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OMBUDSMAN
A chapa está (bem) quente
BERNARDO AJZENBERG
O ano se encerra, no campo
da mídia, sob o impacto de
pelo menos dois fenômenos vorazes: o marketing político e os
rearranjos na propriedade dos
meios de comunicação.
Está em curso uma roda-viva
espiralada, e quem não souber
enfrentá-la, ano que vem, correrá o risco da marginalização.
A questão é: como entrar na
briga e vencê-la -ou, ao menos,
sobreviver.
A ascensão vertiginosa da pré-candidatura de Roseana Sarney
é o exemplo mais claro de como
uma campanha de marketing altamente profissionalizada pode
produzir ingerências políticas,
criar novos cenários e, numa hipótese não absurda, apresentar
eventuais soluções ou alternativas para um impasse evidente
(no caso, a definição de quem,
afinal, será capaz de enfrentar
Lula nas urnas em 2002).
É fruto da combinação de um
uso frio e calculado da televisão
com a exploração ilimitada de
pesquisas de opinião, uma via
alimentando a outra.
Em palavras simples, a publicidade passou um verdadeiro trator em cima da política e tem obtido, até o momento, a concessão
quase integral da mídia.
Enquanto o nome sobe, o jornalismo desce.
Paralelamente, com a aprovação pela Câmara, terça-feira, da
emenda constitucional que permite a entrada de capital estrangeiro nas empresas de comunicação -decisão que, tudo indica,
se reproduzirá no Senado, com o
aval do Planalto-, devem se
multiplicar os movimentos de
reacomodação societária e o potencial de investimentos no setor.
Não pretendo discutir aqui os
riscos que isso acarreta para o
bom desempenho jornalístico da
imprensa -tema da coluna "Temores", de 25 de novembro, e que
certamente retornará- mas,
sim, esboçar as dificuldades previsíveis com as quais lidarão os
jornais, em especial a Folha, especificamente na guerra da concorrência.
Pois nessa mesma terça-feira, o
"Estado de S.Paulo" noticiou seu
ingresso na televisão, a começar
pelo Maranhão (que coincidência), com vistas a alcançar em
dois anos a constituição de uma
rede nacional. Isso, claro, apostando em parcerias valentes, munidas de muito dólar.
Na quinta-feira, o jornal "Diário de S.Paulo" trazia em manchete reportagem exclusiva, produzida em conjunto com o "Jornal Nacional", da Globo, sobre a
participação de policiais no tráfico de drogas na região central
paulistana.
Foi, este, o primeiro caso importante de "sinergia" entre os
dois veículos, pertencentes ao
mesmo grupo de comunicação.
Jornalismo de verdade
O "case" Roseana e os exemplos
acima mencionados são amostras de que o que vem pela frente
-a acachapante máquina publicitária e as pressões vivas da
concorrência- não será nada
fácil para a Folha. E de quais armas o jornal dispõe para encarar
a cena?
No terreno estritamente econômico, societário, comercial, esperam-se muitas, claro, mas interessa, aqui, enfatizar a principal,
residente em outros corredores e
salões, com nome e sobrenome:
jornalismo de verdade.
É certo que o jornal produziu
nas últimas semanas algumas reportagens, por exemplo, sobre a
situação social ou irregularidades político-administrativas do
Maranhão, Estado comandado
há décadas pelos Sarney.
Em que pese a qualidade desse
material, há de se convir que ainda foi pouco, foi tímido diante da
avalanche político-marqueteira
do PFL -e veja, leitor, que as
campanhas, a bem dizer, ainda
nem começaram.
Se a Folha pretende estar à altura do embate que se anuncia,
precisa superar a inércia e a acomodação.
Precisa se concentrar, investir
no que ela tem de mais precioso:
seus jornalistas, seu jornalismo. É
o que fará, no fim, a diferença.
Nas pesquisas, o jornal mantém como trunfo o apoio de um
instituto de credibilidade reconhecida (o Datafolha). Mas seria
grave erro contar com suas projeções como espinha dorsal durante a campanha eleitoral.
Esta só pode vir das reportagens, da investigação. Como a
que, no primeiro semestre, trouxe
à tona a questão das supostas
contas do ex-prefeito Paulo Maluf no exterior ou a das ações do
Exército na região do Araguaia;
e, mais recentemente, a do caixa
dois na campanha do PFL-PR e o
caso Pelé-Unicef.
Ou, ainda, de entrevistas certeiras, feitas no momento adequado
e bem conduzidas, como a com o
senador Eduardo Suplicy, semana passada.
Mas, por ser, como tem sido, esporádica, essa produção valiosa
não bastará.
Ao ininterrupto bombardeio
que virá sob diversas formas -e
ainda nem se falou da Copa do
Mundo-, deve responder a
constância desse tipo saudável de
apuração, as chibatadas jornalísticas bem sustentadas e permanentes, sem trégua, com a regularidade de um marca-passo.
Sem isso, nem dólar nem marco, nem iene nem peseta garantirão coisa alguma, ao menos daquilo que a Folha e seus leitores
sempre entenderam como sendo
a missão de um bom jornal (todos os dias).
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Bernardo Ajzenberg é o ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato
de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade
por seis meses após o exercício da função. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva do leitor
-recebendo e verificando as reclamações que ele encaminha à Redação- e comentar, aos domingos, o noticiário
dos meios de comunicação.
Cartas: al. Barão de Limeira 425, 8º andar, São Paulo, SP CEP 01202-900, a/c Bernardo Ajzenberg/ombudsman,
ou pelo fax (011) 224-3895.
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