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LEI
Para a direita espanhola, ele quer "aparecer" ao pretender julgar Bin Laden e repressores argentinos; especialistas o apóiam
Onipresente, juiz Garzón conquista holofotes e inimigos
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
O juiz espanhol Baltasar Garzón, 48, que, há dez dias, acusou
formalmente 35 pessoas, incluindo o saudita Osama bin Laden, de
participar dos atentados de 11 de
setembro de 2001 ou de ter ligação
com a rede terrorista Al Qaeda,
vem sendo acusado por setores da
direita espanhola de "querer aparecer" ao perseguir personalidades conhecidas globalmente.
Todavia, para especialistas em
direito internacional consultados
pela Folha, seu objetivo maior é
defender os direitos humanos e a
aplicação do direito, motivado
pela idéia de que tem uma "missão histórica" a cumprir.
"Garzón não precisa de publicidade. Já é famoso, além de não ser
uma pessoa "midiática". O que
motiva suas ações é sua idéia de
que tem uma missão histórica,
pois crê nos direitos humanos e
luta pela aplicação do direito",
analisou Martin Ortega, da Universidade Complutense de Madri.
"Mesmo que uma câmera de
TV não lhe desagrade, Garzón
não age em busca de publicidade.
Quem ficaria triste se Bin Laden
ou [o ex-ditador chileno] Augusto Pinochet tivessem de responder judicialmente por seus atos?
E, quando acusa alguém, Garzón
não emite uma sentença, mas
busca a realização de um julgamento justo", avaliou Allan Ryan,
da Universidade Harvard (EUA).
O juiz espanhol, conhecido por
sua extrema dedicação ao trabalho, ficou famoso, em 1998, por
pedir a extradição de Pinochet.
Sua tentativa não deu resultado. O
ex-ditador voltou ao Chile, em
março de 2000.
Contudo Garzón já atuava na
defesa dos direitos humanos e
tentava julgar membros de ditaduras militares sul-americanas
bem antes disso. Desde 1987, ele
tem uma posição na Justiça espanhola que permite essas ações.
Para Ortega, parte da direita espanhola não gosta dele porque
"pensa que as ditaduras latino-americanas não foram tão más
quanto se imagina".
Em 8 de julho último, Garzón
solicitou a prisão -para futura
extradição- de 45 militares e ex-militares e de um civil argentinos
acusados de praticar tortura na
última ditadura (1976-1983).
O pedido foi atendido pela Justiça argentina, e 40 ex-repressores
foram detidos. Mas, em 29 de
agosto, o governo da Espanha decidiu não oficializar o pedido de
extradição. O caso gerou dúvidas
sobre a determinação de Garzón e
sobre as razões de sua "cruzada".
Mas, para Ortega, a atitude de
Madri pode ter fins políticos.
"O governo não quis atrapalhar
o processo de reconciliação nacional que está em andamento na
Argentina. Assim, a ação do governo contra Garzón pareceu ter
fins políticos", explicou Ortega.
Vale lembrar que outro juiz que
ficou famoso na década passada,
o italiano Antonio di Pietro (destaque da operação Mãos Limpas),
se tornou político, o que pode ter
sido levado em conta pelo governo espanhol. Este é de direita.
Garzón tem um "perfil de esquerda", segundo Ryan.
Há três fundamentos jurídicos
que permitem que um juiz busque julgar estrangeiros por ações
cometidas fora de seu país.
Primeiro, quando esses atos
têm repercussão em seu território. "Bin Laden está longe da Espanha, mas tem sob seu comando
pessoas envolvidas em atos cometidos aqui", afirmou Ortega.
Segundo, quando cidadãos de
um país são afetados, no exterior,
por uma conduta condenável internacionalmente, envolvendo
crimes contra os direitos humanos e de guerra. "Trata-se do princípio que deu base às acusações
de Garzón contra Pinochet, já que
espanhóis foram perseguidos por
seu regime", disse Ortega.
Terceiro, a existência de um sistema de Justiça universal, como o
que existia na Bélgica até pouco
tempo atrás. "O problema é que o
a Justiça universal é controversa.
Ninguém disse nada quando os
belgas julgaram pessoas que participaram do genocídio de Ruanda, pois se tratava de um caso extremo", indicou Ryan. "Todavia,
quando surgiram casos contra
Ariel Sharon [premiê de Israel] ou
Colin Powell [secretário de Estado
dos EUA], os limites desse princípio ficaram mais claros."
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