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RELIGIÃO
Casal dos EUA criou brinquedo para incentivar valores do islã entre meninas
Boneca de véu que lê Alcorão é alternativa islâmica à Barbie
LUCIANA COELHO
DA REDAÇÃO
Barbie provavelmente teria um
chilique: afinal, de que lhe valeriam as voluptuosas curvas e o
aparentemente infindável guarda-roupa se sobre ambos ela tivesse de usar um casaco largo e
um véu para disfarçar as formas e
cobrir as loiríssimas melenas?
O fato é que aquilo que para a
loira plastificada seria um despropósito é exatamente o que faz o
sucesso de sua nova concorrente.
Em suas três diferentes versões de
pele e cabelo (loira, morena e negra), a modesta Razanne usa com
devoção seu hijab -o véu islâmico- e só cede aos apelos da moda
quando está dentro de casa.
Dinâmica, ela reza, lê o Alcorão,
estuda, brinca, dá aula e até participa das tropas muçulmanas de
escoteiros. Tudo no maior recato.
Nascida há seis anos da imaginação de um casal de muçulmanos americanos, Razanne se tornou um sucesso no ano passado,
ao ganhar a atenção da imprensa
na esteira da polêmica proibição
da venda da Barbie na Arábia
Saudita -curiosamente, segundo seus criadores, os jornalistas
inicialmente se interessaram por
pensarem que se tratasse de uma
contrapartida árabe à exuberante
boneca americana.
"A idéia era dar uma alternativa
às meninas muçulmanas aqui nos
EUA. Nós as víamos brincando
com a Barbie, toda chamativa,
com roupas que mostram o corpo, e pensávamos: é esse o tipo de
modelo de comportamento que
queremos para nossas filhas? Ela
não parece com as mães delas.
Não parece com as roupas que
elas vão usar mais tarde", disse à
Folha Sherrie Saadeh, uma americana "na casa dos 40" convertida ao islamismo há 15 anos.
Foi Sherrie e o marido, Ammar,
que desenvolveram a boneca. "Na
verdade, quem pensou primeiro
foi ele, e acho engraçado que um
homem tenha pensado nisso. Afinal, eles ficam o tempo todo dizendo como são justos com as
mulheres muçulmanas, mas é difícil fazerem algo assim", ri.
O casal é dono da NoorArt, uma
pequena fábrica de brinquedos e
produtos educativos em Livonia,
Michigan, especializada em crianças muçulmanas.
Sherrie é gerente de produção e
"estilista" de Razanne. E não pense que o trabalho se limite a criar
véus -há versões de Razanne
com coloridíssimas túnicas, como
as usadas pelas muçulmanas no
sudeste da Ásia, e a cobiçada versão "in and out": com um casaco e
um hijab para vestir na rua e um
florido vestido acinturado e sem
mangas para usar em casa.
"Razanne ajuda as meninas
muçulmanas a entenderem que
em casa elas podem estar na última moda e ter roupas atraentes,
embora na rua se vista com recato", anuncia o site da boneca.
"Minha filha de dois anos insiste que a Razanne use seu véu toda
vez que sai de casa ou quando há
homens presentes", diz um testemunho no site. "A Razanne fala
para a Barbie usar o véu também", diz outro, aparentemente
escrito por uma menina.
Sem namorado
A bem da verdade, Razanne se
parece pouco com a turbinada
Barbie. Com seu corpo de pré-adolescente, lembra muito mais a
brasileira Susi, e suas maiores
preocupações -ao contrário da
prima famosa, que acaba de trocar o antigo namorado Ken por
um surfista australiano- são estudar, rezar e brincar.
"A Razanne oferece um modelo
de comportamento melhor e
mostra que uma menina muçulmana pode brincar como qualquer outra", afirma Sherrie, mãe
de um menino.
As vendas da Razanne ainda são
tão modestas quanto seu figurino,
sobretudo se comparadas às da
Barbie -que, desde sua criação,
em 1959, já teve mais de 1 bilhão
de exemplares vendidos, segundo
sua fabricante, a Matel.
Ammar Saadeh, "pai" e gerente
comercial da Razanne, diz que
nos últimos tempos as vendas
atingiram uma média anual de 50
mil unidades. Ele não fala em faturamento, mas, a um preço médio de US$ 15 (a Razanne mais cara é a escoteira, US$ 21,99), é possível estimar que a boneca fature
cerca de US$ 750 mil por ano. A
Barbie vende US$ 3,6 bilhões.
O casal está otimista e diz ter registrado "um crescimento expressivo" das vendas (ainda não há
números deste ano) desde que a
boneca surgiu no noticiário.
Hoje a Razanne é vendida em
lojas dos EUA, do Canadá, do Reino Unido, da Alemanha, do Kuait
e de Cingapura, e também na internet (www.noorart.com). Negociações em outros países estão
em curso.
Ainda constam dos planos a
ampliação da linha étnica e da
profissional, "com todas as profissões que uma garota muçulmana pode ter". "Também tem a linha formadora de caráter, que já
tem a escoteira e terá a Razanne
que participa de organizações comunitárias", conta Sherrie. "É legal porque, uma vez que seu corpo está coberto, você acaba dando
mais atenção à sua personalidade.
A personalidade da boneca passou a ser o mais importante."
Com tantos atrativos, não há
pretendentes à vista? "Até hesitamos em fazer um boneco homem,
porque o namoro no islã é diferente, sem contanto físico. E a Razanne ainda é muito nova", explica Sherrie. "Pode ser que mais para frente lancemos um irmão para
ela. Mas namorado, não."
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