificilmente
responde às perguntas de forma
direta. Prefere lembrar seus esforços de paz com diferentes governos israelenses, descrever os efeitos da ocupação e defender o direito dos palestinos de resistir.
Ao ser questionado sobre a acusação de Israel e dos EUA de que
não combate o terror ou até o estimula, ele reage: "Peçam-lhes que
apresentem uma prova de que eu
esteja junto com os terroristas.
Ontem, impedimos dois atentados, hoje, mais um".
Já era tarde, e Arafat estava rodeado de assessores. Ao lado da
pequena sala sem janelas onde ele
janta, tem reuniões e recebe estrangeiros, podiam-se ver cômodos com camas de solteiro arrumadas. Era hora de dormir.
Pergunta - Dez anos atrás, após
os acordos de Oslo, o sr. voltou aos
territórios ocupados, trazendo a
esperança de liberdade para os palestinos e de paz com Israel. Em
2004, o sr. está isolado em seu QG,
e o processo de paz está praticamente destruído. O que o sr. conquistou nesses últimos dez anos?
Iasser Arafat - Não esqueçam
que eu assinei os acordos de paz
com meu parceiro Yitzhak Rabin
na Casa Branca. Todo o mundo
viu. Nosso acordo foi bem recebido por todos os países árabes e do
movimento dos não-alinhados, e
as portas se abriram para meu
parceiro Rabin. Antes, pouco
mais de 60 países reconheciam Israel. Agora, são mais de 110. Então, esse grupo fanático que está
no poder hoje em Israel matou
meu parceiro Rabin [o premiê foi
morto por um extremista israelense, num ato condenado por todos os partidos da atual coalizão
em Israel]. E agora diz que a paz
está morta, que Oslo morreu. Mas
é preciso lembrar que mesmo o
acordo que eu assinei com Bibi
Netanyahu e seu vice na época,
Ariel Sharon [respectivamente o
ex e o atual premiê de Israel, ambos do Likud, de centro-direita],
após a morte de Rabin, não foi
cumprido. Depois, houve os entendimentos com George Tenet,
enviado pelo [presidente George
W.] Bush. E o acordo de Sharm el
Sheikh [Egito], com as presenças
dos presidentes [Bill] Clinton
[EUA] e [Hosni] Mubarak [Egito], do rei Hussein [da Jordânia,
morto em 1999], Kofi Annan [secretário-geral da ONU] e Javier
Solana [representante da União
Européia]. E as negociações com
Ehud Barak a convite do presidente Jacques Chirac [França],
com a participação da [ex-secretária de Estado dos EUA] Madeleine Albright.
Havíamos combinado de assinar o acordo de Paris na manhã
seguinte em Sharm el Sheikh,
com a presença de Mubarak. Todos fomos, mas, após três horas
de espera, Barak mandou uma
nota dizendo que não iria [por
causa da violência palestina contra israelenses].
Agora, o último deles, o plano
de paz sugerido a nós pelo presidente Bush em nome do Quarteto
[grupo formado por EUA, Rússia,
UE e ONU para pressionar pela
paz no Oriente Médio] e aprovado pelo Conselho de Segurança
da ONU. Nenhum foi colocado
em prática [Israel acusa os palestinos de não cumprirem sua parte
nos acordos: basicamente, combater os grupos terroristas]. E
Sharon, depois que os EUA nos
deram as costas, está aumentando
seus crimes em toda parte de nossa terra.
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