|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES
A moral em queda livre
Em um trabalho que me caiu nas
mãos por razões transversas
-pois estava procurando alguma literatura sobre reputação em geral-,
o autor diz que, entre 1910 e 1912, a
simples presença de um diretor do
Banco J. P. Morgan em um conselho
de empresa elevava o valor dessa empresa em, no mínimo, 30%. Um aval
ou parecer daquela instituição bancária era o diferencial entre as empresas
que iam para o céu e as que iam para o
inferno ("Did J. P. Morgan's Men Add
Value?", J. Bradford De Long, Chicago, 1991).
A referida valorização não era fictícia. Ao contrário, advinha de uma
análise cautelosa do desempenho das
empresas -não apenas de seus balanços mas também de seu desempenho econômico, de suas reservas e, sobretudo, da conduta ética e moral dos
seus dirigentes.
Que diferença para os dias de hoje,
quando muitas empresas têm balanços de vitrine, desempenho de ventanias e condutas de falsetes, incluindo
aqui dirigentes, auditores e bancos de
retaguarda. As decisões dos investidores dependem de informações que
eles não conseguem obter diretamente dos produtores -afinal, não faz
parte do seu ramo entender de produção e de vendas.
Quando os "produtores-informantes" falham, os investidores embarcam em canoas furadas e, quando descobrem o que aconteceu, pulam fora
com exímia agilidade, deixando em
seu rastro turbulências que devastam
a economia como um todo.
É irônico verificar que, na era da informática, milhões de pessoas agiram
na base da ignorância durante toda a
década de 90, quando a economia estava sendo tocada por espumas de
ações artificialmente inflacionadas
para beneficiar quem era remunerado
com base em seu valor -os altos executivos.
E os redatores da revista "Business
Week" perguntam: "Será que fomos
todos tolos? Por que caímos no mesmo conto do vigário se, como nunca
na história, dispúnhamos de toneladas de informações em tempo real?".
Os próprios jornalistas respondem
às suas inquietantes questões: "O mercado funciona quando a informação é
honesta". Do contrário, entra em colapso ("Can Trust Be Rebuilt?", "Business Week", 8/7/2002).
É isso mesmo. No sistema de livre
concorrência, "a mão pode ser invisível", mas os fatos deverão basear-se
em fortes lastros de confiança. Até o
momento, nada conseguiu substituir
a velha reputação.
E agora? Como reconstruir a confiança? Como curar as moedas apodrecidas? Só há um remédio: muito
trabalho e muita paciência! O tropeço
causado pela trapaça vai exigir décadas de suor e de lágrimas. Vejam o caso do Japão: são mais de dez anos de
recessão.
É sempre assim. É mais fácil recuperarmo-nos de uma falência econômica do que de uma falência moral. Mesmo assim, isso só tem sucesso se os
guerreiros preservarem a sua reputação.
Esse vai ser o grande desafio dos
próximos dez ou 15 anos. No momento, a moral ainda está descendo a ladeira.
Antônio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.
Texto Anterior: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: O Big Four Próximo Texto: Frases
Índice
|