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OMBUDSMAN
Razão e emoção
BERNARDO AJZENBERG
Durante o governo Fernando Henrique Cardoso, em
especial no segundo mandato, a
Folha foi por vezes impiedosa.
Na economia, destacou-se por
enfatizar notícias negativas -o
que lhe valeu por parte de muita
gente a pecha de pessimista, enquanto outros a consideravam
apenas realista.
Sucederam-se no noticiário casos polêmicos, espinhosos para o
governo: compra de votos pela
reeleição, suspeitas de irregularidades nas privatizações, Dossiê
Caribe, Caso EJ, entre outros.
Nada mais natural, agora, que
esse posicionamento cético e distanciado -derivado de seu projeto editorial- se explicite diante do novo governo.
Daí a oportunidade do editorial "Mais democracia", publicado na capa de segunda-feira, que
terminava assim:
"Ao saudar a legitimidade do
presidente Lula, a Folha se compromete a manter sua linha editorial de independência e crítica,
na convicção de que o melhor
serviço que um jornal presta ao
país é iluminar, questionar e discutir a atuação de seus governantes".
Pode ter soado antipático por
sair no "day after" da vitória do
PT. Porém, ante o clima de festa
e euforia que tomou conta de
grande parte das ruas e da imprensa -no primeiro caso, genuíno, esperado e compreensível, no segundo, nem tanto-,
trata-se de uma postura legítima, transparente, saudável.
O quadro ao lado mostra, apenas para dar um exemplo, como
os jornais editaram nas capas de
quarta-feira o encontro entre
FHC e Lula. Além de não ter dado ao histórico evento um título
laudatório ou emocional, a Folha foi o único jornal cuja foto
não tinha como centro os políticos; o abraço entre eles dividia
espaço com a mesa presidencial
simbolicamente vazia.
Mais uma vez, pode parecer
birra do jornal. Penso, no entanto, que se trata de uma abordagem "fria", para um leitor que
busca análise e informação e que
deve ter outros fóruns mais apropriados para festejar ou lamentar o resultado eleitoral.
Desafio
Chega, porém, de elogios; o
ombudsman não é pago para isso. As dificuldades, para a Folha,
já começaram, e seu maior desafio é justamente aplicar aquela
linha, definida no editorial, de
forma criteriosa, equilibrada,
com qualidade.
Para isso, caberia mergulhar
profundamente na análise política e sociológica dos resultados
das eleições estaduais e nacional
-o que se fez até agora de modo
superficial ou só quantitativo.
Promover em suas páginas o
debate sobre os diferentes projetos e planos apresentados -algo
que se esboçou, creio, no caso do
Fome Zero.
"Descobrir" e revelar aos leitores personagens que começam a
ocupar a cena política, nomes
até há pouco ignorados, como
Palocci, Gushiken, Dulci, Graziano e outros que virão. Até
agora, seus perfis apresentados
ao longo da semana pelo jornal
foram minguados, esqueléticos.
Na situação que se abre, o noticiário deveria obrigar-se a sondar continuamente, com entrevistas ou pesquisas, a receptividade de diferentes setores -empresários, trabalhadores, servidores, sem-terra, mercado financeiro- aos passos do governo.
Simbologia
Ao contrário do que se fez nos
primeiros dias da semana,
quando foram subestimados elementos típicos de discursos ou de
atitudes de Lula, uma dedicação
específica caberia aos aspectos
simbólicos próprios desse personagem, sua trajetória, estilo, as
particularidades na relação com
seu partido e adversários.
Fazer tudo isso -e obviamente transmiti-lo ao leitor- requer
da Folha um reajustamento no
olhar, uma reeducação, a busca
de novas fontes de notícia, um
esforço concreto no sentido de se
reaparelhar tecnicamente.
Tudo isso, não custa enfatizar,
sem se deixar levar pela emoção,
por ímpetos adesistas ou oposicionistas -próprios de militantes e de partidos, não de uma imprensa verdadeiramente livre.
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Bernardo Ajzenberg é o ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato
de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade
por seis meses após o exercício da função. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva do leitor
-recebendo e verificando as reclamações que ele encaminha à Redação- e comentar, aos domingos, o noticiário
dos meios de comunicação.
Cartas: al. Barão de Limeira 425, 8º andar, São Paulo, SP CEP 01202-900, a/c Bernardo Ajzenberg/ombudsman,
ou pelo fax (011) 224-3895.
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ligue (0800) 15-9000; se deixar recado na secretária eletrônica, informe telefone de contato no horário de atendimento, entre 14h e 18h, de segunda a sexta-feira. |
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