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A PRIMEIRA CRISE
Ironicamente, o governador
de Minas Gerais, Itamar Franco,
protagonista de uma das primeiras
crises políticas do segundo governo
do presidente Fernando Henrique
Cardoso, precipita, agora, aquela
que pode ser chamada de a primeira
crise do presidente eleito, Luiz Inácio
Lula da Silva. Na sexta-feira, em nota
ao mesmo tempo ríspida e sarcástica, o governador criticou o Partido
dos Trabalhadores por supostamente tratá-lo como "adversário".
No centro da polêmica está o suposto não-cumprimento de um
acordo entre Itamar Franco e o presidente Fernando Henrique Cardoso
que garantiria o repasse de uma verba de R$ 1,2 bilhão da União a Minas
Gerais. O valor, na argumentação do
governador, seria providencial para o
pagamento do 13º salário de servidores e viria como uma contrapartida
da União por obras de manutenção
em estradas federais que teriam sido
custeadas pelo governo mineiro.
Atribuindo parcela da responsabilidade pelo descumprimento do suposto acordo ao coordenador da
equipe de transição do PT, Antônio
Palocci Filho, Itamar Franco complementou a sua nota: "O que nos resta
perguntar é quem é afinal, hoje, o
presidente da República: o ex-prefeito de Ribeirão Preto ou o professor
Fernando Henrique?" O caso está repleto de exemplos de como o cálculo
meramente eleitoral pode revelar-se
pernicioso para os que, após o pleito,
adquirem (ou permanecem com)
responsabilidade administrativa.
Tudo começou com acenos, que
partiram tanto do então candidato
Lula quanto do próprio FHC, de que
haveria alguma ajuda financeira a
Minas Gerais. O tema interessava diretamente ao candidato do PSDB ao
Palácio da Liberdade, deputado Aécio Neves, que tratava de garantir o
apoio de Itamar Franco à sua candidatura e de conquistar para o Estado
melhores condições de governo no
difícil ano de 2003. Cálculo eleitoral
semelhante levou Lula a aproximar-se de Itamar Franco -e, de certo
modo, também de Aécio- e a defender, por diversas vezes na campanha, a renegociação de dívidas estaduais com a União.
Passada a eleição, o efeito colateral
daqueles acenos e daquelas promessas de campanha começa a aflorar. O
PT "descobriu" a incompatibilidade
entre o cumprimento de alguns de
seus compromissos de campanha e
a manutenção de um arrocho fiscal
sem o qual estará ameaçada a relação
do futuro governo petista com o FMI
-fundamental para a difícil transição do ano que vem.
Por sua vez, o gesto algo súbito de
FHC de reaproximar-se de Itamar
Franco e de acenar com repasse de
verbas para Minas não soa bem. Afinal, é ingenuidade, para dizer o menos, conceber que haja um repasse
extraordinário como esse para Minas
sem que outros Estados pleiteiem o
mesmo tratamento. Tampouco parece politicamente nobre FHC prometer dispêndios que podem comprometer seriamente a condução da
política fiscal do seu sucessor.
Enfim, caiu o figurino "paz, amor e
dinheiro para todos" da fase eleitoral, fato rapidamente acusado pelo
estilo peculiarmente histriônico de
fazer política de Itamar Franco.
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