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OMBUDSMAN
E nós na foto?
BERNARDO AJZENBERG
Você na certa já ouviu
(ou fez) o seguinte comentário: a mídia adora falar dos
problemas dos outros -e o faz
às vezes com muito alarde e facilidade-, mas, quando ela própria vira notícia, a coisa costuma mudar bastante.
Dois casos, nos últimos dias,
mostram que essa queixa não é
desprovida de sentido.
Na segunda-feira, a Folha publicou uma reportagem com o título "Inflação agora contamina
preços do lazer".
Com base em levantamentos
da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, o texto mostrava que aumentos de preço começam a aparecer de forma significativa não só em itens básicos (comida, por exemplo), mas
também nos serviços ou produtos considerados supérfluos.
Um quadro mostrava o quanto subiram os preços de 48 itens
nos últimos 12 meses. Encabeçando a lista estão as jóias
(41,4%) e o táxi (22,7%). Em seguida, os jornais (18,6%).
Os dois textos da reportagem
expunham os motivos alegados
para o comportamento dos preços em certos casos: cinema
(2,59%, portanto menos do que
a inflação do período medida
pela Fipe, de 6,05%), restaurantes (7,31%), automóveis (8,72%),
jóias e lavanderias (3,62%).
Quanto aos jornais, nenhuma
menção; apenas a taxa (18,6%)
no quadro -isso, claro, não por
falta de acesso à explicação.
Diga-se de passagem, essa nem
seria das mais obscuras. No caso
da Folha, por exemplo, um terço
do custo do jornal cabe aos chamados custos industriais (papel,
tinta, chapas, frisas etc), os
quais, segundo explicou-me a diretoria da empresa, são indexados ao dólar, sofrendo impacto
direto da desvalorização do real.
Completa ou não, eis ao menos
uma alegação. Nem a ela, porém, os leitores tiveram acesso.
Confiança
O segundo caso ocorreu no dia
8, quando se noticiaram os resultados de uma pesquisa feita em
47 países pelos institutos Gallup
e Environics sobre o grau de confiança que a população mundial
deposita nas instituições.
O grupo "Imprensa/mídia"
aparece em décimo lugar, com
49% de "muita ou alguma confiança" e 47% de "pouca ou nenhuma confiança". Fica atrás
das Forças Armadas, ONGs, instituições religiosas, polícia, governo, entre outras.
Eis uma má notícia, sem dúvida. No entanto, a reportagem,
editada num pé de página sob o
título "Políticos ficam por último
em ranking de confiança" (políticos, aqui, como sinônimo de
"Parlamento/Congresso"), simplesmente ignorava esses dados.
E isso até mesmo na edição nacional da Folha, na qual o tema
abriu uma página mas o desempenho específico do setor só apareceu em números, numa tabela,
sem nenhum comentário.
No mesmo dia, "O Estado de
S.Paulo" publicou os resultados
da pesquisa no caso brasileiro.
Aqui, imprensa e mídia aparecem em quarto lugar (58% de
muita ou alguma confiança),
atrás de "grupos religiosos e Igrejas", ONGs e Forças Armadas.
É uma performance acima da
média mundial, mas nem por isso capaz de provocar satisfação.
Os leitores da edição nacional
da Folha até foram informados
a respeito de alguns dados sobre
o Brasil (os setores líderes, acima
listados, e os lanterninhas, como
governo, polícia, Congresso e
FMI), mas nada puderam ler sobre a "nota" dada à mídia.
Quaisquer que sejam os motivos para essas omissões ou lacunas, o fato é que elas, obviamente, não ajudam em nada a que,
em próximas pesquisas, a credibilidade da imprensa por parte
da população suba pelo menos
um pouquinho.
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Bernardo Ajzenberg é o ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato
de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade
por seis meses após o exercício da função. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva do leitor
-recebendo e verificando as reclamações que ele encaminha à Redação- e comentar, aos domingos, o noticiário
dos meios de comunicação.
Cartas: al. Barão de Limeira 425, 8º andar, São Paulo, SP CEP 01202-900, a/c Bernardo Ajzenberg/ombudsman,
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