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OMBUDSMAN
RENATA LO PRETE
Depois do ônibus
Luís Bittencourt/Folha Imagem - Reprodução TVE
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Levado por PMs, Sandro do Nascimento chefga ao camburão e, na sequência, é empurrado para dentro do carro da polícia |
"E le ainda saiu vivo do local." Era Sandro do Nascimento, o bandido que manteve
reféns sob mira de revólver e repetidas ameaças na segunda-feira passada, em um ônibus, na
zona sul do Rio.
A frase destacada acima surgiu no último parágrafo do texto
que abriu a cobertura da Folha
no dia seguinte. Não estava errada, mas de certo modo perdia o
ponto da história.
O "ainda" transmitia a idéia
de que Sandro teria começado a
morrer na rua, atingido pelos tiros que marcaram o fim do sequestro. As fotos, no entanto,
mostravam-no bem vivo, 100%
vivo, quando foi levado pelos policiais.
Outros jornais pontuaram seus
relatos com algumas pistas. Um
observou que Sandro foi visto
andando. Outro colocou em dúvida que ele tivesse sido baleado.
Não se trata de julgar, a partir
de uma única frase, o desempenho da Folha no caso da semana. Ele não foi especialmente
bom, mas também não foi ruim.
A frase é detalhe que ajuda a
iluminar um problema. Sua formulação, assim como a ausência
de informações que a complementassem, sugere que o jornal
teve dificuldades para identificar, no calor do momento, a segunda notícia desse episódio.
A primeira estava no ônibus:
as quatro horas de terror que terminaram com a morte da refém
Geísa Firmo Gonçalves. Impossível não enxergar a primeira notícia. O país inteiro a acompanhou pela televisão.
A segunda notícia estava dentro do camburão. Ali não houve
TV.
Uma leitora me procurou para
criticar referência feita a Anthony Garotinho na capa da Folha de terça-feira. Depois de resumir o acontecido e registrar a
manifestação do presidente da
República, o texto dizia que o
desfecho do sequestro, embora
não tivesse agradado ao governador do Rio, foi considerado
por ele "o melhor possível".
"Fiquei indignada quando li a
declaração", contou a leitora. "E
mais indignada fiquei ao descobrir, na reportagem interna, que
o governador fizera a afirmação
antes de saber da morte da refém, o que, convenhamos, é bastante diferente."
Ela fez questão de esclarecer
que não é eleitora de Garotinho.
Ainda assim, considera "absurdo" omitir o contexto em que a
frase foi pronunciada.
Muitas vezes, pondera ela,
quem tem pressa se fia exclusivamente na primeira página para
tirar suas conclusões.
A leitora está certa. Como de
hábito em episódios que monopolizam a atenção do público,
não faltaram declarações infelizes e/ou oportunistas de autoridades, Garotinho incluído. Isso
não autoriza o jornal a contar da
história apenas a parte que lhe
parece mais chamativa.
Quem faz sondagens de opinião pergunta o que quer, mas
deve estar preparado para ouvir
as respostas. Se o jornal gosta de
pesquisas, tem de ser transparente na hora de apresentar os resultados.
Na quinta-feira, a capa da Folha fez o certo ao registrar, ao lado da informação de que 54%
dos paulistanos reprovaram a
conduta dos policiais que mataram o sequestrador no camburão, o contraponto de que parcela expressiva dos entrevistados
(41%) aprovaram a ação.
Já a capa do caderno Cotidiano errou ao destacar o primeiro
percentual acima de sua manchete e nem ao menos incluir o
segundo na reportagem. Ele ficou perdido no meio dos gráficos.
Ainda que a reprovação tenha
conseguido maioria, é possível
argumentar que a aprovação tão
elevada seja até mais notícia.
Na mesma linha, o texto enumerou vários dados menos significativos antes de relatar, no último parágrafo, o apoio majoritário (67%) à polêmica proposta de
usar o Exército no combate à violência urbana.
Ao fazê-lo, o jornal cuidou de
assinalar que o apoio se dá "em
especial entre os que concluíram
apenas o 1º grau e entre os que
ganham até dez salários mínimos".
Dependendo das convicções de
cada um, pode-se lamentar ou
festejar esses resultados, mas não
é caso de escondê-los.
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Renata Lo Prete é a ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato
de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade
por seis meses após o exercício da função. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva do leitor
-recebendo e verificando as reclamações que ele encaminha à Redação- e comentar, aos domingos, o noticiário
dos meios de comunicação.
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