São Paulo, segunda-feira, 12 de setembro de 2011

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A próxima onda na caça aos germes

Por GINA KOLATA


Sequenciamento do genoma vira arma contra epidemias


O paciente era um homem de 39 anos que vivia em uma área relativamente rural nos arredores de Houston, no Texas. Depois de um trabalho de soldagem, ele ficou ofegante e começou a tossir sangue e vomitar.
No pronto socorro, tinha pressão arterial perigosamente baixa e taquicardia. Os médicos lhe deram um antibiótico na veia e o transferiram para o Hospital Metodista de Houston.
Ele foi internado na noite de sábado, 4 de junho. Morreu dois dias e meio depois, na terça-feira de manhã.
Agora é terça à noite. Na autopsia, tudo apontava como causa da morte a inalação de antraz, que aterrorizara a nação em 2001.
"Sabíamos que tínhamos pressa em resolver isso", disse James Musser, chefe de patologia e medicina genética do Sistema Hospitalar Metodista de Houston. "Então colocamos em ação um plano para sequenciar o genoma."
Sequenciar pela primeira vez o genoma de uma bactéria, em 1995, levou 13 meses. Hoje, os pesquisadores podem fazer isso em poucos dias. E o custo por genoma caiu de mais de US$ 1 milhão para aproximadamente US$ 1.000.
Com o sequenciamento rápido do genoma, os pesquisadores podem montar uma "previsão do tempo" das doenças, tomando precauções contra as que estão emergindo -gripes ou doenças transmitidas por alimentos, ou então cepas bacterianas resistentes a antibióticos num hospital.
Musser e seus colegas acharam a resposta que buscavam. Não era antraz, mas algo próximo: Bacillus cereus em vez de anthracis.
Essa bactéria tinha em comum com o antraz vários genes associados a toxinas, mas apenas um dos quatro vírus que habitam a bactéria do antraz e contribuem para a sua toxidade.
A conclusão era de que a bactéria letal estava ocorrendo naturalmente no solo, e que geralmente não era tão perigosa. Então por que esse homem ficou tão doente dessa forma?
Ele era soldador, observou Musser, e soldadores são suscetíveis a infecções pulmonares, porque seus pulmões estão irritados com partículas de metal.
O médico Matthew Waldor, da Universidade Harvard, disse que a nova tecnologia de sequenciamento genético rápido "está alterando definitivamente todos os aspectos da microbiologia".
Outro mistério que a técnica esclareceu foi por que o cólera, desaparecido do Haiti por mais de um século, varreu o país depois do terremoto do ano passado.
O sequenciamento mostrou que a cepa do Haiti era diferente da bactéria do cólera existente na América Latina e África, mas idêntica à do Sul da Ásia, de onde Waldor acredita que um ou mais trabalhadores humanitários tenham trazido a doença.
Um dos colaboradores de Waldor nesse estudo, Eric Schadt, chefe do departamento de genética da Escola de Medicina Mount Sinai, da Universidade de Nova York, e diretor científico da Pacific Biosciences, quer fazer "previsões do tempo" para as doenças.
Ele começou com estudos-piloto, primeiro nos escritórios da sua própria companhia.
Durante vários meses, a empresa analisou os genomas de micróbios em diferentes superfícies, como mesas, computadores e maçanetas dos banheiros.
Com a chegada da temporada de gripes, as superfícies passaram a ter cada vez mais vírus da cepa gripal predominante, até que, no auge da temporada, todas as superfícies tinham o vírus da gripe.
Na sua própria casa, Schadt descobriu, espantado, que o puxador da porta da geladeira estava sempre contaminado com micróbios que vivem em aves e suínos.
Isso ocorria, notou ele, porque as pessoas não lavavam as mãos para guardar as carnes depois de preparar seus sanduíches. "Tenho lavado as mãos muito mais agora", disse.
David Relman, professor de medicina, microbiologia e imunologia da Universidade de Stanford, na Califórnia, está se concentrando na enorme volume de micróbios que vivem dentro ou por cima do corpo humano.
Há muito mais genes de bactérias do que genes humanos no organismo, observa.
Mas, se essas vastas comunidades microbianas são tão importantes para a saúde quanto os pesquisadores imaginam, questionou Relman, o que acontece quando as pessoas tomam antibióticos?
Utilizando o sequenciamento genético rápido de todos os micróbios em amostras fecais, ele descobriu que a comunidade microbiana se recupera, mas não exatamente como antes de ser perturbada pelos antibióticos.
E se uma pessoa volta a tomar o mesmo antibiótico num prazo de seis meses, os micróbios levam mais tempo para voltar, e a comunidade fica mais perturbada.
"Tudo tem um custo", disse.
"O problema é encontrar o equilíbrio certo. Como clínicos, não temos observado o custo para a saúde dos nossos ecossistemas microbianos."


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