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OMBUDSMAN
Erros e acertos
MARCELO BERABA
A Folha reconheceu, na edição de sexta, no alto de sua
Primeira Página, que publicou
uma manchete errada. Não é raro o jornal errar, mas é incomum
reconhecer o erro com tanto destaque. A notícia foi publicada dia
11 e tinha como base um relatório
divulgado pela OIT (Organização Internacional do Trabalho)
sobre trabalho infantil no mundo
que incluía dados sobre o Brasil.
O texto foi escrito com base nas
agências internacionais.
A reportagem informava, entre
outros números, que 559 mil
crianças e jovens brasileiros entre
dez e 17 anos são explorados como trabalhadores domésticos.
"Brasil tem meio milhão de
crianças escravizadas", dizia a
manchete da Folha.
O primeiro sinal de alerta partiu do jornalista André Petry, diretor da revista "Veja" em Brasília. Ele assinou um artigo, "Asneira internacional", em que
questionava os números que o relatório da OIT trazia sobre o Brasil. Descobriu que o trabalho não
informava sobre a metodologia
da pesquisa e que os números nacionais eram de relatórios antigos da Unicef e da OIT.
A Folha decidiu checar os dados que publicou e três jornalistas do seu quadro foram designados para a apuração. O resultado
foi publicado anteontem, no alto
da capa: "Dado sobre escravidão
de crianças estava errado". Dentro, sobre uma manchete semelhante, o jornal informava: "Para
agência da ONU, é impossível
quantificar trabalho escravo de
crianças; Folha corrige reportagem de 11 de junho".
O relatório da OIT não falava
em meio milhão de crianças escravizadas, mas de crianças no
trabalho doméstico. Descobriu-se, além disso, que os números da
OIT também estavam defasados:
segundo o IBGE, em 2002 o Brasil
tinha 482 mil crianças e jovens
em trabalho doméstico.
Mais de 400 mil meninos e meninas em trabalho doméstico é
assustador da mesma forma. E é
provável que boa parte deles viva
sob regime semelhante ao da escravidão. Mas dados errados tiram credibilidade de quem os
produz e de quem os divulga.
O jornal assumiu o erro: "Falhas de apuração da Folha, má
interpretação por parte de uma
agência internacional de notícias
(AP, Associated Press) e imprecisões nos informes da OIT à imprensa contribuíram para a publicação equivocada".
Leitores cobram, com razão,
que os jornais custam a reconhecer os erros e o fazem timidamente. Também acho isso. Nesse caso,
a Folha agiu rápido. Embora tenha sido um dos primeiros jornais no país a reservar um espaço
fixo para correções (a seção "Erramos", na página A3), é comum
o jornal demorar a reconhecer
uma informação errada.
Não é a primeira vez que a Folha estampa uma confissão na
Primeira Página, mas é raro. Levantamento feito pelo Banco de
Dados do jornal registra seis outros casos desde 1992.
O caso mais explícito de reconhecimento de erro que me recordo aconteceu em 4 de agosto
de 2000, quando o "Correio Braziliense" admitiu em manchete:
"O Correio errou". Na véspera,
tinha publicado reportagem com
denúncias contra Eduardo Jorge,
ex-secretário da Presidência. Assinava a correção, também sem
nenhuma evasiva, o então editor-executivo do jornal, André
Petry, o mesmo que agora descobriu erros no relatório da OIT e
na manchete da Folha.
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Marcelo Beraba é o ombudsman da Folha desde 5 de abril de 2004. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
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