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OMBUDSMAN
Crueldades da guerra
BERNARDO AJZENBERG
Pelo menos cinco jornalistas
já morreram (até o fechamento desta coluna) na cobertura da
invasão do Iraque pelas forças
da coalizão anglo-americana.
O último, o norte-americano
Michael Kelly, colunista do diário "The Washington Post", sofreu quinta-feira à noite um acidente durante confronto ao sul
do aeroporto de Bagdá.
Era um dos cerca de 600 correspondentes "encaixados", por
um programa do Pentágono, no
meio dos militares, no caso, a 3ª
Divisão de Infantaria.
Sua morte aquece ainda mais
a discussão sobre esse polêmico
programa. Politicamente, é um
desastre para os EUA -basta
lembrar que o "Post" é um dos
veículos de comunicação de
prestígio internacional que mais
abertamente apóia a guerra.
No domingo passado (30/3), o
jornal israelense "Maariv" trouxe o relato de dois jornalistas israelenses e dois portugueses que
se aproximaram de tropas norte-americanas no Iraque a partir
do Kuait.
De acordo com o depoimento,
eles foram humilhados, espancados, torturados e, depois, expulsos de volta para a fronteira. Título da reportagem: "Um pesadelo de 48 horas: presos pelos
americanos."
São vários, também, os relatos
dramáticos de repórteres "independentes", alguns, como publicou o diário francês "Le Monde"
no dia 3, mendicando água,
combustível e comida junto às
tropas da coalizão.
Permanece obscuro, até agora,
o caso de um jornalista da TV
britânica ITN, veterano em reportagens de guerra, que teria
morrido depois de cair do telhado de um hotel em Bagdá.
Some-se a esses exemplos um
número ainda impreciso de profissionais de diferentes países desaparecidos ou detidos por militares ou milicianos iraquianos.
Tudo em pouco mais de duas
semanas de um conflito que nem
sequer atingiu o auge.
Segundo grau
A crueldade da guerra para
com o direito à informação, porém, não se exprime só dessa forma nua e carnal -sem dúvida
mais dolorida e trágica do que
qualquer outra-, simplesmente
eliminando jornalistas.
Num nível paralelo, indireto e
bem mais amplo, essa crueldade
precisa contaminar igualmente
a própria produção jornalística,
pois ela parte do princípio de que
inexistem na atualidade campos
de batalha reais sem os seus "espelhos" virtuais: a propaganda,
a contra-informação, o blefe,
mas também, do outro lado, a
busca da informação fiel.
Ao prudentemente retirar de
Bagdá os seus enviados especiais
-por razões de segurança e de
logística, como explicou na edição de terça-feira-, a Folha,
único veículo brasileiro que
mantinha jornalistas na capital
iraquiana, assumiu-se, na prática, como vítima dessa espécie de
crueldade de segundo grau da
guerra.
Com isso, viu-se obrigada a
inaugurar uma outra fase em
sua cobertura do conflito no Golfo Pérsico, em pé de igualdade
com os concorrentes no que se refere à enorme dependência em
relação às agências internacionais e a material de articulistas
ou jornais estrangeiros.
Reflexo imediato
Nos primeiros dias, desde a
edição de quarta-feira, o reflexo
foi imediato. O jornal sentiu o
baque; teve dificuldades para
produzir um noticiário nitidamente diferenciado.
Uma comparação entre as edições de quinta da Folha e do "Estado de S.Paulo", por exemplo, é
significativa. Os dois cadernos
especiais trazem na capa, como
principal, a notícia da aproximação de Bagdá da coalizão,
um texto específico sobre a queda de um helicóptero dos EUA e
um mapa.
A segunda página, em ambos
os casos, abre-se com a informação de que civis de Najaf teriam
recebido os invasores de forma
amistosa -entre outras coincidências editoriais, bem superiores às poucas diferenças.
A importante seção "Guerra
de informação", reveladora das
armadilhas criadas na guerra
para a própria mídia, evaporou.
Até o momento, para dar um
outro exemplo, o jornal foi incapaz de aglutinar numa reportagem consistente os fatores econômicos por trás dos desentendimentos políticos ou diplomáticos
(dentro dos EUA, entre Europa e
EUA e mesmo entre o Reino Unido e os EUA) no que se refere à
"reconstrução" do Iraque.
Só na sexta-feira, procurando
novos enfoques, a Folha expressou uma reação, ao noticiar com
destaque a existência de críticas
à violação de direitos humanos
pelos dois lados envolvidos no
conflito.
Contrapeso
Tal como aconteceu por ocasião dos atentados de 11 de setembro de 2001 e da guerra do
Afeganistão, em 2002, a chance
de o jornal se fazer de novo indispensável na atual cobertura
(como vinha sendo, durante 13
dias, com os enviados especiais
ao Iraque) reside nessa estratégia: publicar edições cujas especificidades, para além do essencial dos fatos do dia, nem rádio
nem TV ou internet -muito
menos os demais jornais- sejam capazes de igualar.
Refiro-me a equilíbrio na exposição das forças em conflito,
criatividade nos temas a serem
privilegiados, mais profundidade nas análises militares, geopolíticas e diplomáticas, clareza
nos textos e nos quadros, pautas
inusitadas.
Somente com o poder da boa
surpresa o jornalismo da Folha
pode ajudar a produzir um contrapeso à ação permanente das
crueldades da guerra contra o
direito à informação.
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de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade
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