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ELEIÇÕES NOS EUA
Especialistas e políticos atacam segurança do sistema; Califórnia ameaça banir seu uso em novembro
Americanos questionam urna eletrônica
VITOR PAOLOZZI
DA REDAÇÃO
A cinco meses da eleição presidencial, o fantasma de um fiasco
como o ocorrido na apuração da
Flórida em 2000 assombra os Estados Unidos. Desta vez, porém,
não são as antiquadas cédulas em
papel que causam incertezas, e
sim as urnas eletrônicas.
A adoção de um sistema eletrônico de votação em boa parte do
país vai fazer com que cerca de 50
milhões de americanos, quase um
terço do eleitorado, votem em
computadores.
Só que o sistema eletrônico está
sendo atacado por especialistas
em computação, parlamentares e
grupos de ativistas. Além de criticar o funcionamento -houve
problemas em vários Estados durante as primárias-, os opositores da votação digital afirmam
que ela abre ampla avenida para
fraudes, reproduzindo uma discussão que até hoje ainda não acabou no Brasil (leia texto abaixo).
As principais queixas são de que
não há como se fazer uma recontagem, caso necessária, e que o
eleitor não tem como saber que o
seu voto foi anotado corretamente. A solução mais defendida é o
voto impresso: uma impressora é
acoplada à urna, e o eleitor confere, por um vidro, a cédula antes de
ela ir para um recipiente.
Segundo o Electionline.org, site
da Fundação Pew para monitorar
a reforma eleitoral, parlamentares
ou autoridades eleitorais de 25 Estados estão ou propondo leis ou
baixando normas determinando
o uso de impressoras. Outros 18
Estados adotaram o sistema digital sem o voto impresso.
Medo da Flórida
Rebecca Mercuri, pesquisadora
associada da Universidade Harvard, acredita que os Estados aderiram à novidade por medo.
"Muitas autoridades eleitorais me
disseram literalmente "não queremos ser a próxima Flórida". Se
elas acreditam, como lhes foi dito,
que ter papel significa ter uma
eleição não-confiável, então elas
não querem isso."
Para Mercuri, o melhor sistema
é o de scanners óticos (do tipo
usado em casas lotéricas; o eleitor
escolhe o número, ou candidato,
marcando com uma caneta).
No final de abril, as urnas eletrônicas sofreram um grande golpe:
o secretário de Estado da Califórnia, Kevin Shelley, proibiu o uso
de 14 mil máquinas da empresa
Diebold (uma de suas subsidiárias, a Diebold Procomp, fabrica
as urnas brasileiras) em novembro, a menos que mudanças sérias fossem implementadas.
Shelley ainda ameaça processar
a empresa por "ações fraudulentas". As acusações são de que a
Diebold instalou softwares que
não haviam sido testados nem
certificados e que mentiu a respeito disso para as autoridades. "Não
vamos tolerar a conduta enganosa da Diebold e devemos mandar
uma mensagem clara: não tentem
dar um golpe nos eleitores da Califórnia", afirmou Shelley em comunicado à imprensa.
Também não contribuiu em nada para a imagem da Diebold
quando se descobriu que, em
2003, o presidente da empresa,
Walden O'Dell, mandou uma carta a várias pessoas com um pedido de doações para o Partido Republicano em que afirmava: "Estou comprometido a ajudar Ohio
a dar seus votos no Colégio Eleitoral ao presidente [George W.
Bush] no ano que vem".
A credibilidade do sistema da
Diebold já havia ficado abalada
com a divulgação de vários estudos feitos em 2003 apontando sérias deficiências. O mais notório
desses relatórios foi um produzido por uma associação do Instituto de Segurança em Informação
da Universidade Johns Hopkins
com a Universidade Rice. O diretor do instituto, o professor de
ciência da computação Aviel Rubin, e sua equipe analisaram 49
mil linhas de programação (que a
Diebold diz ser apenas uma pequena parte de todo o pacote) e
chegaram à conclusão de que o
sistema tem falhas gravíssimas.
"Se eu fosse o criador de uma
máquina dessas, eu poderia decidir quem seria o presidente.
Quem quisesse comprar uma
eleição teria apenas de subornar
um dos programadores. E não há
nada que possa ser feito para detectar isso, porque é muito fácil
esconder dentro do software o
que ele realmente faz. Você pode
fazer parecer que está fazendo
uma coisa quando, na verdade,
está fazendo outra", afirma Rubin, que, pelo impacto de seu relatório, foi chamado a depor no
Congresso e recebeu um prêmio
da fundação Electronic Frontier.
Com todo esse debate, restam
poucas dúvidas de que haverá fortes emoções na eleição deste ano,
a qual promete ser tão disputada
quanto a de Bush e Al Gore. Em
2000, a batalha de recontagens e
impugnações das cédulas de papel que eram perfuradas e não
mostravam claramente o voto do
eleitor, na Flórida, só foi decidida
36 dias depois do pleito com uma
decisão da Suprema Corte.
"Acho que há uma alta probabilidade de termos controvérsias.
Não necessariamente porque haverá mais problemas. Com essa
disputa acirrada, haverá mais
gente olhando atentamente para
que seus candidatos não sejam
prejudicados", afirma Doug Chapin, diretor do Electionline.org.
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