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GUERRA SEM LIMITES
Para comitê parlamentar, proposta do premiê põe democracia em risco; associação policial apóia
Pacote dá superpoder a Blair contra terror
MARIA LUIZA ABBOTT
FREE-LANCE PARA A FOLHA, DE LONDRES
O governo do premiê britânico,
Tony Blair, quer amplos poderes
para lidar com ameaça de terrorismo e submeteu ao Parlamento
um projeto que prevê inclusive
desapropriações sem indenização
e a proibição de manifestações em
situações de emergência.
Mas a proposta, apresentada na
quarta-feira, já enfrentou sua primeira derrota, com a divulgação
de uma dura avaliação contrária
feita pelo comitê conjunto do Parlamento criado para examinar o
projeto. Segundo esse comitê, a
proposta é ampla e vaga, podendo
levar ao "desmantelamento da
democracia" no Reino Unido.
O presidente do comitê, Lewis
Moonie, ex-ministro da Defesa e
parlamentar do Partido Trabalhista, o mesmo de Blair, disse que
o governo apresentou uma proposta que não prevê salvaguardas
contra o mau uso dos poderes excepcionais. "Nas mãos erradas, (a
proposta) poderia ser usada para
solapar ou eliminar a legislação de
sustentação da Constituição britânica e infringir os direitos humanos", alertou. "Nossa democracia poderia ficar em perigo se o
governo não levar em consideração nossas recomendações."
O projeto de lei que provocou
essa reação prevê que o estado de
emergência pode ser decretado
pela rainha ou um ministro de Estado, a partir de uma decisão tomada com critérios "subjetivos e
vagos", segundo o comitê. Durante esse estado de emergência seriam proibidas as apelações à Justiça, com base na legislação de direitos humanos, contra ações
adotadas dentro desse período.
No caso de desapropriação, por
exemplo, a obstrução dessa medida passaria a ser crime, e qualquer
ação relacionada a isso seria decidida por um tribunal especial.
A proposta também prevê a
criação de programas de desocupações de emergência e a proibição de manifestações ou reuniões.
Pessoas presas dentro desse período poderiam ficar detidas por
prazo indeterminado, sem acusação formal. "É o colapso da liberdade civil em um país que é o berço da democracia moderna e tem
uma tradição secular de respeito
aos direitos dos cidadãos", disse
um porta-voz do grupo Stop the
War (pare a guerra), um dos movimentos políticos que mais crescem no Reino Unido.
"Nova Guantánamo"
Se a legislação for aprovada como está, poderia ser criada uma
"nova Guantánamo" (a prisão
dos Estados Unidos onde estão
detidos, sem julgamento, os acusados de terrorismo), segundo
Barry Hugill, porta-voz da Liberty, outra respeitada ONG de
defesa dos direitos humanos.
A comparação é especialmente
delicada porque em Guantánamo
estão presos cidadãos britânicos,
e o governo Blair está em negociação com os Estados Unidos para
que eles sejam transferidos ao
Reino Unido e julgados de acordo
com a legislação local.
Segundo o Stop the War, a definição de emergência no projeto é
tão ampla, e os poderes, tão grandes, que, se estivesse em vigor em
fevereiro deste ano, a ameaça de
conflito no Iraque poderia ter sido
invocada, e a grande passeata
contra a guerra, quando mais de 1
milhão de pessoas saíram às ruas
de Londres para protestar, poderia ter sido proibida.
Apoio da polícia
Mas a Associação dos Chefes de
Polícia do Reino Unido (ACPO,
na sigla em inglês) defendeu a legislação, alegando que as leis existentes estão em vigor há 80 anos e
precisam ser atualizadas para enfrentar as novas ameaças. "Os poderes [de emergência] estariam
sujeitos a um sistema triplo de salvaguardas, que são emergência
séria, necessidade genuína e aplicação a uma área geográfica mínima necessária", disse Alan Goldsmith, diretor da ACPO.
Segundo ele, o projeto prevê
que a decretação desses poderes
seja feita de forma clara e obriga a
prestação de contas de todas as
etapas. Para Goldsmith, a proposta "é necessária para que as pessoas no países sejam protegidas
de forma apropriada".
A Liberty reconhece a necessidade de atualizar a legislação, mas
alega que o foco da proposta de
mudanças está em ampliar a definição de emergência e aumentar
os poderes caso aconteça uma situação assim. Mas a organização
teme que o governo esteja usando
o "atual clima de medo e incerteza
para dar a si poderes enormes
sem considerar a proporcionalidade", segundo o porta-voz.
Hugill observa que o governo
Blair quer poderes que vão além
daqueles considerados apropriados quando o país enfrentou a Segunda Guerra, a Guerra Fria e os
mais de 30 anos de violência na Irlanda do Norte, que muitas vezes
afetou o Reino Unido. Segundo as
duas organizações, que estão em
campanha contra o projeto, ainda
é cedo para dizer se ele será alterado de forma significativa por
pressão do Parlamento, porque o
governo tem maioria.
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