|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Em decisão inédita, papa deixa Lugo voltar a ser leigo
Pedido de ex-bispo, que assume poder no Paraguai no dia 15, havia sido negado
Vitória de esquerdista em abril forçou revisão, saída política da Santa Sé; Lugo agradeceu a Bento 16 por mostrar "amor ao Paraguai"
DA REDAÇÃO
Em decisão inédita, o papa
Bento 16 concedeu ao presidente eleito do Paraguai, Fernando Lugo, a "perda do estado
clerical", o que permitirá ao ex-bispo assumir o poder, dia 15,
sem violar as leis do Vaticano.
Segundo comunicado lido
pelo núncio apostólico no Paraguai, Orlando Antonini, a medida foi tomada "pelo bem do
país". "É a primeira vez que isso
é concedido [a um bispo]. Foi
aceito porque o povo o escolheu e sua condição clerical é
incompatível com a de presidente", disse Antonini, cuja
função corresponde à de embaixador do Vaticano.
Lugo, que ganhou notoriedade como "bispo dos pobres" no
departamento de San Pedro,
comemorou: "Que amor tem
Bento 16 por nosso país! Queria
agradecer sinceramente sua
Santidade por uma decisão que
não foi fácil para o Vaticano
porque não tem precedentes".
A cúpula da igreja já havia negado o pedido de Lugo e se opôs
à candidatura do esquerdista
-as regras católicas proíbem
sacerdotes de ter funções políticas e a Constituição paraguaia
veta que sejam candidatos a
presidente e vice "ministros de
qualquer religião e culto".
O comunicado do Vaticano,
de 30 de junho, afirma que a vitória do ex-bispo exigiu "voltar
a considerar" a dispensa. Lugo
foi eleito em abril apoiado por
uma ampla coalizão, encerrando 61 anos de domínio do conservador Partido Colorado.
A nota da Santa Sé foi a fórmula encontrada para não violar o direito canônico nem criar
dificuldades políticas para o futuro presidente, já que o comunicado da "perda do estado clerical" não tem o caráter de punição. Lugo não precisará respeitar o celibato e "as demais
obrigações", diz o texto.
O status já havia sido concedido a padres, mas nunca a bispos. Lugo segue membro da
igreja, à diferença do ex-arcebispo da Zâmbia Emmanuel
Milingo, excomungado em
2006 após ordenar homens casados e de ele próprio se casar.
Histórico e aborto
Em 2005, Lugo renunciou à
diocese de San Pedro, uma das
regiões mais pobres do país,
quando sua atuação já desagradava os setores mais conservadores da igreja. Tornou-se bispo emérito. Em dezembro do
ano seguinte, pediu ao papa a
dispensa clerical, em nome das
transformações de que o Paraguai precisava.
A resposta do Vaticano, negativa, só foi divulgada em fevereiro último, já em plena campanha. A Santa Sé cobrava que
ele desistisse da disputa à Presidência. "Algumas de suas declarações já criaram grave desconcerto nos pastores e fiéis do
Paraguai", dizia o comunicado,
que trazia a suspensão de Lugo
como "primeira admoestação".
Lugo não poderia ministrar
sacramentos, mas mantinha
suas obrigações de sacerdote
ante o direito canônico. Já a
condição de bispo, afirmava o
texto, era um "serviço aceito livremente para sempre".
A suspensão já havia sido
aplicada ao então padre Jean-Bertrand Aristide, que se elegeu presidente no Haiti em
1991. Em 1994, Aristide deixou
a batina, em um situação pouco
amistosa com a cúpula católica.
No texto, o papa instou o presidente eleito do Paraguai a viver em coerência com o Evangelho. Lugo visitava a Argentina ontem, onde foi recebido pela presidente Cristina Kirchner. Enquanto isso, uma de
suas futuras ministras, Glória
Rubín, da pasta da Mulher, envolvia-se numa polêmica com
grupos religiosos por defender
o aborto.
Com agências internacionais
Texto Anterior: Artigo: Não é o véu, é a democracia Próximo Texto: Colômbia: Líder das Farc diz que luta armada continua Índice
|