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ALÉM DA VIOLÊNCIA
A onda de violência no Rio de
Janeiro é indissociável do tráfico de drogas. O crime organizado
obtém somas fantásticas com a venda de narcóticos porque o produto é
ilegal. Na teoria econômica, portanto, bastaria levantar a proibição que
pesa sobre as drogas para que a margem de lucro despencasse e, com ela
-acredita-se-, boa parte da violência associada ao tráfico.
Na prática, porém, as coisas são
bem mais complexas. É consenso
que uma eventual legalização das
drogas tenderia a elevar -talvez significativamente- os níveis de consumo, o que poderia ter impactos desastrosos sobre a saúde pública.
Para efeito de comparação, deve-se
lembrar que, segundo o Cebrid
(Centro Brasileiro de Informações
sobre Drogas Psicotrópicas), 68,7%
da população brasileira usa álcool
com alguma regularidade; 11,4% tornaram-se dependentes. Já a cocaína
foi experimentada ou é usada por
apenas 2,3% dos brasileiros; menos
de 1% desenvolveu dependência. É
evidente que, se o número dos usuários de cocaína -ou de qualquer outra droga pesada- subir descontroladamente, explodirá o de dependentes, com graves prejuízos para a saúde do indivíduo e para a sociedade.
Também parece claro que a atual
abordagem de combate às drogas,
com ênfase na repressão, vai falhando. Os EUA, maiores entusiastas da
estratégia repressiva, gastam perto
de US$ 20 bilhões ao ano para conter
a epidemia. Os resultados são pífios.
Na semana passada, foi divulgado
o relatório anual referente a 2002 do
Conselho Internacional de Controle
de Narcóticos (INCB), da ONU. O
panorama traçado por essa agência,
que é uma defensora ardorosa da repressão, não é nada animador. As
tentativas de controlar o plantio de
coca, por exemplo, vêm fracassando.
Na Colômbia, onde as autoridades
contam com a ajuda de um bilionário programa de ajuda dos EUA, até
houve algum progresso, mas que levou à ressurgência das plantações na
Bolívia e à transferência de lavouras
para o Equador e para a Venezuela.
Nem a presença de tropas norte-americanas é capaz de inibir agricultores. Depois da queda do Taleban,
que havia conseguido erradicar as
plantações de papoula no Afeganistão, a produção foi retomada em
2002. O INCB também aponta um
novo risco: o rápido crescimento no
consumo de drogas sintéticas, como
o ecstasy, que em breve poderão tornar-se as mais utilizadas do mundo.
O quadro geral não inspira nenhum otimismo. Os cartéis criminosos encontram na droga uma formidável fonte de recursos, que lhes permite manter organizações extensas e
bem armadas capazes de promover
até o terror quando lhes convém. Na
outra ponta, Estados gastam muito
na repressão sem resultados significativos. A legalização, que poderia
reduzir o lucro e a violência associados ao tráfico, tende a ser um desastre em termos de saúde pública.
Só o que parece certo é que a manutenção do "statu quo" não leva a lugar nenhum. O melhor caminho parece ser a mudança paulatina de paradigma. É rumar da atual repressão
para a descriminalização do consumo e, daí, sempre investindo na educação do jovem, quem sabe chegar à
legalização sem provocar um terremoto na saúde pública. No dia em
que as drogas estiverem legalizadas,
o poder do traficante -e sua capacidade de fazer estragos- não será
maior do que o do vendedor de cigarros ou do dono do bar.
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