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OMBUDSMAN
Casamento imperfeito
BERNARDO AJZENBERG
É tão incomum, que vale a
pena refletir a respeito. Na
semana passada, a Folha publicou três manchetes infelizes, todas relacionadas a pesquisas:
Domingo: "Lula cresce, Ciro
cai, Itamar pára"; terça: "Governo admite feriado na 2ª, mas
58% desaprovam"; quarta:
"63% da indústria diz que vai
demitir".
Na primeira, há duas afirmações questionáveis. Tecnicamente, é falso que Ciro Gomes, o presidenciável do PPS, tenha caído.
Em março (última pesquisa),
ele tinha 17%, o que significa,
considerando a margem de erro
de dois pontos percentuais, um
intervalo entre 15% e 19%.
Agora, traz o Datafolha, aparece com 14%, ou seja, entre 12%
e 16%. Uma variação, portanto,
dentro da margem de erro.
Pode-se até dizer que há uma
probabilidade maior de que ele
tenha caído, mas não cravar o
fenômeno em manchete.
Se usasse coerentemente a redução numérica, o jornal deveria destacar, no título, que também José Serra (PSDB) caiu (de
10% para 7%), o que não fez.
Acrescente-se que o cenário
que permitiu a comparação com
a pesquisa anterior é hoje o mais
improvável (tem Paulo Maluf e
Antonio Carlos Magalhães como
candidatos) e que, no cenário
mais provável, Ciro tem 15%.
Itamar Franco (PMDB), por
sua vez, não parou, como quer o
título. Simplesmente porque não
vinha andando, nem para baixo
nem para cima (10% em 99, 10%
em março último, 11% agora).
Fenômeno não destacado: pela
primeira vez o governador do
Rio, Anthony Garotinho (7% em
março), empata tecnicamente
no segundo lugar (10%).
Troca de dias
Quanto à segunda manchete
("Governo admite feriado na 2ª,
mas 58% desaprovam"), há um
erro factual e uma contingência
da pesquisa que impediu qualquer acerto.
O que o "ministério do apagão" decidiu, conforme noticiado nesse dia (3) no caderno Dinheiro, foi criar um "gatilho"
que faça disparar um feriado
quando houver queda de água
num certo nível nos reservatórios, e este feriado, segundo os estudos, teria maior efetividade
numa sexta-feira.
O engano no título da manchete (admitido em "Erramos"
na edição do dia seguinte) talvez
tenha se originado no fato de
que, concomitantemente, o jornal trazia uma pesquisa mostrando que a maioria dos brasileiros é contra a adoção de feriados às segundas-feiras.
A pesquisa, obviamente, foi
feita com base em hipótese anterior e não podia ser modificada
a tempo. O resultado, então, foi
um enxerto desconexo.
Quanto à manchete de quarta,
considerei-a em minha crítica
interna "catastrofista".
Referindo-se às consequências
do racionamento de energia, a
pergunta aos empresários (em
pesquisa divulgada pela Confederação Nacional da Indústria)
era: "Será necessário demitir devido aos ajustes de produção?".
As alternativas de resposta:
"não haverá ajuste" (15%); "provavelmente não" (22%); e "provavelmente sim" (63%).
Quer dizer: o "provavelmente
sim", dito pelos empresários, foi
transformado em decisão já tomada e anunciada ("63% da indústria diz que vai demitir").
Imprudente alarmismo.
(Sobre essa manchete, faço um
parêntese gramatical. Alguns
leitores questionaram o uso do
verbo dizer no singular. Deveria-se escrever, na sua visão, "...dizem que vão...". O jornal, no entanto, está amparado nessa
questão. Segundo o Programa de
Qualidade, consultado pelo ombudsman, pelo menos três gramáticas sustentam a opção adotada: "Gramática da Língua
Portuguesa", de Pasquale Cipro
Neto e Ulisses Infante; "Moderna
Gramática Portuguesa", de Evanildo Bechara; e o "Dicionário
de Questões Vernáculas", de Napoleão Mendes de Almeida.)
Parceria
Ao criar o Datafolha, em 1983,
o jornal procurou aliar a investigação jornalística severa, agressiva e imparcial ao rigor técnico
e metodológico das pesquisas e
estatísticas.
A história dessa parceria está
resumida, por exemplo, no quarto capítulo do livro "Marketing
político e persuasão eleitoral"
(publicado no ano passado pela
Fundação Konrad Adenauer),
redigido pelo jornalista José Roberto de Toledo e pelo sociólogo
Mauro Francisco Paulino, diretor do Datafolha.
De lá para cá, houve enormes
avanços nessa relação. Os jornalistas não cometem tantos erros
de interpretação de pesquisas
quanto antes. E os pesquisadores
aprenderam a atender, sem prejuízo do rigor técnico, à precisão
e à pressa jornalísticas.
Os exemplos das manchetes
equivocadas mencionados aqui,
porém, testemunham que, apesar disso -usando uma expressão desses dois autores-, ainda
estamos diante de um "casamento imperfeito".
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de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade
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