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REINO UNIDO
Para estudiosos, empatia, consumismo e apelo religioso ajudam o craque a substituir a princesa no imaginário britânico
Beckham pode se tornar a "nova Diana"
CAROLINA VILA-NOVA
DA REDAÇÃO
Uma combinação aparentemente contraditória de empatia
popular, consumismo exagerado
e até mesmo apelo religioso pode
estar transformando David Beckham em uma "nova Diana".
Pelo menos é o que investigam
dois pesquisadores da Universidade de Warwick, no Reino Unido, que fizeram um estudo sobre
a ascensão do jogador de futebol
ao estrelato, na trilha da morte da
princesa de Gales, em 1997.
"Não estamos fazendo uma
afirmação, mas nos perguntando:
Beckham é a nova Diana?", disse o
sociólogo Andrew Parker, especialista em esporte, à Folha. "Mas
podemos dizer que, se alguém pode desafiar ou tem o potencial para estar par a par com quem Diana foi em termos de cultura britânica, Beckham está mais perto do
que qualquer outro."
A morte trágica de Diana em
um acidente automobilístico em
Paris, aos 36 anos, evidenciou a
atração de milhares ao redor do
mundo pela princesa, que expôs,
pela vitrine da mídia, uma vida
temperada por histórias de amor
infeliz, traição, desobediência à
família real e uma "volta por cima" em busca da felicidade.
E em que o jogador do Real Madrid se assemelha à princesa? Um
dos pontos principais é que ambos personificam a narrativa cultural da pessoa comum que se
torna uma celebridade. E isso
"apesar de Diana ter vindo de
uma das mais poderosas famílias
aristocráticas britânicas e de Beckham ser considerado um prodígio desde a infância", escreve Parker no estudo ao lado da socióloga Deborah Steinberg.
Para os pesquisadores, Beckham, como Lady Di, tem o poder
de fazer o público acreditar que o
conhece e que ele é uma pessoa
acessível. "Parte da estrela de Beckham é que ele é um homem sensível fora das quadras, dedicado à
mulher e aos filhos, e um bonito
objeto de fantasia", diz o estudo.
"Há um senso de humildade e
empatia neles e isso é muito incomum em celebridades, que normalmente são distantes, glamourosas e intocáveis", afirma Parker.
Ao mesmo tempo, parte do apelo de Beckham vem do fato de ele
não apenas ser rico, mas demonstrar sua riqueza, sem pudores,
com um consumismo "desenfreado". "O Reino Unido é uma
sociedade muito afluente, que está cada vez mais interessada no
consumismo. E Diana e Beckham
representam pessoas que estão no
pico de seu poder aquisitivo", diz
Parker.
"Talvez um fator de atração a
Beckham é que as pessoas podem
ambicionar ser como ele é e ter o
que ele tem em termos materiais."
O jogador tem ainda uma particularidade: ele é o protótipo do
metrossexual. "Beckham permite
ao homem normal, do dia-a-dia,
ter preocupações estéticas sem se
sentir afeminado ou se afligir com
críticas", afirma. Não é um "público-alvo" pequeno, lembra o
pesquisador - apenas na Europa, diz, os homens já gastam cerca
de 600 milhões de libras por ano
em cosméticos.
Em uma outra perspectiva, Beckham, como Diana, parece atender à explicação de alguns acadêmicos de que celebridades foram
se tornando mais populares a partir da perda de importância de
ícones religiosos.
"Talvez com Diana isso seja
mais evidente pelo fato de ela ter
morrido tão tragicamente e porque Beckham está envolvido nas
reviravoltas do futebol profissional, que é um empreendimento
"menos espiritual'", diz Parker.
"No entanto, é interessante notar como Beckham gosta de promover uma imagem de semelhança com Cristo. Algumas fotos
de revistas mostram-no como algum tipo de mártir. Essas imagens são poderosas e alimentam
nosso consciente", afirma.
Se o jogador irá de fato tomar o
lugar da princesa no coração dos
britânicos, os pesquisadores não
batem o martelo. "O lugar de Diana não precisa ser preenchido, necessariamente. Ela ainda é muito
popular. Mas há uma percepção
de que a estrela das celebridades
no fim das contas míngua e desaparece, e aí outro alguém sempre
surge", avalia Parker.
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