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TENDÊNCIAS/DEBATES
O projeto sobre crimes na internet coloca em risco a liberdade na rede?
NÃO
Uma lei apenas para criminosos
EDUARDO AZEREDO
O SENADO aprovou em julho a
proposta que tipifica e determina punições para os crimes
cometidos com o uso de tecnologia da
informação. São delitos que crescem
tão ou mais rapidamente que a própria tecnologia. O texto modifica cinco leis brasileiras e tipifica 13 delitos,
entre eles, difusão de vírus, guarda de
material com pornografia infantil,
roubo de senhas, estelionato eletrônico, clonagens de cartões e celulares e
racismo, quando praticado pela internet. A proposta seguiu para a Câmara
dos Deputados para revisão final.
O projeto de lei segue as diretrizes
da Convenção contra o Cibercrime,
tratado internacional promovido pelo Conselho da Europa. Entretanto,
na incompreensão de que uma lei
dessa natureza seja necessária para o
país, algumas informações distorcidas têm sido divulgadas.
Fala-se em cerceamento da liberdade de expressão e censura. Nada
disso é verdade! A proposta fala exclusivamente da punição de criminosos, do direito penal aplicado às novas
tecnologias. Não há "criminalização
generalizada" de usuários, como dizem as interpretações apelativas de
fácil convencimento.
O projeto de lei não trata de pirataria de som e vídeo nem da quebra de
direitos de autor, que, no Brasil, são
matérias já tratadas por leis específicas. Não serão atingidos pela proposta aqueles que usam as tecnologias
para baixar músicas ou outros tipos
de dado ou informação que não estejam sob restrição de acesso. A lei punirá, sim, quem tem acesso a dados
protegidos, usando de subterfúgios
como o "phishing", por exemplo, que
permite o roubo de senhas bancárias.
O que acontece por negligência, imperícia ou imprudência só será crime
se estiver expressamente tipificado
como "culposo" na lei (parágrafo único do artigo 18 do Código Penal).
Na proposta de Lei de Crimes de
Informática, não há a tipificação de
crime "culposo". Portanto, não existem "milhões de pessoas atingidas
pela proposta", apenas algumas centenas de delinqüentes que usam a informática para praticar seus delitos.
No projeto, são considerados crimes apenas os "dolosos", praticados
por quem quis aquele resultado.
Além disso, o Código Penal trata da
exceção -ou seja, o crime. No seu artigo 23, existe a "exclusão da ilicitude", que diz que não há crime quando
a pessoa age no exercício regular de
direito (entrar na sua casa, usar seu
celular, usar seu computador...).
Tudo correrá em um processo legal,
que chegará às mãos de um juiz conhecedor de direito penal.
A proposta determina que os provedores guardem só dados de conexão -data e hora do início e endereço
eletrônico- e que os repassem à autoridade investigatória mediante requisição judicial. E, ainda, que eles repassem para a autoridade competente apenas as denúncias que tenham
recebido (de usuários lesados). O provedor não é um "dedo-duro", mas um
colaborador das investigações, o que é
hoje prática transnacional.
A proposta em questão tramita há
mais de uma década. Foi aprovada pela Câmara em 2003 e seguiu para o
Senado como PLC 89/03, onde foi
apensado a outros dois projetos. Após
cinco anos, o texto -relatado por
mim nas comissões de Educação,
Ciência e Tecnologia e Constituição e
Justiça e pelo senador Aloizio Mercadante na Comissão de Assuntos Econômicos, onde recebeu emendas- foi
aprovado como substitutivo.
Da discussão, participaram juristas, como o desembargador Fernando
Botelho, membros de associações de
classe, advogados especializados, o
Ministério da Justiça, o Gabinete de
Segurança Institucional da Presidência da República, as Forças Armadas,
o Ministério Público, juízes, policiais,
analistas de sistemas e consultores legislativos. Foram várias palestras e
seminários no Brasil e no exterior,
além de reuniões e audiências públicas no Senado e na Câmara.
O projeto foi, portanto, amplamente debatido. Todos os que quiseram
participar foram ouvidos e várias sugestões foram incorporadas, outras
não convenceram os senadores.
Quem usar a tecnologia para o bem
estará protegido; quem a usar para o
mal finalmente será punido. O bom
usuário pode e deve ficar tranqüilo.
EDUARDO AZEREDO, engenheiro, é senador da República pelo PSDB-MG. Foi prefeito de Belo Horizonte e governador de Minas Gerais, além de analista de sistemas da
IBM, presidente do Serpro, da Prodemge, da Prodabel e da
BMS - Belgo Mineira Sistemas.
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