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OMBUDSMAN
Sempre aos sábados
MARCELO BERABA
Os três principais diários
brasileiros -Folha, "O
Estado de S.Paulo" e "O Globo"- e duas revistas semanais
-"Veja" e "Época"- receberam, no início de dezembro, um
release da Editora Record, a
maior da América Latina em livros não didáticos. O texto de
orientação para a imprensa
trazia no alto um lembrete em
letras maiúsculas, vermelhas e
sublinhadas: "Atenção: livro
distribuído à imprensa com
embargo até sexta-feira 10/12 (a
publicação de matérias e resenhas só está liberada a partir de
sábado 11/12)".
Embargo é como os jornalistas designam o acordo em que
os meios de comunicação
abrem mão da informação exclusiva e se comprometem a publicar juntos determinada notícia no dia escolhido pela fonte,
que pode ser uma editora, uma
gravadora ou um instituto de
pesquisas.
O livro enviado para as redações com a advertência do embargo foi a "História da Beleza", de Umberto Eco e Giromolo de Michele. É uma obra de
arte, com centenas de imagens
ao longo de suas 440 páginas, e
chega às livrarias às vésperas
do Natal com o preço de R$ 150.
No sábado, dia 11, tal como tinha ficado combinado, os três
jornais saíram com seus cadernos culturais muito parecidos.
"História da Beleza" foi a capa
da Ilustrada (Folha), do "Caderno 2" ("Estado") e do suplemento literário "Prosa & Verso" ("Globo").
Quem ganha?
Como escrevi na crítica interna
de segunda-feira, 13, não é a primeira vez nem será a última que
os jornais e revistas fazem acordos com editoras, gravadoras e
distribuidoras de filmes e anunciam juntos um grande lançamento mercadológico.
Uma pesquisa não exaustiva
feita com a ajuda do Banco de
Dados da Folha mostrou operações semelhantes em 14 de novembro ("Uma viagem pessoal
pelo cinema americano", de
Martin Scorsese e M.H.Wilson,
editora Cosac & Naify), 23 de
outubro (relançamento de "O
Continente", de Érico Veríssimo,
editora Companhia das Letras),
7 de agosto ("Por um Fio", de
Drauzio Varella, editora Companhia das Letras) e 26 de junho
("A Ditadura Encurralada", de
Elio Gaspari, editora Companhia das Letras).
Sempre aos sábados, dia em
que alguns jornais publicam
seus suplementos literários e todos dão mais espaço para o mercado de livros. A impressão que
fica é que os jornais estão mais a
serviço das editoras do que de
seus leitores. A pergunta é: quem
ganha com esta política?
Clóvis Saint-Clair, gerente de
Imprensa da Editora Record,
justifica a prática: "O embargo
deve ser utilizado sempre que o
material a ser divulgado interessa não apenas a um veículo mas
a todos. O recurso é utilizado pelas assessorias para garantir
uma divulgação justa e equânime de suas informações na grande imprensa, sem privilégios para "A" ou "B". Neste aspecto, a "garantia de exclusividade" exigida
por alguns veículos como moeda
de troca para publicação de resenhas, entrevistas ou reportagens
também deve ser discutida: não
raro, mesmo privando seus leitores da informação, muitos veículos deixam de publicar determinadas matérias só porque a concorrência já as antecipou".
É evidente que não existem
apenas duas alternativas: ou
participa do acordo ou não publica nada. Há o caminho intermediário, nem sempre seguido
pelos jornais, principalmente
quando estão diante de mitos,
do questionamento, do aprofundamento do assunto, do confronto com outras produções culturais tão boas sem o mesmo apelo mercadológico.
No caso do livro de Eco, embora tenha sido colocado nas mãos
de excelentes jornalistas, o tratamento que recebeu foi semelhante, quase que exclusivamente
descritivo. Foi tratado pelos jornais como a editora planejou,
como um presente de Natal.
Com exceção da "Veja", que foi
dura: "Só vale pelas figuras. Organizado por Umberto Eco, "História da Beleza" não cumpre o
que seu título promete".
Em recente palestra sobre os
desafios do jornalismo cultural,
Daniel Piza, que já foi da Folha,
agora é editor-executivo do "Estado" e autor do livro "Jornalismo Cultural" (Editora Contexto), advertia que os cadernos de
cultura não podem ser apenas
"caixa de ressonância da indústria do entretenimento". Lembrava que os cadernos "estão
presos aos press releases".
Concordo, embora não se possa generalizar. Concordo também com outro comentário seu:
"Em jornalismo cultural é muito
mais importante fazer melhor do
que fazer antes. Nossos cadernos
não têm feito nem uma coisa
nem a outra. Eles terminam parecidos entre si não só na escolha
e na hierarquia dos temas mas
também na abordagem. O tom
de press release substitui a resenha crítica; as entrevistas repetem as mesmas perguntas banais. E o leitor fica sem saber o
que é realmente bom em meio a
tal massa de eventos e produtos".
Os jornais não podem ignorar
o mercado consumidor de cultura e de entretenimento. O ponto
é descobrir até onde vai a subordinação a este mercado e onde
fica o exercício crítico e diferenciado do jornalismo.
Para as editoras, gravadoras e
distribuidoras de filmes, não há
estratégia de campanha publicitária melhor do que o lançamento simultâneo nos principais jornais e revistas. A questão é saber
o que é melhor para o leitor.
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Marcelo Beraba é o ombudsman da Folha desde 5 de abril de 2004. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
Cartas: al. Barão de Limeira 425, 8º andar, São Paulo, SP CEP 01202-900, a/c Marcelo Beraba/ombudsman,
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