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OMBUDSMAN
A nossa guerra na mídia
MARCELO BERABA
Os moradores da Rocinha,
maior favela do Rio, vivem
desde a madrugada do dia 9 uma
terrível situação de guerra. O enfrentamento entre dois comandos
do narcotráfico pelo domínio territorial do morro resultou na sua
ocupação pela Polícia Militar e
em 12 mortes de moradores, policiais e traficantes.
A imprensa se mudou para a
Rocinha e tanto os jornais do Rio
como os de São Paulo fizeram
uma cobertura extensa. Junto
com o noticiário factual, ofereceram artigos analíticos e reportagens de apoio com enfoques variados, mas que tentavam buscar
entre especialistas explicações e
apontar soluções.
Foi uma boa cobertura? Acho
que, no geral, sim, porque conseguiu acompanhar de perto o drama de uma comunidade invadida e porque mais uma vez suscitou o debate sobre as raízes das
mazelas de nossas cidades.
Mas foi uma cobertura que expôs deficiências.
A primeira delas é a constatação de que também para a imprensa há duas sortes de cidadãos. Por mais que se esforcem, a
ótica dos jornais está voltada para os transtornos que se abatem
sobre os vizinhos de classes média
e alta, mais do que para os dramas dos moradores da favela. Os
episódios de invasões de morros e
mortes são uma constante no Rio,
mas só merecem atenção maior
quando ocorrem na zona sul.
Outra constatação é a falta de
continuidade no acompanhamento sério do assunto. A violência se instalou nas nossas cidades
na forma de bandos fortemente
armados há duas décadas e a cobertura das causas, do entorno
social e das políticas de segurança
é irregular. Isso dá a sensação
de inconseqüência, de superficialidade e de sensacionalismo.
A cobertura da violência, de
suas causas e soluções, exige profissionais tão preparados como os
de outras áreas já especializadas
do jornalismo.
O caso da Rocinha apontou
ainda para dois problemas sérios
para os jornalistas: os riscos que
correm e a falta de fontes nas comunidades dominadas ou invadidas. Os dois problemas estão relacionados.
Desde a morte do jornalista
Tim Lopes, em junho de 2002 na
Vila Cruzeiro, quando fazia uma
reportagem sobre o uso dos bailes
funks pelo tráfico, os jornalistas
do Rio não entram mais com
tranqüilidade nas favelas. O acirramento dos conflitos e a hostilidade em relação à imprensa,
identificada pelos traficantes como alcagüete, fizeram com que
várias empresas, inclusive a Folha, adotassem procedimentos
para garantir a segurança de seus
profissionais. Estas empresas têm
hoje carros blindados, várias colocam à disposição de seus profissionais coletes à prova de bala e todas adotaram como norma não
permitir que seus jornalistas corram qualquer tipo de risco por entenderem que nenhuma reportagem justifica uma vida.
Mesmo com todos estes cuidados, repórteres e fotógrafos continuam vulneráveis quando explodem episódios como este da Rocinha. Na segunda-feira, as ameaças dos traficantes foram diretas,
e na quinta, durante o enterro do
chefe dos traficantes, os jornalistas foram agredidos por
moradores.
Como decorrência deste problema temos que desde a morte de
Tim Lopes ficou mais difícil ouvir
os moradores das favelas e, portanto, a imprensa ficou dependente de fontes oficiais, como a
polícia e as associações de moradores, muitas delas ligadas ao
tráfico.
Este é um problema seríssimo,
talvez o mais sério neste momento
porque priva os moradores de um
canal de expressão e os leitores de
informações mais precisas.
Reproduzo, nesta página, três
entrevistas sobre essas últimas
questões, a dos riscos dos jornalistas e a dificuldade de acesso a informações locais.
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Marcelo Beraba é o ombudsman da Folha desde 5 de abril de 2004. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
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