|
Texto Anterior | Índice
Conflito de interesses
O e-mail de uma leitora, segunda-feira, advertiu o ombudsman a respeito de um fato grave.
A capa do Acontece (encarte
da Ilustrada com roteiro de espetáculos) de 9 de março era
ocupada por uma reportagem
sobre a apresentação que o pianista Nelson Freire faria naquele
dia no Teatro Municipal ao lado
da Orquestra Sinfônica Municipal.
Ocorre que as notas musicais
contidas no programa distribuído aos espectadores no teatro
naquela mesma noite eram assinadas pelo próprio autor da reportagem da Folha.
Uma coincidência que fere um
princípio básico do jornalismo:
evitar o conflito de interesses.
Pode um jornalista, por mais
íntegro que pessoalmente seja,
por mais que tenha trajetória
impecável ou a consciência limpa quanto à sua própria independência, pode esse profissional
ser visto pelos leitores como isento ao escrever um texto sobre um
evento do qual ele próprio, ainda
que indiretamente, participa, inclusive de forma remunerada? É
evidente que não.
Tal procedimento não põe em
xeque a credibilidade do jornal,
despertando dúvidas sobre a sua
independência? Claro que sim.
Reproduzo a seguir trechos das
considerações de Irineu Franco
Perpetuo, autor da reportagem e
das notas, sobre o ocorrido:
"Meu procedimento é praxe,
não apenas entre a imprensa especializada em música erudita,
mas no jornalismo cultural em
geral (...) Nunca me foi pedido
explicitamente pela Folha que
não redigisse textos para programas de concertos, nem isso foi
colocado como pré-condição para o meu trabalho (...)".
"Sou um jornalista free-lancer,
sem quaisquer vínculos empregatícios. Prestei meus serviços
para o Teatro Municipal com os
mesmos compromissos com qualidade e independência que norteiam minha prestação de serviços à Folha desde 94; desta forma, rejeito energicamente qualquer acusação de cooptação (...).
Creio que nesses casos, como em
outros, a trajetória pessoal de cada um, e sua postura diante da
verdade, é que determinam o
que é ou não independência".
O editor da Ilustrada, Nelson
de Sá, afirma o seguinte:
"A Ilustrada não foi informada pelo free-lancer Irineu Franco
Perpetuo, que escreve há quase
dez anos para o jornal, de que ele
faria um texto encomendado
-e pago- pela OSM. Do contrário, não teria permitido a duplicidade. O procedimento é eticamente inaceitável."
Se tal duplicidade -condenada pelo "Manual da Redação"
da Folha- constitui uma "praxe" no jornalismo cultural, como
afirma Perpetuo, a situação é
ainda mais grave. Mas essa já é
uma outra discussão.
Texto Anterior: "Olhar brasileiro" Índice
Bernardo Ajzenberg é o ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato
de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade
por seis meses após o exercício da função. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva do leitor
-recebendo e verificando as reclamações que ele encaminha à Redação- e comentar, aos domingos, o noticiário
dos meios de comunicação.
Cartas: al. Barão de Limeira 425, 8º andar, São Paulo, SP CEP 01202-900, a/c Bernardo Ajzenberg/ombudsman,
ou pelo fax (011) 224-3895.
Endereço eletrônico: ombudsman@uol.com.br. |
Contatos telefônicos:
ligue (0800) 15-9000; se deixar recado na secretária eletrônica, informe telefone de contato no horário de atendimento, entre 14h e 18h, de segunda a sexta-feira. |
|