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comentário
Moscou seguiu o exemplo de Kosovo
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
O desmembramento do
território de determinado
país é por certo "violação
às leis internacionais e
uma ameaça à segurança"
regional. O alerta poderia
ter partido ontem do governo americano com relação à Geórgia. Mas foi
feito em fevereiro último
pelo chefe da diplomacia
russa, Sergei Lavrov, referindo-se, é claro, a Kosovo.
Há muitas analogias entre Kosovo, que há seis
meses se tornou independente da Sérvia com a ajuda dos Estados Unidos, e a
Ossétia do Sul e a Abkházia, que também buscam a
independência pelas mãos
do Kremlin. Nenhum desses "países", e eis a primeira constatação, têm hoje
viabilidade econômica.
E ainda: nenhum deles
obteria certidão de nascimento no Conselho de Segurança da ONU, onde os
vetos russo e americano,
dependendo do caso, inviabilizariam a votação de
um projeto de resolução.
Foi, aliás, em nome da falta de uma chancela da
ONU que o Brasil deixou
de reconhecer Kosovo.
Há ainda a questão do
reconhecimento internacional limitado. Kosovo
rachou a União Européia.
Países como Espanha,
Grécia, Bulgária e Chipre
temiam um precedente
perigoso para seus atuais
ou virtuais autonomistas
internos. Não têm por isso
embaixada em Kosovo.
Na época, a Rússia poderia teoricamente seguir o
mesmo raciocínio, já que
bem perto da Geórgia, no
Cáucaso, há o caso da islâmica Tchetchênia.
Agora, o reconhecimento diplomático dos sul-ossetianos e abkházios será
mais problemático. Moscou não tem mais a cortina
de aliados incondicionais
dos tempos da União Soviética. A China, que em
geral se junta à diplomacia
russa, tem um imenso rabo preso no Tibete.
Outra analogia entre os
dois casos está na impossibilidade de russos e americanos deslocarem contingentes para socorrer seus
aliados. No caso de Kosovo, a ligação entre a Sérvia
e a Rússia é cultural e histórica -vem desde a proteção dos czares a um aliado eslavo e de religião ortodoxa, ameaçado pelo
Império Otomano. Mas
Moscou não cogitou acender nos Bálcãs o pavio de
um portentoso conflito.
Em se tratando da Geórgia, está igualmente fora
de questão uma intervenção direta dos Estados
Unidos, já afundados no
Iraque e no Afeganistão e
que, de certo modo, instrumentalizaram aquele
pequeno país do Cáucaso-ao insistirem em seu
ingresso na Otan- para
colocar a Rússia numa situação estrategicamente
incômoda.
A independência de faz-de-conta da Ossétia do Sul
e da Abkházia é uma reafirmação da capacitação
do Kremlin de criar e alimentar esferas de influência. É a regra do jogo.
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