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OMBUDSMAN
Mágica de ACM
Virou lugar-comum dizer que
o ex-senador Antonio Carlos
Magalhães é figura que desperta
ódios ou paixões, sem meio-termo. Isso talvez se justifique pela
sua radicalidade verbal e comportamental.
O que não parece justificável,
porém, é o espaço que a mídia
deu nos últimos meses para o ex-parlamentar baiano -e, pior,
continuou a dar depois de sua
renúncia, de modo acrítico, sem
questionamentos à altura do seu
"trombone".
De novo, na última semana, o
líder político frequentou, mais
do que qualquer membro do
"ministério do apagão", as páginas dos jornais.
Houve entrevistas na TV, repercussão ampla para acusações
sem provas (a mais pesada, sem
dúvida, sendo a feita contra o
presidente da República, apontado como ladrão pelo seu ex-aliado).
Houve espaço, inclusive, para
apreciações de cunho "psicológico" do ex-senador, que chamou
o compositor Caetano Veloso de
"egocêntrico". E por aí afora.
Peso eleitoral
Reconheça-se em ACM um talento midiático excepcional. De
modo realista, porém, o que ele
de fato representa que seja proporcional a essa difusão?
Em artigo publicado no "Correio Braziliense" no dia seguinte
à renúncia, o cientista político
Joviniano Neto trazia dados relevantes sobre o poderio eleitoral
carlista na Bahia.
A última eleição a governador
em que um candidato obteve
maioria, na Bahia, foi a de 1986,
na qual Waldir Pires, adversário
do carlismo, ficou com o apoio
de 55,5% dos votantes.
Quando ACM se elegeu, em
1990, foi com o correspondente a
27,3% do eleitorado. Nesse pleito, acrescenta o professor, o traço
mais destacado foi que as abstenções, os votos brancos e os nulos representaram 46,2% dos
eleitores. Em 1994 esse total subiu para 53%.
Afirma ainda o interessante
artigo que, em 1998, o candidato
do carlismo, César Borges, venceu com 30,5% do eleitorado, enquanto a soma de abstenções,
brancos e nulos atingiu 56%.
O jornalista Clóvis Rossi, colunista da Folha, lembra, além
disso, que ACM obteve a cadeira
no Senado com pouco menos de
2 milhões de votos, em um eleitorado de pouco mais de 7 milhões
(ou seja: 27,4%). "É um bom número", comenta Rossi, "mas daí
a ser o "rei da Bahia", como o tratamos, vai a distância que separa jornalismo de propaganda".
Outro elemento: ACM perdeu
muito cacife com a renúncia. É
inegável que, hoje, quem representa o PFL não é ele.
Espetáculo vazio
Como político, por sua história
e atuação no nível do poder durante décadas, por sua liderança
regional, ACM deve ser ouvido,
sim. Embora golpeado, não se
enterrou politicamente.
Como qualquer outro cacique,
tem direito, no jornal, a expor o
seu "outro lado".
Mas tudo isso deveria acontecer dentro de seu verdadeiro e
atual escopo.
Em vez disso, por que a mídia,
a Folha inclusive, tem cedido
tanto e tão visivelmente ao espetáculo vazio?
Especula-se sobre eventuais relações promíscuas entre ACM e
setores do jornalismo. Pode ser
verdade, mas isso ainda precisaria ser provado -como, aliás, as
acusações feitas por ele contra
adversários.
No caso da Folha, a única forma de resolver a questão é recolocar as coisas -no caso, o político ACM de hoje- no seu devido lugar.
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