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OMBUDSMAN
As ênfases e os números
BERNARDO AJZENBERG
Inicio com o e-mail de um leitor:
"Não sei se é modismo falar
mal de São Paulo ou vontade do
jornalista de impor uma opinião
pessoal, mas a reportagem sobre
o que os 22 corredores da Fórmula 1 acham sobre a cidade de
São Paulo está bem distorcida.
Tanto a chamada na capa de
"Esporte" quanto o título da notícia dizem que os corredores
têm medo da violência na cidade. Na verdade, apenas três fizeram esta afirmação. A maioria
diz conhecer pouco a cidade e
muitos citam o entusiasmo do
público pelas corridas ou os restaurantes, especialmente as
churrascarias, como algo que os
atrai em São Paulo... Foi dada
ênfase apenas a pontos negativos, mesmo quando estes representam a opinião de uma minoria pouco significativa".
O comentário, de Paulo Marcos de Carvalho, teve a companhia de outros, com críticas parecidas.
Eles se referem ao levantamento publicado na Folha domingo
(25)com os pilotos que hoje disputam o GP Brasil, baseado em
quatro perguntas: 1) O que você
acha de Interlagos?; 2) Qual é a
sua opinião sobre São Paulo?; 3)
Qual é a sua maior lembrança
de um GP Brasil?; e 4) O que você
espera para a prova deste ano?
A capa de "Esporte" dizia: "De
acordo com a maioria dos 22 pilotos, São Paulo é uma cidade
violenta e Interlagos representa
um excessivo desgaste". O sobretítulo: "Enquete feita com os 22
pilotos da categoria revela receio
pela violência da cidade e gosto
pelo churrasco". O título: "Para
F-1, correr em Interlagos é sacrifício".
Com a palavra, o leitor Eder
Pantiga Recio: "Pude ver que
apenas três pilotos falam isso
(sobre violência): dois brasileiros
(Barrichello e Burti) e Villeneuve. Os demais nem tocam no assunto".
Algo semelhante ocorre com a
"Ilustrada" da última sexta-feira. Depois de ouvir 146 personalidades, o caderno trouxe a seleção das melhores capas de discos
produzidas no Brasil. A campeã
é a dos "Secos & Molhados" (73).
Ao resumir em termos qualitativos a pesquisa, o texto afirma:
"...a enquete.. aponta para um
culto de preferência pelo Brasil
tropicalista e, especialmente, para as ousadias de natureza sexual e política cometidas por artistas da música no início dos
anos 70".
Mais até do que a da F-1, trata-se de uma pesquisa de grande
envergadura. Mas faltou registrar a "dispersão" da votação, a
qual, no mínimo, relativiza a tese acima. A capa vencedora teve
23 votos, apenas 16% do total. O
segundo colocado, "Todos os
Olhos", de Tom Zé, recebeu só
9,5%. Mais: 31 capas tiveram somente um ou dois votos.
Isso invalida o trabalho feito?
É evidente que não. Neste caso,
sem dúvida a referência histórica já está conquistada.
Mas essas observações revelam
que o tratamento editorial dado
a enquetes, quando faz se sobreporem aos números teses previamente concebidas, pode levar a
tão sintomáticas quanto involuntárias distorções.
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Bernardo Ajzenberg é o ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato
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