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ÁFRICA
Influência do Brasil supera a de Portugal, antiga metrópole, e é determinante no país que Lula visitará nesta semana
Em Cabo Verde, Brasil já é potência global
MARCOS FONSECA
FREE-LANCE PARA A FOLHA
O pequeno Cabo Verde, que o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva visita nesta quinta-feira, na sua
segunda viagem à África em menos de dois anos de mandato, é o
exemplo perfeito da crescente influência brasileira no continente,
um dos objetivos da política externa brasileira desde os anos 90.
Exemplos não faltam: vão do
inusitado e sólido fluxo de sacoleiros que percorrem os 5.100 km
entre o país e o bairro do Brás, em
São Paulo, até a crescente influência da mídia brasileira, passando
por um premiê formado na Fundação Getúlio Vargas, um comércio bilateral em ascensão e o tradicional apreço pela MPB.
Essas ações revelam como, em
países que falam português, o
Brasil compete e às vezes ultrapassa a presença da antiga metrópole colonial, Portugal. Realiza
assim, em pequena escala, a antiga aspiração da política externa
brasileira de fazer do país uma
potência global.
A inauguração da ligação aérea
entre a ilha do Sal e Fortaleza (três
horas de vôo), em novembro de
2001, fez os cabo-verdianos mudarem seus destinos turísticos. A
Europa cedeu lugar ao Ceará, que
passou a ser um destino para Réveillon, Carnaval e férias.
Acompanhado de mais de uma
dezena de empresários, Lula buscará na África mercado para produtos e serviços brasileiros. Também vai anunciar uma redução
nas taxas de importação para produtos de países africanos em desenvolvimento, sobretudo os de
língua portuguesa.
Em Cabo Verde, ele encontrará
um país com fraca capacidade
produtiva e que importa quase tudo que consome. Uma economia
que depende de ajuda externa e
da remessa de divisas dos emigrantes espalhados pelo mundo.
O empresariado local também
vê com bons olhos a aproximação
comercial com o Brasil, atraídos
pela qualidade dos produtos, pelos preços atraentes e, principalmente, pela desvalorização do
real, que favorece quem compra
em euro ou dólar.
As exportações brasileiras para
o arquipélago cabo-verdiano
cresceram de US$ 7,2 milhões em
2001 para US$ 10,2 milhões em
2003, conforme dados do Banco
Central de Cabo Verde. Os principais produtos negociados são alimentos, têxteis, calçados e materiais de construção. A exploração
de petróleo pela Petrobras poderá
ser outro setor a render negócios.
Futebol e rádio
A presença do Brasil é muito
marcante no dia-a-dia dos cabo-verdianos. Os gêneros musicais típicos do país, morna e coladeira,
têm na sua estrutura evolutiva
elementos da cultura brasileira. A
música, o futebol, as telenovelas,
as rádios e as revistas brasileiras
foram responsáveis pela massificação dessa influência.
A cantora Cesária Évora, vencedora do Grammy de world music
deste ano, diz que tem em Ângela
Maria a sua fonte de inspiração.
Músicas brasileiras de todos os estilos marcam presença diária nas
rádios, nas festas e nas discotecas.
O futebol da pátria de chuteiras
tem nas ilhas fãs atentos. Grande
parte da população torce pela seleção canarinho. O tetra e o penta
foram festejados como se tivessem sido uma conquista nacional.
Alguns dos times do Brasil, como o Corinthians -que dá nome
a um clube de futebol juvenil na
ilha de São Vicente-, o Palmeiras, o São Paulo, o Vasco e o Santos -devido aos fenômenos Robinho e Diego- estão vendo sua
torcida crescer no país.
Inspirado nas FMs brasileiras, o
psicólogo de comunicação Giordano Custódio, formado em Minas Gerais, revolucionou o mercado radiofônico.
Ele criou a Praia FM, uma emissora dinâmica, ágil e que valoriza
a cultura nacional, rompendo
com o formalismo vigente até então no setor.
Em três meses o veículo tornou-se líder de audiência na capital do
país, posição que mantém até hoje, passados cinco anos. A mesma
fórmula foi aplicada há dois anos
à rádio Morabeza, que ocupava o
último lugar em São Vicente, a segunda economia do país, e o resultado foi o mesmo.
A visita de Lula a Cabo Verde
criou expectativas na comunidade radicada no Brasil, que quer
ver algumas conquistas para estreitar mais ainda as relações. "Espero que a visita contribua para
aumentar as trocas comerciais
entre nossos países e que o Brasil
se abra mais para que artistas cabo-verdianos venham cá mostrar
nossa cultura" diz José Augusto
do Rosário, presidente da Associação Cabo-Verdiana no Brasil.
Crescimento
Cabo Verde, que se tornou independente de Portugal em 1975 e
teve suas primeiras eleições livres
em 1991, integra o grupo de países
de médio desenvolvimento humano, segundo os critérios da
ONU. O país está na 105º colocação no ranking do IDH (Índice de
Desenvolvimento Humano). E a
cooperação com o Brasil foi um
fator importante nesse avanço.
O perdão parcial da dívida externa por parte do Brasil, em 1999,
e a renegociação das parcelas em
atraso contribuíram para a consolidação da economia do arquipélago, assim como as centenas de
cidadãos formados em universidades brasileiras que voltaram.
O Programa Estudante Convênio de Graduação, que o Brasil coloca à disposição de países em desenvolvimento, revelou-se o mais
bem-sucedido modelo de cooperação entre os dois países.
Por meio dele, centenas de cabo-verdianos se formaram em
instituições de ensino brasileiras.
O atual premiê, José Maria Neves,
formado em administração pela
Fundação Getúlio Vargas de São
Paulo, é um dos que se beneficiaram dessa parceria.
Ex-alunos que voltaram para
trabalhar no país criaram em São
Vicente a Casa do Brasil de Cabo
Verde, uma instituição sem fins
lucrativos com o objetivo de estimular mais ainda o intercâmbio.
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