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Chile vive dilema com lucro do cobre e pressão das ruas
Principal produto chileno enche cofres públicos, mas Bachelet teme elevar gastos
Volta a debate lei do regime Pinochet que destina 10% do faturamento da Codelco a militares; no 1º trimestre, repasse foi de US$ 422 mil
Martin Bernetti-25.jun.2008/France Presse
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Estudante enfrenta tropa de choque durante ato contra lei educacional em Santiago
FLÁVIA MARREIRO
ENVIADA ESPECIAL A SANTIAGO
Com os cofres abarrotados
de dinheiro por conta do
"boom" do cobre e com vários
setores de olho na bonança, o
governo da presidente Michelle Bachelet enfrenta um dilema no Chile: seguir aumentando o gasto público, com o risco
de estimular a inflação que já
alcança 8,9%, ou fechar as torneiras e sofrer desgaste popular
na reta final do governo.
Os preços do metal, que já haviam dobrado de 2005 para cá,
bateram recorde de novo nesta
semana. A principal exportadora do cobre, com 20% do negócio, é a estatal Codelco, cuja
obrigação de repassar 10% do
que obtém com as vendas aos
militares voltou ao centro do
debate político.
É tanto dinheiro em caixa
por conta do cobre que, em nome da austera política econômica, nem o governo nem os
militares mantêm todo o dinheiro no Chile. A estimativa
da renda do metal é puxada para baixo no Orçamento, e a diferença vai a dois fundos no exterior, a serem resgatados em
tempos de vacas magras.
Segundo o Ministério da Fazenda chileno, a bonança permitiu um superávit de 8,7% do
Produto Interno Bruto em
2007. Os fundos também servem para tentar evitar a hipervalorização da moeda local, ao
manter os dólares fora do mercado. Mas setores sociais alertam para problemas urgentes
no Chile -a desigualdade, pelo
índice Gini, é a segunda maior
da região, só menor que a do
Brasil- , enquanto o dinheiro
rende lá fora.
E há pressões setoriais. Na
última sexta, funcionários do
Instituto de Previdência, em
greve, faziam piquete, com direito a sucessos de Xuxa em espanhol, pedindo plano de carreira às vesperas da estréia no
novo sistema de pensões. Já os
caminhoneiros fizeram greve
neste mês para exigir que o governo reduza um imposto sobre os combustíveis, também
em escalada. A justificativa é
sempre que La Moneda -a sede do governo- pode pagar por
causa do cobre.
"Não podemos baixar impostos contando com uma renda
que não é para sempre", justificou-se anteontem Bachelet.
Antes, com inflação menor, o
governo tinha segurado parte
das pressões sociais porque havia aumentado o gasto público
em 8% em média ao ano. "Ela
fez o que havia prometido. Aumentou gastos com saúde,
atenção à infância. Fez a reforma da Previdência, que é sua
obra mais importante", aponta
o analista Raúl Sohr.
Mas, com a inflação em alta,
consultorias econômicas pedem a Bachelet que reduza a
marcha dos gastos em 2009. O
problema é que esse é o último
ano de governo -as eleições
são em dezembro de 2009. "Este é o Orçamento no qual Bachelet pode impor um selo",
disse ao "Diario Financiero" o
economista da Universidade do
Chile Joseph Ramos.
Ele acha, em termos políticos, ser "pouco realista" pedir
ao governo que poupe ainda
mais para entregar o caixa
cheio ao sucessor. Em termos
econômicos, argumenta, essa é
uma inflação provocada pelo
choque de oferta de energia e
alimentos, e seria importante
acelerar o crescimento.
Militares e gestão
A alta do metal também renovou as discussões sobre o futuro da Codelco. Há um projeto
no Congresso para reformar a
direção da companhia -os analistas do setor citam como modelo de profissionalismo a Petrobras, não sem insinuar que a
companhia deveria abrir parte
do capital na Bolsa.
Está de volta também a grita
para que Bachelet envie ao Legislativo, onde não tem maioria, projeto para acabar com
uma das principais heranças da
ditadura. Por uma lei do regime
Pinochet (1973-1990), a Codelco, maior empresa do Chile e
maior mineradora de cobre do
mundo, responsável por US$ 1
de cada US$ 5 de exportações
que entram nos cofres públicos, repassa 10% do que obtém
com suas vendas aos militares,
que só podem usar o dinheiro
para comprar armamento.
Só no primeiro trimestre de
2008 a Codelco destinou US$
822 milhões ao Fisco e outros
US$ 422 milhões aos militares.
Na semana passada, o presidente da estatal, José Pablo
Arellano, relançou a controvérsia, dizendo que os 10% engessam a companhia. Com cautela,
La Moneda disse que o tema está em estudo, mas que era uma
opinião pessoal de Arellano.
Um general da reserva chiou,
dizendo que o assunto é de "segurança nacional", enquanto o
comando da ativa também foi
conciliador: discutirá, desde
que o governo encontre uma alternativa de financiamento a
longo prazo para os militares.
"O governo fica com esse blablablá da lei do cobre, mas ele
mesmo não quer mexer. E não
é para nos agradar, porque podemos nos sublevar. Estamos
respeitando a democracia no
Chile. O problema é criar mais
uma frente de discussão do Orçamento no Parlamento. Para
eles, também é melhor deixar
como está", disse um militar de
alta patente da Força Aérea sob
condição de anonimato.
Mas Raúl Sohr diz que desta
vez o projeto pode sair. "Há um
consenso. Há gente linha dura
no Congresso que se mostra
flexível. Os militares não têm
mais como justificar essa lei."
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