São Paulo, segunda-feira, 08 de setembro de 2008 |
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Editoriais Brasil mais nuclear
DEZOITO ANOS depois de deitar uma pá de cal no programa nuclear paralelo e na veleidade de construir uma bomba atômica, o Estado brasileiro está a ponto de adotar uma política clara para o setor. Com a decisão de completar em 2014 a usina Angra 3, paralisada nos anos 1980, e mais duas centrais (4 a 8 usinas no total), cessa a ambivalência e engrena-se uma nova marcha. A origem militar do programa se reflete no papel-chave da Marinha, detentora da tecnologia de enriquecimento do urânio. Centrífugas por ela desenvolvidas aparelham hoje a fábrica de combustível das Indústrias Nucleares do Brasil, estatal sob controle civil da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen). O objetivo da Marinha, construir um submarino, envolve apenas propulsão nuclear, não armamento. A maturidade do projeto nuclear se expressa na disposição de criar uma agência fiscalizadora separada da Cnen. Hoje a comissão acumula tal função com a de fomento à atividade nuclear, um foco de objeções por organismos internacionais. Espera-se que a separação, proposta por um comitê de 11 ministros, seja referendada pela Presidência da República em outubro. O novo programa prevê ainda auto-suficiência em combustível nuclear em 2014. Se chancelado, consagrará a geração de energia elétrica como sua espinha dorsal. Há muitas razões para isso, como aproveitar a sexta maior reserva de urânio do mundo e diversificar a matriz energética. Termelétricas nucleares funcionam a qualquer tempo, independentemente da meteorologia. Representam, por isso, uma alternativa atraente para fortalecer o sistema elétrico. Em contraste com usinas alimentadas com combustíveis fósseis, não favorecem o aquecimento global. Se o acidente de Tchernobil (1986) ainda levanta dúvidas sobre a segurança de usinas nucleares, o histórico do uso de combustível físsil para produzir energia é francamente favorável nesse aspecto. A tragédia na Ucrânia foi o único acidente com vítimas fatais registrado em 54 anos. Mais de 400 usinas estão em funcionamento no mundo e dezenas de novas plantas estão em construção. A opção de expandir a matriz nuclear não desobriga o governo de investir em eficiência energética e fontes alternativas. Seria irracional, porém, deixar de explorar jazidas de urânio com potencial para fornecer energia durante séculos. A nova escala de investimento em capacitação tecnológica beneficiará ainda outros setores, como o fornecimento de radiofármacos para medicina nuclear e aplicações na indústria. Mas persistem duas incógnitas: o chamado lixo nuclear -que precisa ficar isolado por muitos anos para não ameaçar a saúde pública- e os custos da energia produzida nessas usinas. A Cnen projeta construir um depósito para os rejeitos, que no entanto só ficaria pronto em 2026. Quanto ao custo da energia, o governo estima um preço competitivo com o de outras fontes, mas tais cálculos dependem de fatores inescrutáveis, como futuras cotações do petróleo. Próximo Texto: Editoriais: Situação em disputa Índice |
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