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GUSTAVO FRANCO
Maldição ou bonança?
HÁ MUITA incerteza sobre a
real dimensão da descoberta de lençóis petrolíferos no
chamado "pré-sal". Mas o fato é
que o país se vê dividido entre dois
sentimentos polares: o de que ganhamos um bilhete de loteria e o de
que estamos diante de uma
maldição.
E é bem possível que os dois sentimentos sejam procedentes em alguma medida, o que nos leva impreterivelmente a um terceiro: o de
que esse assunto é muito mais difícil do que parece.
Os que falam sobre maldição e
desindustrialização, como a ministra Dilma Rousseff, têm como fundamento o debate que começou faz
tempo sobre os efeitos da valorização cambial sobre a indústria. É no
contexto dessas querelas que se
ouve falar, vez por outra, de uma
experiência nacional mais relevante para o assunto do pré-sal: a da
descoberta de gás natural em
abundância no subsolo dos Países
Baixos nos anos 1960. O termo
"Doença Holandesa" foi usado pela
primeira vez pela revista "The Economist", em 1977, para descrever o
que se passou com a indústria daquele país após o início da exploração da nova jazida por meio da
maior parceria pública privada até
então implementada no planeta.
Muita coisa foi escrita sobre este
assunto desde então; os técnicos do
governo devem estar lendo um bocado para mostrar ao presidente os
diferentes ângulos do problema.
Independentemente disso, a discussão sobre a formação de uma
nova estatal, em lugar da Petrobras, para a exploração do petróleo
do pré-sal, e também a palpitaria
sobre o destino dos recursos, parece compor a "tempestade perfeita"
em matéria de polêmica econômica. Em um só conjunto de decisões
vamos juntar todas as encrencas
sobre valorização do câmbio, proteção à indústria, vulnerabilidade
externa, regime de exploração do
subsolo, vinculação de receita tributária e privatização. E isso para
não falar em redenção das mazelas
nacionais através de dádivas da
nossa terra, até então ignoradas,
assim invocando as tintas fortes de
um nacionalismo mineralógico
que não se via assim desenvolto
desde a privatização da Vale.
E não esquecer que o assunto é
petróleo, o mitológico "ouro negro", a seiva de todas as conspirações. São muitos os que sempre
acreditaram que ele existia; outros
tantos, mais inocentes, pensavam
que era nosso. Mas não se pode
confiar em mais ninguém, até a Petrobras, quem diria, é tida como
uma empresa estrangeira e
globalizada.
Diante de todos esses elementos,
e diante da complexidade do assunto, será surpreendente se não
tomarmos decisões rápidas, contundentes, emocionais e erradas.
gh.franco@uol.com.br
GUSTAVO FRANCO escreve aos sábados nesta
coluna.
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