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OMBUDSMAN
Buracos de jornal
RENATA LO PRETE
Depois de ler, no site da ombudsman, críticas de edições
da semana passada, um leitor
perguntou se eu havia notado que
boa parte de minhas observações
dizia respeito a "buracos" nas notícias, informações que o jornal ficara devendo. Alguns dos exemplos apontados por ele:
a) Na terça-feira, a extensa reportagem que apresentou o terceiro debate entre os candidatos à
presidência dos EUA não mencionou nem o horário nem as emissoras em que o encontro daquela
noite poderia ser visto.
O jornalista costuma subestimar a irritação causada por falhas como essa, confiando que
seus comentários serão sempre
mais úteis ao leitor do que a informação básica de que este necessita para avaliar o debate por
conta própria.
b) Páginas antes foi noticiado
que Telma de Souza (PT), ex-prefeita e candidata em Santos, acusa a administração de Beto Mansur (PPB), seu adversário no segundo turno, de compra superfaturada de pães.
Dois leitores, além de assessora
do prefeito, perguntaram por que
o texto omitiu que a empresa fornecedora de pães é a mesma da
gestão do petista David Capistrano, que enfrentou idêntica acusação de superfaturamento.
c) No dia seguinte, reportagem
atribuiu o decreto que tirou quase
todo o Nordeste do horário de verão ao "recomeço da disputa judicial entre os Estados e o governo".
Que disputa? Por que o Nordeste
rejeita o relógio adiantado? Nada.
Como se fosse lido em capítulos,
o jornal registra apenas o desfecho da história, assumindo que o
leitor viu e se recorda de explicações anteriores.
d) A capa de Esporte da mesma
quarta-feira falou exclusivamente da CPI da Câmara que investiga o futebol, sem fazer nenhuma
referência à comissão de objetivo
semelhante em andamento no Senado.
Na página seguinte, o assunto
era a CPI do Senado, tratada, salvo por uma menção no pé da reportagem, como se a outra não
existisse.
Em vez de lembrar que as comissões são duas e como isso
aconteceu, o jornal dá de barato
que todo mundo já entendeu e
não vê nada de estranho nas CPIs
simultâneas.
e) A Assembléia Legislativa do
Amapá votou pelo afastamento
do governador. João Capiberibe
sustenta que a decisão não tem
valor, pois o Supremo Tribunal
Federal havia anulado o processo
contra ele.
Como fica a situação? Depois de
atravessar duas matérias sem encontrar resposta clara, pensei que
ela viria em um texto publicado
na quinta-feira, feito a partir de
entrevistas com especialistas.
Seu título: "Advogados contestam decisão da Assembléia". Expectativa frustrada. O texto cujo
propósito era esclarecer a questão
jurídica se limitou a dizer, por
três vezes, que os entrevistados
consideraram o afastamento
uma "aberração".
Antes que se acuse a ombudsman e o leitor de excessivo apego
a detalhes, vale a pena observar
duas coisas.
A primeira é que, excetuada a
história do pão superfaturado, as
reportagens citadas foram as
principais de suas respectivas páginas. CPI foi capa de caderno.
Horário de verão e Amapá chegaram à Primeira Página.
A segunda é que todos são casos
de informação incompleta, que
por essa razão se torna tendenciosa, incompreensível ou simplesmente de pouca utilidade.
"É recomendável", diz o projeto
editorial da Folha, "que a gama
de assuntos a ser cobertos se reduza em alguma medida, desde que
em contrapartida (...) o tratamento que receberem seja mais
compreensivo". Os exemplos mostram a distância entre o dia-a-dia
do jornal e o que ele pretende ser.
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Renata Lo Prete é a ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato
de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade
por seis meses após o exercício da função. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva do leitor
-recebendo e verificando as reclamações que ele encaminha à Redação- e comentar, aos domingos, o noticiário
dos meios de comunicação.
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