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Governo reprime nova revolta contra uso de verba pública para educação privada
DA ENVIADA A SANTIAGO
Tarde de Santiago na última
quinta-feira. Enquanto no Palácio La Moneda preparavam a
abertura da exposição em homenagem ao centenário de Salvador Allende (1908-1973), ouviam-se sirenes de carros da
polícia ali perto, onde ficam algumas das principais faculdades e colégios públicos.
Era mais um round dos confrontos entre estudantes universitários e secundaristas contra a lei de reforma educacional
proposta pelo governo -e já
aprovada na Câmara-, que
consideram uma maquiagem
na legislação da ditadura.
Os enfrentamentos aconteciam um dia após 4.500 estudantes marcharem na capital,
reprimidos pelos truculentos
carabineiros, a polícia militarizada, que os dispersava com jato de água e gás lacrimogêneo.
No fim de maio de 2006, menos de dois meses depois do início do governo Bachelet, os secundaristas protagonizaram a
maior mobilização desde o fim
da ditadura em 1990, imediatamente batizada com simpatia
de "rebelião dos pingüins", por
causa da gravata do uniforme.
O governo criou uma comissão, com participação dos alunos, para discutir a nova LGE
(Lei Geral de Educação). Os estudantes deixaram a instância
alegando não serem ouvidos.
O tema de fundo é o repasse
de recursos estatais a administradores privados de colégios,
que podem cobrar uma pequena soma ou nada dos alunos
que acolhem. Além disso, os colégios possuem critérios próprios de seleção.
Os estudantes, apoiados pelo
sindicatos dos professores, exigem que a subvenção seja eliminada e que o país priorize a
educação pública.
Com divisões na própria base
e sem maioria no Congresso, o
governo negociou com a direita, defensora das subvenções, e
passou a lei na Câmara. Falta
ainda o Senado.
A nova LGE não elimina o repasse, mas aumenta a fiscalização da educação sob gerência
privada e acaba com ao processo de seleção nesses colégios.
Segundo o jornal "La Nación", o governo repassa anualmente US$ 3 bilhões à rede de
ensino, US$ 1,1 bilhão às escolas públicas e US$ 1,6 bilhão à
rede subvencionada, que atende 500 mil alunos a mais do que
a primeira. A diferença equivale a 34% a mais.
"Sabemos que no sistema
neoliberal é impossível que a
educação seja só pública. Mas o
que não aceitamos é dar dinheiro aos privados", diz Rubén
Azócar, 18, que a Folha reencontrou depois depois de dois
anos, igualmente participando
de uma assembléia estudantil.
Já fora da escola secundária
pública e fazendo cursinho pago -"faltaram só cinco pontos
para eu entrar em direito"-,
cabelo crescido, Azócar tinha
aparência abatida.
"Não nos resta opção a não
ser continuar mobilizados. O
governo fala de melhora do índice de pobreza, do analfabetismo. Mas é só massificação.
Queremos qualidade."
Plebiscito
Alunos e professores preparam um plebiscito como última
tentativa de pressionar e parar
a tramitação do projeto, já que
a volta dos "pingüins" às ruas
não tem tanto apelo midiático
como ocorreu em 2006.
O senador Juan Pablo Letelier, que pertence à ala à esquerda do Partido Socialista,
parou na última quinta-feira
para falar com estudantes que
protestavam. Depois, falou à
Folha. "A lei da ditadura me
causa um mal-estar físico. É
uma aberração. Mas o que os
estudantes não entendem é
matemática. Não temos os votos para fazer uma mudança
profunda."
O senador é filho do diplomata Orlando Letelier, assassinado em Washington em 1976 pela polícia política do regime de
Augusto Pinochet.
(FM)
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