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No reino do vale-tudo
Ao ler a Primeira Página de
terça-feira (edição SP), fui tomado de um ligeiro mal-estar.
Isso aconteceu, mais precisamente, ao prestar atenção na foto da parte inferior.
Nela (veja ao lado), um homem tenta se proteger do frio
sob um relógio desses que marcam também a temperatura.
Em minha crítica interna, escrevi o seguinte:
"Todo jornalista com alguns
anos de experiência terá o direito de se perguntar se a foto (...)
não é ou parece ser uma montagem -procedimento, creio,
inadequado para o jornal. É altamente improvável que o fotógrafo tenha encontrado um personagem do jeito e no local em
que este está. Como não tenho
certeza, sugiro verificar".
A secretaria de Redação ouviu
o repórter-fotográfico, o editor
de fotografia, investigou o caso e
constatou, de fato, uma fraude.
"A foto não é espontânea", diz
Gustavo Patú, secretário interino de Redação. "Não houve flagrante mas sim interferência,
artificial, do fotógrafo. A Folha
condena esse procedimento".
Ou seja, em vez de registrar a
imagem de um personagem autêntico achado na avenida daquele modo, guardando-se do
frio justamente naquele local, o
fotógrafo pegou um conhecido e
o plantou ali, criou um "fato".
Pode ter a ver com artes plásticas, publicidade, com o que for,
menos com jornalismo. E não
importa se se tratava de assunto
supostamente "menor", como a
temperatura da cidade. É questão de princípio.
Mais uma vez, de modo até
mais declarado do que no caso
dos "Erramos", é a credibilidade
do jornal que se abala.
Não por acaso, na Folha, adota-se o nome de "repórter-fotográfico" para essa função. Pois
se trata de fotojornalismo.
Por isso, cabe a pergunta: há
diferença, de raiz, entre tal atitude e o rumoroso caso da norte-americana Janet Cooke, que
em 81 ganhou um prêmio Pulitzer (depois retirado) com reportagem forjada no "Washington
Post" sobre uma criança viciada
em heroína?
Não. Ambas iniciativas atentam contra o jornalismo. A diferença é apenas de grau.
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Bernardo Ajzenberg é o ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato
de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade
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-recebendo e verificando as reclamações que ele encaminha à Redação- e comentar, aos domingos, o noticiário
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