São Paulo, quarta-feira, 26 de junho de 2002

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EUROPA

Reforma na lei de partidos abre caminho para tornar o Herri Batasuna ilegal; partidos bascos protestam

Espanha deve cassar braço político do ETA

RODRIGO UCHÔA
DA REDAÇÃO

O governo espanhol está com as mãos livres para cassar o Herri Batasuna, braço político do ETA (grupo terrorista basco), depois de o Senado aprovar a reforma da Lei de Partidos Políticos. Hoje mesmo o premiê da Espanha, José María Aznar, deve levar a legislação para a assinatura do rei Juan Carlos e depois cassar o partido.
A reforma proposta pelo PP (centro-direita), partido de Aznar, contou com o apoio do principal partido de oposição, o socialista PSOE (centro-esquerda), o que justifica a larga margem de aprovação -214 a 15. Apenas o moderado nacionalista basco PNV e uma coalizão de partidos de esquerda foram contra.
"Querem fechar todas as vias legais de mudança em Euskadi [nome do País Basco em sua língua original"", afirmou o porta-voz do Batasuna, Pernando Barrena.
"Para mim, o Batasuna é a mesma coisa que o ETA", disse recentemente o premiê Aznar.
O governo afirma que o Herri Batasuna (Unidade Popular, em basco) desvia fundos partidários para a luta armada do ETA (sigla de Terra Basca e Liberdade). Ángel Acebes, ministro da Justiça da Espanha, afirmou que a lei pretende inibir que um partido político legal use sua sede "como depósito de armas e esconderijo de elementos criminosos".
"É uma declaração de guerra ao nacionalismo basco", disse José Navarrete, militante do partido. "A reforma é um subterfúgio para o avanço do nacionalismo espanhol. Que se cuidem Eusko Alkartasuna, Aralar, Zutik e PNV [outras agremiações bascas"."
Os representantes de outros partidos bascos vinham dando declarações mais serenas durante a semana passada, mas também não deixaram de criticar a reforma. "Não é uma boa lei. É incorreta porque afeta valores fundamentais da sociedade como o pluralismo e a liberdade ideológica, Begoña Lasagabaster, deputada do moderado Eusko Alkartasuna.
"É um absurdo que não encontra respaldo na Convenção de Direito Humanos da União Européia. O que dirão os eurodeputados?", pergunta José Navarrete.
Os porta-vozes do PP e do PSOE afirmaram ontem que o novo texto não se prestaria a cassar partidos "por causa de suas idéias ou por causa dos fins que preconizam", mas sim os que "são instrumento da violência e do terror".
Para o presidente do PNV, Xabier Arzalluz, a cassação do partido deve "servir apenas para acirrar os ânimos no País Basco".
O Batasuna teve 143 mil votos nas eleições regionais do País Basco ano passado. "Foram cerca de 10% de todo o eleitorado, o que reflete uma importância regional nada desprezível", afirmou a socióloga Josune Arpa.
O Parlamento regional conta com sete deputados da coalizão independentista radical. Para Arpa, "o PNV só é agora um partido mais expressivo por conseguir atrair muitos dos eleitores do Batasuna -que viu sua bancada cair pela metade no último pleito. Mesmo assim, acho que esses eleitores, votando ou não em outras agremiações, se sentirão traídos pelo processo político".
"Nossa esperança era que o Batasuna seguisse o caminho do Sinn Fein [braço político do grupo terrorista irlandês IRA", que, participando do jogo político, amainasse os ânimos e virasse um fator de estabilização do conflito", afirma Josune Arpa.
O debate sobre a reforma legal se viu alimentado nos últimos dias por causa de uma carta aberta dos bispos católicos bascos, em que expressavam o temor de que a cassação do Batasuna tivesse "consequências sombrias" e "agravasse a tensão". Após a divulgação da carta, 358 sacerdotes bascos deram apoio aos bispos.
Aznar disse que a carta era uma "perversão moral e intelectual".

"Índios da Europa"
Os bascos chegaram à região que hoje é o norte da Espanha e o sudoeste da França há cerca de 6.000 anos -apesar de alguns estudos sustentarem a tese de que essa migração pode estar situada 10 mil anos antes. Por causa disso, muitos historiadores se referem a eles fazendo uma comparação com os grupos indígenas da América pré-colombiana.
Porém apenas no ano 905 um Estado basco organizado aparece, o principado de Pamplona (católico, de oposição à ocupação muçulmana da península Ibérica).
Até antes da metade do século 19, as instituições políticas bascas vinham conseguindo sobreviver. Depois disso -e mais particularmente na ditadura franquista (1939-75)- o independentismo e a autonomia foram sufocados.
Apesar de regiões bascas do norte espanhol terem ganhado autonomia após a redemocratização, o ETA, formado na ditadura de Franco, vem implementando uma campanha terrorista há 34 anos. Mais de 800 pessoas já morreram vítimas do terror "etarra".


Com agências internacionais


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