São Paulo, sábado, 09 de agosto de 2008

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Editoriais

Flutuações ríspidas

Para o Brasil, uma súbita desinflação da "bolha das commodities" teria efeitos delicados, como risco de fuga de capitais

OS FOCOS que alimentam o ambiente de alta incerteza na economia mundial desde meados do ano passado são dois: os desdobramentos da crise financeira que tem como epicentro os Estados Unidos e como estopim o repique da inadimplência no crédito hipotecário; e o comportamento extremamente volátil dos preços das mercadorias básicas, as chamadas commodities.
Quanto ao primeiro fator, as notícias não chegam a significar superação da crise -haja vista os enormes prejuízos anunciados por duas das maiores companhias de garantia de crédito à casa própria dos EUA. Sugerem, contudo, que o receio de uma debacle bancária, que chegou a ser intenso no começo do ano, continua, lentamente, a se dissipar.
Mas o destaque do momento é o recuo dos preços das commodities, que susta a violenta escalada iniciada no fim de 2007. A evidência de que as economias de EUA, Europa e Japão se acham em franca desaceleração indica uma menor demanda global por produtos primários.
Iniciativas de autoridades econômicas no mundo emergente reforçam esse quadro. Com o fito de combater a inflação, aumentam os juros e tomam outras medidas que visam a moderar o ritmo de crescimento econômico.
Tal ambiente estimula, ainda, a desmontagem simultânea de operações especulativas que sustentavam os preços de produtos básicos em patamar elevado. Tudo somado, as cotações das commodities caem com força. O movimento atinge uma gama de produtos, com destaque para o petróleo. O preço do barril, que há poucas semanas arranhava os US$ 150, recuou rapidamente e fechou ontem a US$ 115.
Se a alta do petróleo, dos metais e dos produtos agrícolas foi essencial para agravar a carestia em todo o mundo, uma acomodação das suas cotações seria bem-vinda para o combate à inflação. Não há, porém, a menor segurança quanto aos próximos movimentos dos preços das commodities. A violência das flutuações recentes, para cima e agora para baixo, dificulta bastante os prognósticos.
No entanto, como fica cada vez mais nítido o cenário de letargia econômica nos principais motores da economia mundial, os riscos maiores parecem se deslocar para a direção da queda das commodities, que pode até aprofundar-se dramaticamente.
Para o Brasil, uma súbita desinflação da "bolha das commodities" traria implicações delicadas. A queda do superávit comercial tenderia a tornar-se abrupta, pois a alta no faturamento com as exportações ainda verificada se deve exclusivamente ao aumento nos preços dos bens exportados. Na hipótese de essa cadeia de eventos elevar a aversão global ao risco, a saída de dólares do país seria intensificada.
Diante dessa ameaça, o fato de o Banco Central hoje contabilizar US$ 200 bilhões em reservas internacionais representa um trunfo para amortecer a instabilidade. Já a oportunidade de dispor de um outro anteparo importante contra crises -a contenção de gastos correntes do governo e a elevação da poupança fiscal- tem sido desperdiçada.


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