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A bactéria que não houve
Uma precipitação ou uma falha de comunicação -ou as
duas coisas juntas, não se sabe
ainda ao certo- acabou gerando, no início da semana, um caso jornalístico memorável, proporcionado em especial pelo jornal "O Globo" e pelo "The New
York Times".
No sábado (20), o jornal do Rio
escancarou manchete de duas linhas, com letras garrafais, na
sua primeira página: "Sede do
NY Times no Rio recebe carta
com bactéria".
Referia-se a correspondência
entregue à representação do diário norte-americano supostamente com "esporos como os do
antraz", segundo relato feito no
dia anterior, na internet, pelo
próprio jornal de Nova York. Este, por sua vez, teria se baseado
em parecer da Fiocruz.
No domingo, o desmentido,
também duas linhas na capa:
"Carta ao "New York Times" não
tem bactéria antraz".
O "Jornal do Brasil" também
deu manchete (menor) ao assunto no sábado e publicou no
dia seguinte a negativa, com menos destaque.
A Folha, em sua edição nacional do sábado, foi mais discreta,
mas trouxe título de conteúdo
semelhante ao do "Globo": ""NY
Times" no Rio de Janeiro recebe
carta com bactéria"; providencialmente, trocou o título, na
edição SP, para "Rio investiga
carta com bactéria...".
Tão discreto quanto a Folha,
mas mais cauteloso, foi o "Estado de S. Paulo": ""N.Y. Times" relata envio de antraz a seu repórter no Rio".
Por trás dessa confusão esteve,
ao que tudo indica, um mal-entendido entre o escritório do
"NYT" e a Fiocruz, que nega ter
informado ao jornal que havia
no envelope uma bactéria semelhante ao antraz.
Além disso, é difícil supor que o
"Globo" tenha bancado tão vigorosa e arriscada manchete
sem o respaldo de alguma opinião oficial.
A atitude do jornal do Rio, de
todo modo, ao publicar de imediato a negativa com destaque
proporcional à notícia não-confirmada da edição anterior, merece registro positivo.
Contam-se nos dedos de uma
mão os exemplos de retratação
tão imediata e clara por parte da
imprensa.
O episódio deve servir de lição
na cobertura do bioterrorismo,
que já vinha padecendo de boa
dose de sensacionalismo -ingrediente que só favorece quem
quer criar o pânico. Em casos como esse, nem mesmo eventuais
palavras oficiais podem ser definitivas. O melhor, mesmo, antes
de publicar qualquer coisa, é
aguardar o martelo final dos
cientistas.
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